Adjuvantes da pulverização e a urgência da regulamentação desses produtos

Prejuízos à agricultura, ao agricultor e ao meio ambiente poderão ser significativos se órgãos oficiais não agirem para regular a comercialização de tais insumos no País. Por Hamilton Humberto

05.12.2017 | 21:59 (UTC -3)

Adjuvantes da pulverização são insumos importantes como ferramenta na melhoria da eficácia ou na redução de custos do tratamento fitossanitário na agricultura moderna. Durante anos houve uma discussão sobre se tais produtos deveriam ou não ser considerados um “afim” na Lei dos Agroquímicos (Lei no 7.802/89 regulamentada pelo Decreto no 4.074/02) e por isso submetidos ao mesmo processo de registro ao qual são submetidos tais produtos. Na dúvida, os produtos classificados como adjuvantes eram registrados. Tal discussão foi finalizada com a publicação em 20 de novembro de 2017, pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), do Ato no 104 que cancela o registro de produtos registrados exclusivamente como adjuvantes, “tendo em vista não existir obrigatoriedade de registro na Lei no 7.802 e no Decreto no 4.074”. Esta atitude, ao mesmo tempo que correta, é temerária.

Por definição, adjuvante é “qualquer substância ou composto sem propriedades fitossanitárias, exceto a água, que é acrescido numa preparação de defensivo, para facilitar a aplicação, aumentar a eficácia ou diminuir riscos”. Dessa forma, se ele “não possui propriedades fitossanitárias” e se é desenvolvido para ser “acrescido numa preparação de defensivo ”, por si só ele não exerce nenhum controle e, portanto, não é um defensivo. Por outro lado, para “facilitar a aplicação, aumentar a eficácia ou diminuir riscos” ele interfere nas características da calda (mistura do agrotóxico com a água) podendo alterar aspectos importantes da pulverização. Esta interferência pode ser positiva ou negativa no processo de pulverização, na eficácia do produto e também na segurança do trabalhador, do ambiente e do alimento. Como exemplos, um adjuvante pode alterar a tensão superficial e/ou a viscosidade da calda de pulverização. Alterando tais características ele irá interferir em fatores como o tamanho de gotas, o espalhamento e a velocidade de evaporação, interferindo na tecnologia e na segurança da aplicação. Se o adjuvante aumentar o tamanho de gotas ele poderá reduzir a deriva (carregamento do defensivo  para fora da área alvo) o que é um ponto positivo, no entanto, ele também pode reduzir o tamanho das gotas, elevando a deriva e o risco de contaminação do trabalhador e ambiental. A elevação do espalhamento por outro lado pode ser um excelente recurso como ferramenta na redução do volume de água utilizado na pulverização, sem perda da eficácia e com redução significativa do custo, no entanto, alguns adjuvantes chegam a aumentar a área molhada por uma mesma gota em mais de 30 vezes. Nesta situação, gotas que inicialmente não coalesceriam passam a coalescer sobre o alvo, elevando o escorrimento, reduzindo a quantidade de produto na planta e consequentemente a eficácia do tratamento fitossanitário, levando a uma perda de produtividade ou a necessidade de um número maior de pulverizações por safra. Por fim, a redução da velocidade de evaporação da água também pode ser um importante fator tanto econômico, uma vez que pode elevar o período de uso dos pulverizadores em função de condições climáticas, quanto de segurança e eficácia, uma vez que gotas que evaporariam antes de atingir o alvo, resultando em possibilidade de contaminação do produtor e ambiental, passam a atingir, elevando a quantidade de produto sobre ele. Um efeito inverso a esse no entanto será observado caso o adjuvante, mesmo possuindo outras funcionalidades positivas, elevar a velocidade de evaporação da água. Assim, o conhecimento das características funcionais de um adjuvante pode limitar seu uso ou mesmo alterar a forma de regulagem e as condições de uso do pulverizador.

Pelo exposto, se os adjuvantes não se enquadram como “defensivos ou afins”, também não podem ser “produtos de venda livre, sem necessidade de qualquer autorização pelo MAPA” como especificado no item 5 do Ato no 104. Na solução do problema, voltar a ser registrado como defensivo não seria uma alternativa viável, uma vez que os ensaios de eficácia exigidos no processo de registro não traduzem a funcionalidade dos adjuvantes. Assim, senão um registro, os adjuvantes precisam de pelo menos uma regulamentação. Iniciativas neste sentido já foram tomadas no passado pela Associação Brasileira dos Defensivos Genéricos (AENDA) e pelo próprio MAPA, mas não tiveram um resultado efetivo. Funcionalidades básicas precisam ser cientificamente analisadas para servir como parâmetros técnicos à recomendação e uso. Como não existem normas, nacionais ou internacionais, para ensaio e classificação de tais funcionalidades, uma ação conjunta entre MAPA, Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), fabricantes, usuários e pesquisadores, mesmo como uma Comissão de Estudos da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) buscando desenvolver normas brasileiras, se faz necessária. Caso isso não seja feito, e rápido, os prejuízos à agricultura, ao agricultor, ao trabalhador e ao ambiente poderão ser significativos.

*Os autores são pesquisadores da área de Adjuvantes do Centro de Engenharia e Automação do Instituto Agronômico (CEA-IAC), órgão da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo situado na cidade de Jundiaí (SP).

 

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