Curral funcional

O Curral Grandin representa uma nova tendência de manejo, pois atende às necessidades dos animais e evita o estresse do rebanho.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

Os ensinamentos e teorias da Dra. Temple Grandin (1) sobre comportamento dos bovinos foram objeto de tradução condensada publicada no Informativo ABCZ, da Associação Brasileira de Criadores de Zebu, de Fev/Mar de 2000 por iniciativa da Manah S. A.- Divisão Agropecuária. Essas recomendações passaram, tempos atrás, do interesse diletante, bem intencionado, para uma operação prática.

Em Pirapora (MG) inaugurou-se um dos primeiros currais do país desenhado em função do comportamento animal, especialmente do Nelore, ao contrário da tendência tradicional de querer que os animais se adaptem a um manejo que acreditamos ser racional. Quase sempre não pensamos nos bois e suas preferências e nos baseamos em conceitos empíricos, sem muita preocupação com o estresse animal e suas danosas conseqüências.

O veterinário Paulo Costa (2), após estágio na Nova Zelândia onde completou seu mestrado, estudou a matéria e convenceu-se de que o tronco em curva e a seringa de espaço redutível, como recomendado pela Dra. Temple, era o que havia de melhor para os criadores do Brasil, principalmente da raça Nelore, mais ágil e assustadiça do que as outras.

Um cliente de Paulo, Dr.Luciano Amaral Soares, de Belo Horizonte (MG), pecuarista sem preconceito por ser novo no ramo, confiou no que lhe foi explicado e autorizou a construção de um dos primeiros currais “grandin” montados no Brasil. A instalação está localizada na Fazenda São Pedro, em Pirapora (MG). (vide desenho -

).

Consta de uma seringa em semicírculo com uma porteira de 3,5 m que gira na posição de raio, reduzindo a área onde estão os animais, induzindo-os a seguir em frente por falta de espaço na retaguarda. Um desvio dá opção para a rampa de carregamento ou para o tronco, seja o corredor de fila única. Este, por sua vez, é também curvo com igual raio interno, terminando no brete de contenção, após uma volta de 180o. Em seguida ao brete está a balança que desemboca no apartador, dito gaiola. Antes do brete há uma opção de desvio com corredor direto para o apartador.

A separação permite quatro lotes distintos encaminhados para curraletes independentes, com disposição radial, sendo que um deles tem acesso para a seringa já descrita. Os quatro curraletes são interligados e têm saídas para um corredor, dito manga, periférica circular, com saída para o pasto.

As laterais da seringa e do tronco têm plataforma contígua de serviço e, juntamente com o brete, têm seus lados vedados para que os animais não se assustem ao enxergar pessoas em movimento. Estes três componentes são cobertos por telhado.

A separação entre curraletes e mangas é de cordoalha metálica, atravessando palanques perfurados travados no topo por caibros horizontais. As porteiras são de madeira, sempre de eucalipto tratado. Tudo muito bem feito, porem com economia.

As observações práticas dos vaqueiros indicam uma grande redução no tempo de serviço, pois os animais não empacam nem refugam nas diversas passagens e operações em curva, por “pensarem” que estão retornando. Alem do mais não se assustam, nem se estressam, com consequënte desidratação e perda de peso.

Mais recentemente visitamos outros currais do mesmo tipo, sempre com referências elogiosas da parte dos proprietários, dos gerentes e principalmente dos vaqueiros. Uma dessas instalações tem a seringa e o tronco com raio de apenas 2,5 m, sem maiores inconvenientes. Foi desenhado de tal forma que é operado normalmente por um homem só.

Na adaptação do gado ao curral deve-se observar as regras e preceitos formulados pela Dra. Grandin:

“O gado pode se lembrar por vários meses do manuseio doloroso ou assustador, devendo-se evitar os métodos que causam aversão. O conforto é importante, pois a dor causa agitação. Para reduzir o stress e facilitar o manejo futuro, deve-se lidar com delicadeza, com o mínimo de barulho e cutucões. Os animais podem ser treinados um só dia, principalmente se houver conforto e um prêmio na forma de ração. Devem ser acostumados aos poucos, evitando-se machucar o animal. Se a rês resistir, não deve ser solta até que pare de se debater. No caso de treinamento repetido, deve-se deixar os animais se acalmarem bem antes de novas sessões, que podem ser em dias seguidos. Não se recomendam os métodos de contenção de grande aversão como a electroimobilização. O gado será capaz de diferenciar uma pescoceira que bate em sua cabeça, de uma balança que não causa desconforto. Aprendem que o aperto lateral em seu corpo não incomoda, mas que a pescoceira machuca quando é fechada. Para reduzir o estresse e a agitação, o gado deve se acostumar com gente e com a rotina do manejo. Análises de sangue mostram elevados teores de cortisol nos animais estressados.”

A raça Nelore, predominante no país, com cerca de 70 milhões de cabeças, ainda comporta muito estudo e pesquisa com relação a seu comportamento diferenciado, para que venha a atingir índices de desempenho superiores aos que já vem alcançando. Certamente um desenho de curral compatível com seu temperamento poderá resultar em acréscimos de fertilidade e de ganho de peso. As regras, até certo ponto, são comuns a todas as raças, justificando-se a preocupação dos criadores com o conforto do animal e com a redução das situações que causem estresse.

Façam os técnicos especializados a conta da perda de peso e/ou parada de crescimento em cada situação de estresse por manejo inadequado e multipliquem pelo número de ocorrências durante a vida do animal. Certamente chegarão a números desconcertantes. Façam igualmente a conta das inseminações e coberturas mal sucedidas pelo mesmo motivo e seguramente obterão valores preocupantes.

Os currais com manga e tronco em curva, seringa de espaço redutível e brete de aperto lateral, uns e outros com os lados vedados, certamente virão a contribuir para melhor desempenho animal e sua conseqüente vantagem econômica.

(1) Universidade do Colorado, E.U. Especialista em comportamento animal, com seguidores nos criatórios e abatedouros da Austrália, Nova Zelândia e Estados Unidos. (

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(2) Veterinário, consultor autônomo e construtor de currais (

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Fernando Penteado Cardoso

Fundação Agrisus

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