Mapeamento de dispersão do psilíde vetor do HLB

Diaphorina citri é o psilíde ovetor do HLB, doença altamente devastadora em pomares de citros. Mapear o comportamento e a dispersão do inseto é essencial para a adoção de estratégias adequadas de man

08.03.2016 | 20:59 (UTC -3)

O Huanglongbing (HLB) é a doença mais devastadora dos citros no mundo. No Brasil, segundo os dados da Coordenadoria de Defesa Agropecuária (CDA), a doença foi responsável pela erradicação de aproximadamente 35 milhões de pés de laranja desde 2004. Além disso, chegou a atingir 64,1% dos talhões de São Paulo de acordo com levantamentos do Fundecitrus. O aumento pronunciado da disseminação das bactérias associadas à doença é intimamente relacionado ao deslocamento do psilídeo vetor Diaphorina citri nos pomares, já que a produção de mudas cítricas é regulamentada no Brasil. Sendo assim, o conhecimento da capacidade de deslocamento e dos fatores atuantes no voo do inseto são extremamente importantes para o desenvolvimento de táticas de manejo eficazes no combate à doença.

Nesse sentido, com o objetivo de se estudar a distância e velocidade de voo juntamente com a identificação dos principais fatores atuantes nesse processo, foi realizado estudo na Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz", da Universidade de São Paulo (Esalq-USP), com suporte financeiro do Fundecitrus e do CNPq, que investigou o efeito de brotações de plantas cítricas e a viabilidade de utilização de plantas iscas como barreiras na dispersão do psilídeo.

O estudo faz parte do projeto intitulado “Fatores bióticos e abióticos influenciando o deslocamento de Diaphorina citri Kuwayama (Hemiptera: Liviidae)", do aluno de doutorado Arthur Fernando Tomaseto, do Departamento de Entomologia e Acarologia da Esalq/Usp, com auxílio do aluno de graduação em Engenharia Agronômica Gabriel Margutti Passos, e tem como principal meta entender o processo de voo do inseto e auxiliar no desenvolvimento de medidas de controle para conter o avanço do HLB dos citros. Atualmente, os resultados iniciais estão sendo preparados para publicação em revista científica internacional.

O trabalho utilizou a metodologia de marcação, liberação e recaptura de psilídeos usando quatro cores distintas de pós-fluorescentes. As liberações ocorreram em área experimental localizada na Fazenda Areão, em Piracicaba, São Paulo, após o plantio de cerca de 600 mudas de laranja Hamlin. As mudas foram distribuídas em quatro áreas experimentais adjacentes, sendo formadas por círculos concêntricos localizados a 18m, 24m e 30m do ponto de liberação. Insetos marcados com a mesma cor eram liberados na mesma área circular. Após a liberação, os insetos foram recapturados em 200 armadilhas adesivas amarelas penduradas nos ramos das mudas cítricas na densidade de uma armadilha a cada 9m.

Plantas não hospedeiras

Nesse estudo, verificou-se a influência de coberturas vegetais não hospedeiras [milho (Zea mays) e capim-braquiária (Brachiaria decumbens)] na dispersão de D. citri. Essas plantas foram semeadas entre o centro de liberação e a primeira linha de citros (localizada a 18m) em cada área experimental, sendo intercaladas nos quatro setores dos círculos.

Foram liberados quatro grupos de mil insetos por área experimental. Cada grupo foi marcado com uma cor distinta de pó fluorescente. Os insetos que atravessavam as barreiras vegetais eram recapturados pelas armadilhas e analisados para verificação da coloração. Durante a liberação, o capim-braquiária apresentava altura média de 50cm e o milho, 2m.

De acordo com os resultados, independentemente da presença do milho ou capim-braquiária, o número de insetos recapturados foi o mesmo, ou seja, a utilização de uma barreira física com altura de 2m não interferiu no voo dos insetos. Isso pode ser explicado pelo inseto possuir habilidade de voar em altitudes superiores a 2m e/ou por ter a capacidade de deslocar de maneira muito rápida, tornando possível contornar a barreira física.

Nesse estudo, observou-se que quando o pomar apresentava brotações, os insetos tendiam a se acumular na primeira linha de plantas cítricas (localizadas a 18m do centro de liberação), o que estimulou a verificação do efeito de brotações na dispersão do inseto.

