Os olhos do céu

Nova tecnologia detecta e mapea áreas infestadas com fitonematóides.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

Os nematóides são vermes que em geral não são visíveis a olho nu. Vivem no solo, alimentando-se dos nutrientes nas raízes das plantas. As principais culturas exploradas comercialmente no país sofrem parasitismo por parte de uma ou mais espécies de nematóides.

De fato, esses organismos são considerados como uma das pragas de maior importância para cultura da soja no Brasil e no mundo. Os nematóides-de-galha causam prejuízos anuais estimados em 50 milhões de dólares para cultura da soja no País. Uma outra espécie de fitonematóide, o nematóide de cisto da soja (NCS),

, constitui um dos principais problemas fitossanitários para a cultura dessa oleaginosa. Desde sua detecção na safra 1991/92, até a safra 1999/00, já causou prejuízo de cerca de 200 milhões de dólares.

Rotylenchulus reniformis e Meloidogyne incognita são nematóides chave para cultura do algodão, as perdas estimadas com o ataque de fitonematóides para essa cultura são de 10,7%. Na safra 2001 o Brasil colheu cerca de 800 mil toneladas de pluma, o que pelas estimativas de perda representam um prejuízo de 85 mil toneladas, causado pelo ataque de fitonematóides, cerca de 120 milhões de dólares.

Uma das maiores dificuldades enfrentadas por produtores e pesquisadores no controle dessa praga é o tamanho grande das áreas plantadas com soja e algodão. Não se sabe exatamente em que pontos da lavoura existem nematóides. Na verdade, a grande produção de soja nos anos 90 passou a concentrar-se em propriedades cuja área está acima de 200 ha (65%) e a tendência é dessa produção se concentrar cada vez mais em propriedades acima dos 500 ha, o algodão segue o mesmo caminho. O principal meio de disseminação desses fitonematóides é pelo tráfego de máquinas agrícolas, dessa forma o próprio produtor torna-se o instrumento de contaminação de seus campos quando executa as operações de preparo de solo, plantio e colheita.

Nesse sentido, o conhecimento da distribuição espacial dos nematóides e o mapeamento das áreas infestadas, é uma ferramenta muito importante no manejo das doenças causadas por eles.

O método utilizado atualmente para detecção dos nematóides, consiste em retirar amostras de solo no meio da lavoura com auxílio um enxadão e enviá-las para análise em laboratório. Esse método é muito impreciso, porque é praticamente impossível amostrar toda a área para se obter confiabilidade nos resultados. O maior problema em retirar amostras aleatoriamente, é que a praga não está distribuída de modo uniforme na lavoura. Se o resultado da análise de uma amostra retirada de um ponto qualquer, informar que a área está isenta da presença de nematóides, esse mesmo resultado poderia revelar uma alta população dessa praga, na hipótese da amostragem ser realizada a apenas um metro de distância desse local.

Ainda não existem produtos nematicidas registrados para cultura da soja, mas algumas empresas fabricantes de defensivos agrícolas, já têm se mobilizado nesse sentido. Para algodão existem princípios ativos registrados para o controle de fitonematóides. Um forte obstáculo para o uso desse tipo de medida de controle, no caso dessas culturas, são os altos custos do tratamento, tanto econômicos quanto ecológicos, se for realizado na totalidade da área. Porém, se forem conhecidos com precisão os pontos onde está ocorrendo o ataque, o controle racional pode ser realizado com eficiência.

Imagens de satélite há muitos anos são utilizadas, principalmente nos Estados Unidos, para identificar e estimar o tamanho das áreas ocupadas pelas culturas, monitorar pragas, doenças e previsão de safras. No Brasil, o emprego dessas imagens tem sido principalmente no dimensionamento de áreas desmatadas, bem como identificação do tipo de cobertura vegetal, se floresta nativa, reflorestamento, solos expostos ou tipo de cultura. Recentemente, a disponibilização de imagens de satélite com alta resolução espacial, ou seja, satélites que captam níveis maiores de detalhes, como o IKONOS II, tem possibilitado a utilização desses recursos com maiores aplicações para agricultura.

Já existem no Brasil, várias empresas que vendem imagens do IKONOS II, com o preço em torno de R$ 0,05 por hectare (encomenda mínima de 10 mil hectares). Se considerarmos que o custo da análise de solo pelo método convencional é de R$ 20,00 por amostra, e que para cada hectare seriam necessários um número muito grande de amostras, para se obter uma noção ainda imprecisa da real localização dos pontos com nematóides, já teríamos uma boa justificativa para adotar o uso das imagens.

O que acontece atualmente é que o satélite mencionado tem uma resolução temporal muito baixa, isto é, demora muito para passar sobre um mesmo ponto mais de uma vez, se no dia em que forem tomadas as imagens o céu estiver encoberto por nuvens, será necessária uma nova tentativa para aquisição da imagem. O número de tentativas para executar essa tarefa está limitado ao ciclo da cultura no campo. Com os novos lançamentos de satélite previstos a curto prazo, além desse problema ser provavelmente contornado, os custos serão reduzidos.

Utilizando um equipamento chamado espectroradiômetro, calibrado para as bandas espectrais correspondentes a um sensor do satélite Landsat, pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (UNESP/FCAV) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo (FAPESP), testaram com sucesso, a utilização de medida da energia refletida pelas plantas no comprimento de onda no visível e infravermelho próximo, para detectar o ataque de nematóides em lavouras de soja e algodão.

O sol é a principal fonte de energia para a terra. A radiação solar se propaga no vácuo e incide sobre a terra, em diversos comprimentos de onda, que constituem o espectro eletromagnético. Ao incidir sobre as plantas, parte dessa radiação é transmitida através das plantas chegando ao solo, uma outra alíquota dessa radiação é absorvida pelas plantas e utilizada na manutenção dos processos fisiológicos, como a fotossíntese, existe ainda, outra parte da radiação que incide nas plantas e é refletida de volta para atmosfera.

O espectroradiômetro mede a porção da energia que é refletida pelas plantas, os pesquisadores constataram que plantas atacadas pelos nematóides refletem mais energia no comprimento de onda na faixa do vermelho (porção visível do espectro eletromagnético) do que as sadias, e menos no infravermelho próximo (tipo de radiação que costuma estar presente em quantidades bastante significativas no fluxo de radiação solar direta). Esse fato acontece, porque plantas atacadas por nematóides possuem porte reduzido, folhas amareladas e em menor número.

Com o auxílio de um receptor de GPS, foi determinada a localização geográfica (latitude e longitude) dos pontos onde foram encontrados nematóides, possibilitando aos pesquisadores, voltar a esses pontos no momento que for necessário. Essa técnica está sendo testada também para utilização na cultura do algodão.

O equipamento na verdade simulou o que os satélites de última geração, que vem sendo lançados na órbita terrestre poderão fazer em grandes áreas.

Não é especulação dizer que em alguns anos a rotina de coleta de amostras de solo no campo, com enxadão e processamento em laboratório, deverá ser substituída por imagens de satélite recebidas até por Internet. O produtor vai deixar de aplicar os químicos em 100% da área, restringindo as aplicações aos pontos onde está o nematóide realmente, 5, 10, 15% da área, seja como for, somente o necessário.

e

UNESP/FCAV

INPE

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