​Opções para colher bem

As tecnologias existentes nas colhedoras de grãos evoluíram muito nas últimas décadas e tornaram estas máquinas bastante confiáveis e eficientes. No entanto, as perdas ainda estão presentes em quase todas a

25.07.2016 | 20:59 (UTC -3)

Por se tratar de uma questão social, econômica, política e até ecológica, as perdas de grãos das principais culturas nas lavouras brasileiras têm causado preocupação e despertado cada vez mais interesse pela busca da minimização do problema. A perda de grãos, tanto qualitativa quanto quantitativa, tem sido causada em grande parte pelo funcionamento inadequado do sistema de trilha das colhedoras.

Constata-se em loco as causas de o Brasil ainda perder milhões de sacas de grãos das principais culturas durante a colheita, nível muito acima do aceitável. Mesmo com os avanços tecnológicos incrementando a agricultura do plantio até a colheita, principalmente no que se refere às colhedoras, a falta de conhecimento e de alguns cuidados pode causar grande parte destas perdas.

Em muitos casos é possível constatar que já foram esgotadas todas as alternativas de solucionar os problemas pelo usuário da máquina, sem êxito. O exemplo mais comum são perdas pelo sistema de separação e limpeza da colheitadeira causadas pelo sistema de trilha, que desequilibra o fluxo do material no sistema industrial da máquina.

Evidencia-se que a interpretação equivocada sobre o funcionamento do sistema industrial da colheitadeira faz com que seja muito difícil corrigir o problema e normalmente nesta tentativa criam-se outros. É o que acontece quando há perdas ocasionadas pela inadequação dos componentes responsáveis pela trilha do material cortado. Atrito excessivo na trilha sobrecarrega o sistema de limpeza - bandejão e peneiras -, exigindo maior força de ar sob as peneiras desfazendo o trabalho de estratificação (separação em camadas) pelo peneirão (bandejão), causando a mistura de grãos com as palhas e, como consequência, há maior perda ou quebra (excesso de retrilha).

É fundamental que na trilha o atrito causado entre os componentes seja o menor possível, evitando assim o acúmulo de palhas miúdas sobre as peneiras. O ideal é que neste processo de trilha e separação a palha não quebre e fique o mais inteira possível.

É inegável que o sistema de trilha da colheitadeira é direta ou indiretamente responsável pelas perdas tanto quantitativa quanto qualitativa dos grãos, mas, felizmente, os avanços tecnológicos e as alterações nos referidos sistemas trouxeram grande contribuição, tanto na qualidade do produto colhido quanto na redução de perdas e na produtividade da colhedora.

O QUE MUDOU E COMO FUNCIONAM OS SISTEMAS

Para entender melhor, hoje o mercado dispõe de colhedoras equipadas com sistemas de trilha chamados de radial ou tangencial (transversal), axial (rotor axial) e também as denominadas híbridas (radial e axial).

RADIAIS

No sistema radial, com cilindro e côncavo transversal, a trilha acontece através do acesso do material cortado (planta) pela esteira, passando entre o cilindro e o côncavo onde acontece a trilha. Grande parte dos grãos separados na trilha desce pelo côncavo em direção ao sistema de limpeza e a palha graúda é conduzida para o saca-palhas, passando pelo batedor traseiro (segundo cilindro), recebendo impacto contra o pente do côncavo complementando a trilha e contribuindo na separação.

Esse sistema tem como característica mudar a trajetória do material pela rotação do cilindro, o que causa a morosidade de saída dos grãos do sistema, acarretando em dano mecânico ao mesmo, bem como o retardamento do fluxo da palha, o que sobrecarrega o sistema de separação e limpeza. O maior tempo de permanência do material causa maior impacto agressivo, comprometendo a qualidade da colheita quando não forem dadas aos componentes deste sistema a manutenção e as regulagens compatíveis com as condições impostas pela cultura.

O sistema de trilha na colheitadeira de grãos é sem dúvida o mais importante e que define resultados tanto positivos quanto negativos no processamento do material e do fluxo do mesmo no interior da máquina. Ele é responsável por receber a planta cortada em um curto espaço de tempo e, além de trilhar e separar o grão da palha, define o caminho e o destino final desse material. É através de côncavo (separação) que os grãos são direcionados para o sistema de limpeza e daí para o armazenamento, já a palha é direcionada para fora da máquina pelo sistema de separação.

É fundamental que na trilha haja condições de que no mínimo 90% dos grãos trilhados tenham acesso ao sistema de limpeza através do côncavo e no máximo 10% de palha. Já no sistema de separação nas convencionais saca-palhas, no máximo 10% de grãos e no mínimo 90% da palha, caso contrário, as perdas pelas peneiras tornam-se inevitáveis. Há, ainda, excesso de retrilha (quebra de grãos) e a máquina pode ficar sobrecarregada.

