​2,4-D: Polêmico desde sempre, imprescindível como nunca

Willian Daróz Matte, Vanessa Francieli Vital Silva, Fellipe Goulart Machado e Rubem Silvério de Oliveira Jr. (Universidade Estadual de Maringá – NAPD/UEM) e parceiros da Iniciativa 2,4-D

04.07.2017 | 20:59 (UTC -3)

O 2,4-D é um herbicida cujo mecanismo de ação é de mimetização das auxinas naturais das plantas, e foi o primeiro herbicida orgânico sintetizado pela indústria química, em 1941. Algumas décadas após sua descoberta, durante a guerra do Vietnã, foi utilizada a mistura de 2,4-D com 2,4,5-T - conhecida como “agente laranja" - pelos americanos com intuito de desfolhar partes da selva entre o Vietnã, Laos e Camboja visando expor a rota de suprimentos que supriam os guerrilheiros no Vietnã. A ideia não funcionou do ponto de vista militar, uma vez que era muito difícil desfolhar áreas tão grandes, especialmente quando os guerrilheiros podiam facilmente mudar a rota em resposta ao agente laranja. Um dos maiores problemas foi relacionado à dioxina, TCDD, proveniente do processo de fabricação do 2 4,5-T, componente banido há mais de 25 anos, enquanto o 2,4-D continua até hoje no mercado - erroneamente associado ao agente laranja.

Sabe-se que todos os herbicidas mimetizadores da auxina são capazes de causar sintomas semelhantes, caracterizados por alterações no crescimento das plantas. Estes efeitos podem ser percebidos mesmo quando pequenas quantidades destes herbicidas entram em contato com plantas sensíveis. Daí vem o outro nome pelo qual este grupo de herbicidas é conhecido – herbicidas hormonais.

Misturas formuladas de picloram+2,4-D constituem possivelmente os herbicidas mais utilizados para o manejo de plantas daninhas de pastagens, embora não sejam os únicos (outros exemplos são fluroxypyr, triclopyr, picloram, aminopyralid e clopyralid). Estercos provenientes de pastagens tratadas com esta mistura podem apresentar resíduo suficiente para causar sintomas em plantas sensíveis nas quais o esterco é usado como fertilizante. Isto ocorre pelo fato do picloram apresentar persistência longa no solo (20 a 300 dias), e não pelo 2,4-D, que apresenta persistência curta (4 a 10 dias). Por apresentarem sintomas semelhantes, é comum associar os efeitos observados ao 2,4-D e não ao picloram.

De fato, talvez a maior polêmica relacionada ao uso dos mimetizadores da auxina e do 2,4-D em particular é o potencial que a deriva destes produtos pode causar em culturas sensíveis próximas. Apesar de a deriva ser um problema inerente de qualquer aplicação de produtos agrícolas, o fato destes herbicidas causarem sintomas em doses muito baixas acaba chamando a atenção. Uma vez que não as formulações amina atuais não são consideradas voláteis (PV=1,9 x 10-5 Pa a 25oC), é preciso redobrar os esforços para que a tecnologia de aplicação e as condições de aplicação sejam as mais adequadas.

O 2,4-D e o glyphosate são dois herbicidas sistêmicos que se prestam ao controle de plantas daninhas já desenvolvidas. Usados isoladamente ou em conjunto, constituem a base das dessecações de manejo das áreas de plantio direto de grãos no Brasil (a maior do mundo), tanto por apresentarem amplo espectro de controle quanto pela ótima relação custo-benefício quando comparado com outras opções do mercado. As misturas de 2,4-D ao glyphosate apresentam, ainda, importante contribuição no controle de plantas daninhas tolerantes ou resistentes ao glyphosate, como a corda-de-viola, a trapoeraba e a buva.

Com todo o folclore que se criou ao redor do 2,4-D, seria natural que houvesse a necessidade de se reavaliar este herbicida à luz dos novos conhecimentos e metodologias desenvolvidas pela ciência moderna. Processos de reavaliação (toxicológica, ambiental e agronômica) do 2,4-D aconteceram nos EUA, Canadá, Nova Zelândia e na Comunidade Européia, assim como no Brasil. Em todos os processos de reavaliação os resultados levaram à manutenção do 2,4-D nos respectivos mercados. De fato, não há nenhum país no mundo que proíba legalmente a utilização deste herbicida.

Do ponto de vista toxicológico, que é aquele que afta mais diretamente ao aplicador, não há evidências de que o 2,4-D apresente efeitos carcinogênicos ou teratogênicos. Em relação ao meio ambiente, é degradado por microrganismos, tem baixa lixiviação no solo, atingindo no máximo 60 cm de profundidade não apresentando capacidade de contaminação do lençol freático.

Portanto, embora esteja envolvido em polêmicas históricas, o 2,4-D tem uma folha de serviços prestados inigualável dentro da agricultura brasileira.

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