Açúcar no sorgo

Doença Açucarada causa prejuízos que podem chegar aos US$ 800 mil.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

Na safra agrícola de 1995, especialmente em lavouras produtoras de semente de sorgo, observou-se, pela primeira vez no Brasil, nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Goiás, a ocorrência generalizada da doença açucarada, causada pelo fungo Claviceps africana Frederickson, Mantle & de Milliano. Em 1996, foi constatada nos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina e nos países sul-americanos como Argentina, Bolívia, Colômbia, Paraguai, Uruguai e Venezuela.

A doença açucarada estava restrita aos continentes africano e asiático, sobretudo à Índia. O relato de sua ocorrência nas Américas foi feito em 1996 e, no mesmo ano, na Austrália. Hoje, a doença açucarada do sorgo está presente em todas as regiões do mundo onde essa espécie vegetal é cultivada, inclusive nos Estados Unidos.

Estimou-se prejuízos na produção de sementes de sorgo híbrido no Brasil equivalentes a US$ 800 mil. As perdas também foram atribuídas ao aumento do custo de produção em razão da necessidade de pulverização com fungicidas, visando ao controle da doença.

Local afetado

A doença afeta os floretes individuais da panícula do sorgo, causando uma redução na quantidade de grãos produzidos, bem como limitando o seu desenvolvimento. Nos casos de ocorrência severa, pode haver danos totais à produção de grãos. Como os floretes não fertilizados permanecem abertos, as plantas com macho-esterilidade citoplasmática são altamente suscetíveis; as espiguetas infectadas não produzem semente. Por isso, a doença tem recebido especial atenção nas lavouras produtoras de sementes híbridas, nas quais, é imprescindível o uso de linhas macho-estéreis. Em lavouras comerciais, quando o ambiente é favorável ao desenvolvimento do patógeno e adverso à polinização, a doença também pode ser danosa.

Na fase inicial, a doença é reconhecida pela presença de gotas de líquido pegajoso de coloração rosada ou parda, que exsudam dos ovários infectados . Tais gotas, constituídas pela massa de esporos do fungo, são doces ao paladar e atraem numerosos insetos, os quais, ao se alimentarem com o líquido, dispersam os esporos para outras flores. Essa secreção pode se tornar visível cinco a dez dias após a inoculação. A produção do líquido sobre as panículas chega a tal volume que há um gotejamento sobre as folhas e, mesmo, sobre o solo, o qual seca se tornando branco pela presença de açúcar.

Espécies suscetíveis

São suscetíveis ao fungo as espécies do gênero Sorghum (S

e

) e

. Com relação ao milho, tem sido observado, em estações experimentais e em lavouras comerciais, que plantas no estádio de floração, desenvolvendo-se ao lado de plantas de sorgo infectadas, não têm apresentado os sintomas da formação do líquido açucarado, característico dessa doença.

A principal fonte de inóculo primário são os hospedeiros secundários. Na América do Sul, o principal hospedeiro secundário é o sorgo de alepo (

), denominado também de capim-massambará. Essa espécie encontra-se perenizada como planta daninha, sobretudo nos países do Cone Sul.

Uma outra fonte de inóculo são os restos culturais constituídos de panículas ou espiguetas (floretes) infectadas, que, após a colheita, podem manter o fungo viável na forma de secreção açucarada seca.

As estruturas semelhantes a esclerócios, produzidas na panícula do sorgo, como fonte de inóculo do patógeno, no Brasil, parecem não ter função, pois não se verificou a sua germinação no campo após várias tentativas e, tampouco, em testes no laboratório.

As causas que determinaram o surgimento dessa doença nas Américas e na Austrália ainda são desconhecidas, no entanto tem sido considerada a hipótese de o inóculo, constituído por conídios secundários, ter sido trazido do continente africano por correntes aéreas na alta atmosfera, atingindo os continentes australiano e americano.

Vetores de inoculação

O inóculo para ciclos secundários da doença, numa lavoura, é constituído pelos propágulos presentes na secreção açucarada. Tanto respingos de chuva, como insetos ou o contato de uma panícula infectada com uma sadia disseminam o inóculo dentro da lavoura, de uma flor para outra ou de uma planta para outra, e da lavoura para os hospedeiros secundários. Sob condições de baixa umidade relativa, a secreção açucarada seca e forma-se uma crosta branca, constituída também de esporos do fungo que são transportados pelo vento às flores ainda receptivas, às lavouras vizinhas ou às flores receptivas de outras espécies hospedeiras.

A infecção ocorre durante a floração do sorgo. Portanto, qualquer fator que possa afetar a infecção somente terá efeito durante essa fase. A temperatura, durante esse período, tem efeito marcante na doença. A temperatura de 19,5 oC é considerada ótima para o desenvolvimento da doença. Contudo, temperaturas noturnas abaixo de 13 oC durante a microesporogenese induzem a macho-esterilidade em sorgo e, também, levam à predisposição da doença. Os floretes são vulneráveis à infecção a partir da emergência da panícula, até a fertilização do ovário. Esse é, pois, o período de predisposição das plantas de sorgo ao agente causal da doença açucarada, quando as plantas necessitam ser protegidas pela aplicação de fungicidas para o controle químico da doença. Os órgãos da espigueta mais suscetíveis à infecção são os estigmas e as anteras.

Polinização é decisiva

A ocorrência da polinização e da fertilização em condições climáticas normais, é, portanto, decisiva com relação a epidemias da doença açucarada, pois qualquer redução na taxa de polinização ou na viabilidade do pólen aumenta a suscetibilidade à doença, em plantas férteis. O estresse de frio é a variável climática mais importante na predisposição do sorgo à doença.

Com relação à doença açucarada do sorgo, os problemas com alcalóides tóxicos são desconhecidos ou são menores do que os relatados para os ocorrentes em cereais de inverno. No entanto, há relatos, na Austrália, sobre a toxicidade dos alcalóides produzidos por C. africana a suínos, galinhas e vacas leiteiras alimentados com ração contendo diferentes quantidades de esclerócios.

As medidas de controle para C. africana devem concentrar-se, principalmente, na proteção química dos sítios de infecção e no manejo da cultura, visando maior eficiência da polinização. Outra medida complementar de controle é a eliminação ou redução da população tanto de plantas voluntárias quanto dos demais hospedeiros de C. africana em áreas próximas a lavouras de sorgo.

Erlei M. Reis, Ricardo T. Casa

e

Marta M.C. Blum,

UPF

Compartilhar

Mosaic Biosciences Março 2024