Efeito de brotações

Partindo-se do pressuposto que fêmeas de D. citri são dependentes de brotações para realizarem a postura de ovos, seria bem provável que o deslocamento do inseto fosse influenciado por esse fator. Assim, foram realizadas duas liberações de quatro mil insetos cada (mil em cada área experimental) em duas condições distintas do pomar. Na primeira delas, todas as plantas de laranja foram podadas para eliminar as vegetações novas, criando a condição de ausência de brotações. E na segunda, os insetos foram liberados quando o pomar apresentava brotações com tamanho de 15cm-30cm. As armadilhas foram trocadas com seis horas, um, três e cinco dias após a liberação.

Os resultados mostraram o quão rápido a dispersão pode ocorrer no campo, principalmente quando o pomar não apresentava brotações. Quando os insetos foram liberados na condição de ausência de brotações, seis horas após a liberação já foram suficientes para que alguns voassem a uma distância de 140m do centro de liberação, contra apenas 45m da condição presença de brotos. A mesma diferença foi observada após um dia da liberação, em que foram recapturados insetos a 200m e 60m, nas condições de ausência e presença de brotações, respectivamente. Quando avaliadas as proporções de insetos em cada distância de monitoramento, não houve diferenças nas recapturas de psilídeos a 18m, 24m, 30m e mais de 30m na condição de ausência de brotações. Contudo, as proporções diferiram quando os insetos foram liberados na condição de presença de brotações, com 85% dos indivíduos acumulando-se nas distâncias de 18m e 24m do centro de liberação. Esses resultados mostram que a condição fenológica da planta hospedeira pode ter grande influência no deslocamento do inseto no campo e, consequentemente, na disseminação da doença. Esses dados sugerem que a utilização de plantas iscas pode ser eficiente como tática de controle do HLB dos citros.

Plantas iscas

Após a verificação da influência das brotações no voo do psilídeo, foi testada a viabilidade do uso de plantas iscas como barreiras ou redutoras do movimento do inseto no campo. Nesse experimento, estudou-se o efeito de mudas de murta (Murraya paniculata), citros com broto e citros sem broto na dispersão de D. citri. Aproximadamente 50 vasos de cada planta-teste foram colocados entre o centro de liberação e a primeira linha de plantas de citros do pomar experimental (localizada a 18m do centro de liberação). Em uma das áreas experimentais não foram colocados vasos de plantas hospedeiras, caracterizando o tratamento controle.

Foram liberados quatro mil insetos marcados (mil em cada área experimental), avaliando-se o número de psilídeos recapturados em armadilhas adesivas amarelas penduradas nas plantas localizadas nos círculos concêntricos de 18m, 24m e 30m do centro de liberação. As avaliações ocorreram após seis horas, um e três dias da liberação. Sendo assim, somente seriam recapturados aqueles insetos que conseguissem passar pela barreira de plantas hospedeiras e chegar às plantas do pomar.

De acordo com os resultados, o número de insetos recapturados por armadilha no controle sempre foi maior que nos demais tratamentos, sugerindo que a utilização de uma planta hospedeira ao inseto pode reduzir seu movimento no campo. Esses dados podem ajudar a entender o efeito de borda do HLB dos citros, tão característico nos pomares brasileiros, ou seja, quando populações do inseto chegam a determinada propriedade, provenientes de áreas externas e realizando voos horizontais, tendem a parar na primeira linha de plantas hospedeiras que encontram.

Quando comparados os diferentes tratamentos, foi observado que no círculo contendo murta (0,02 inseto/armadilha), o número de insetos recapturados foi estatisticamente inferior ao tratamento de citros com broto (0,28 inseto/armadilha) e controle (0,80 inseto/armadilha), sugerindo grande potencial para essa espécie como planta isca.

Conclusões

Estudos de dispersão e dos fatores envolvidos nesse processo são de extrema importância para o manejo de doenças de plantas associadas a vetores. A compreensão da capacidade de voo de um inseto-vetor auxilia no conhecimento do ciclo das relações patógeno-hospedeiro, que, por sua vez, se constitui em um dos pilares para um manejo eficaz do problema.

A utilização de plantas iscas, com brotações, como barreiras ao deslocamento de D. citri deve ser incorporada como mais uma ferramenta para o manejo do HLB dos citros, que atualmente constitui-se no uso de mudas sadias, erradicação de plantas sintomáticas e controle regional do inseto-vetor. Essas plantas podem ser colocadas na borda de talhões que são constantemente sujeitos a infestações de psilídeos oriundos de fontes externas de inóculo. Os insetos imigrantes se acumularão nessas plantas e o controle químico pode ser ali direcionado, com aumento da eficiência de mortalidade e redução da disseminação das bactérias associadas ao HLB dos citros.

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