É extremamente importante observar ainda que o fluxo do material no interior da colheitadeira não seja inferior à velocidade de deslocamento da mesma, no mínimo igual ao giro do pneu dianteiro da máquina.

Com relação a regulagens, os melhores resultados se dão quando a colhedora com sistema radial trabalha com a menor rotação necessária do cilindro para as condições da cultura e que permita a trilha sem triturar a palha graúda.

Já o côncavo deve ser o mais afastado possível em relação ao cilindro e sempre com abertura maior na parte dianteira, como ajuste básico regula-se nos tirantes laterais com medidas específicas. Uma alternativa é trabalhar com o côncavo todo solto (para baixo), buscando, além da trilha, mais separação de grãos através do côncavo, mantendo a palha mais graúda possível e assim não sobrecarregando as peneiras.

O ideal é quando a colheitadeira trabalha com saca-palhas carregado (palhas graúdas) e peneiras vazias (o mínimo de palha), e não o contrário, o que só é possível nas condições acima mencionadas. Nesse caso, em culturas como a soja, por exemplo, a vagem não deve ser retirada da planta; apenas os grãos. Isso contribui muito na redução de perdas por peneiras e na qualidade do grão pela redução de retrilha. Sempre que a trilha não esteja satisfatória busca-se a melhoria através da maior rotação do cilindro e nunca com aproximação do côncavo ao mesmo.Qualquer aproximação do côncavo ao cilindro provoca atrito (quebra do material), equivalente a algumas centenas de RPM a mais do cilindro.

Trabalhando nessas condições, além da minimização de problemas na trilha, separação e limpeza, há também redução de danos em componentes mecânicos da máquina (rolamentos, correias, polias e correntes) e, ainda, redução quanto à exigência de potência do motor e consumo de combustível.

Com relação ao sistema de trilha das colhedoras de grãos, houve nos últimos anos grandes avanços tecnológicos, principalmente a partir das máquinas equipadas com trilha de fluxo axial (com rotor simples ou duplo) até as chamadas híbridas (tangencial e axial), mesmo que as indústrias ainda continuam produzindo e comercializando as chamadas radiais (transversal).

AXIAIS

A colhedora denominada axial é aquela cujo sistema é composto por rotor e côncavo longitudinal em relação à máquina. Esse sistema tem como característica principal o menor tempo de permanência do material na sessão de trilha, reduzindo danos mecânicos (quebra de grãos), na qual o material se desloca paralelo ao eixo do rotor, com maior tempo de separação do grão da palha, reduzindo perdas.

No sistema axial, a trilha e a separação acontecem concomitantemente por um único sistema, objetivando primordialmente a qualidade do grão e a redução de perdas. Esse sistema apresenta maior eficácia na colheita de sementes e de culturas mais exigentes em qualidade na trilha como arroz, feijão, soja, milho, entre outras.

O sistema axial, pelo fato de que o rotor e o côncavo estão situados no sentido longitudinal da colhedora, acelera a saída dos grãos do sistema, minimizando o atrito e diminuindo as quebras e a separação acontece gradativamente ao longo do côncavo até o sistema de limpeza.

Os rotores axiais, compostos por pequenas barras de trilhas intercaladas na parte dianteira da circunferência dos mesmos, causam atritos mais suaves e melhor separação. Na parte posterior do rotor são distribuídos dedos (grampos) em toda circunferência, que além de proporcionar a separação, provoca limpeza do côncavo permitindo a descida dos grãos para o sistema de limpeza e contribuindo também no acabamento da trilha de grãos que ainda possam estar presos na planta. Paralelamente ao rotor está o côncavo com maior área de separação dos demais sistemas e que possui seções de grelhas diferentes tanto na abertura quanto na disposição, sessões essas de fácil remoção e reposição, podendo também ser usadas grelhas específicas para cada cultura fornecidas pelo fabricante.

AXIAL DE DUPLO ROTOR

As colhedoras axiais de duplo rotor caracterizam-se pela maior capacidade de debulha e separação, favorecendo a qualidade de grãos, reduzindo perdas e danos, pois possibilitam uma debulha mais suave, contribuindo no desempenho da colhedora. A transição da palha para o sem-fim do rotor, através do alimentador, é mais suave e alternadamente em sentidos opostos uniformizando o fluxo do material para os rotores.

Rotores axiais com maior diâmetro aumentam drasticamente a força centrífuga, proporcionando a separação mais rápida do grão da palha e a saída em menor tempo do sistema, reduzindo os danos mecânicos aos grãos. O sistema de rotores duplos apresenta algumas diferenças com relação aos rotores de menor diâmetro, permitindo maior circulação de massa entre côncavo e rotor, principalmente para ruptura de produtos úmidos.

Alguns componentes são aliados na qualidade da colheita, como alimentador do rotor com o mesmo diâmetro do rotor, que impede o afunilamento do produto no sistema e não permite que o material se expanda; côncavo com chapas perfuradas também dá sua parcela de contribuição de qualidade. Outro fator importante é permitir a separação do produto ainda na frente, o que alivia a retrilha. Outro aspecto com rotores duplos é o fato de que rotores que trabalham em rotação oposta melhoram o fluxo e causam menor atrito na planta, além da retrilha, que é realizada unicamente pelo batedor traseiro, evitando, assim, o retorno do material para a unidade da trilha.

As colhedoras com dois rotores axiais possuem, logicamente, dois côncavos, tendo ainda maior área quadrada de côncavo e maior força centrífuga do que as de apenas um rotor, permitindo que a separação de aproximadamente 80% a 90% do grão aconteça no setor de trilha.

No duplo rotor, a trilha se dá pelos dois rotores e o contato de grão a grão em ambos os lados distribui de forma mais uniforme o material sobre as peneiras, principalmente em ladeiras. Em alguns rotores a gengiva da trilha sobreposta em unidade espiral impede a passagem de material sem trilhar. Na área de separação os rotores possuem placas escalonadas em espiral que mantêm o material em movimento, facilitando a separação e a descarga do material do sistema, com regulagens que permitem maior ou menor retenção do material no sistema, de acordo com as condições da cultura e o volume de massa, bem como a velocidade do deslocamento da colhedora. Esse sistema de batedores de descargas e pás substituíveis acelera o deslocamento de palha para o picador e espalhador.

A experiência e o resultado de campo mostram-se mais satisfatórios quando a regulagem do sistema axial for de forma inversa à do radial. No radial, quando tem necessidade de maior trilha aumenta-se a rotação do cilindro e afasta-se o côncavo do mesmo. Já no sistema axial, em situações idênticas de exigências, é desaconselhável aumentar a rotação do rotor, pois acelera nesse caso a saída do material do interior da máquina antes mesmo de concluir a trilha e separação (descaracterizando o sistema axial), tendo como consequência maior risco de perdas, principalmente em colheitas com material úmido ou com presença de invasoras.

É importante também que em busca de maior ação de trilha trabalhe-se com maior ação de côncavo, ou seja, aproximando o côncavo do rotor não alterando a rotação do mesmo, caso contrário, além de quebra e perdas, obrigatoriamente precisaria reduzir a velocidade da máquina, comprometendo a produtividade da mesma.

HÍBRIDAS

Já há algumas décadas, principalmente em colheitas de arroz, colheitadeiras radiais passaram a ser equipadas com rotor axial (adaptadas), mantendo o cilindro transversal e côncavo apenas como alimentador do sistema axial. Nessas máquinas são retirados os saca-palhas e colocado um rotor axial e côncavo transformando dois sistemas em um, ou seja, trilha e separação concomitantemente.

Atualmente, o mercado dispõe de colhedoras conhecidas como híbridas (tangencial e axial) originais, cujo sistema de trilha é composto pelo sistema convencional ou radial (cilindro e côncavo), que apenas alimentam o rotor axial e com côncavo longitudinal à máquina.

Alternativa que qualifica a trilha é o uso de barras de alta inércia removíveis entre as barras do cilindro transversal, que proporcionam melhor separação de grãos através do côncavo e também permitem a trilha de menor impacto, podendo trabalhar com menor rotação do cilindro e maior abertura do côncavo. Também acertos técnicos como maxitorque, que é o ajuste automático da tensão de correias, as necessidades de transmissão de potência contribuem na melhoria da ação.

Outro aspecto importante para ser considerado são as máquinas equipadas com rotari “separator”, que além do conjunto do côncavo e batedor traseiro, o separador rotativo contribui na separação do grão da palha pela força centrífuga principalmente em colheitas de alto volume. Este acessório está situado entre o batedor traseiro e o saca-palhas, componente que exige regulagem cuidadosa e compatível com as condições impostas durante a colheita (umidade, volume e velocidade da colhedora).

Diante da amarga realidade em relação a perdas e que se repetem a cada ano, conclui-se que as causas das perdas não passam pelas colheitadeiras e sim pela necessidade de melhor aproveitamento dos recursos técnicos que as possuem.

Este artigo foi publicado na edição 141 da revista Cultivar Máquinas. Clique aqui para ler a edição.

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