Transmissão simples

As transmissões articuladas a cardan são utilizadas em grande parte dos implementos que utilizam a TDP do trator e mesmo em outras máquinas, por ser um componente bastante dinâmico e simples

10.03.2016 | 20:59 (UTC -3)

As transmissões articuladas a cardan, ou simplesmente eixos cardans, são mecanismos utilizados para transmissão de movimento entre árvores rotativas cujos eixos geométricos se interceptam segundo um ângulo qualquer. O termo “árvore", embora aparentemente estranho, é empregado na área de mecânica para eixos giratórios que têm montados sobre si elementos como engrenagens, polias, volantes ou outros.


O eixo cardan, assim como o sistema hidráulico de tratores, é uma das principais formas de transferir potência do trator para a operação de máquinas agrícolas a distância. Enquanto o sistema hidráulico utiliza o fluxo de óleo sob pressão, o eixo cardan utiliza energia mecânica para transmitir potência (torque e rotação) em ângulo aos implementos agrícolas.

O eixo cardan conecta o eixo da tomada de potência (TDP) do trator agrícola ao eixo da conexão de entrada de potência (CEP) do implemento.

COMPONENTES DO EIXO CARDAN

O eixo cardan compõe-se basicamente de duas juntas universais unidas por meio de dois eixos telescópicos maciços e/ou tubulares (Figura 1). A transmissão se dá através da chamada “junta universal" ou junta cardânica, composta por dois terminais (também chamados garfos ou luvas) acoplados a cada uma das árvores (do trator e do implemento) unidas por uma cruzeta na qual o movimento articulado em dois planos perpendiculares acontece.

JUNTAS UNIVERSAIS

As juntas universais (Figura 2) podem ser “simples" ou “duplas", mais conhecidas como homocinéticas. A junta simples é formada por dois terminais/garfos e uma cruzeta, sendo indicada para quando o eixo da TDP e o eixo da CEP estão angularmente alinhados na mesma altura. A junta homocinética é formada por um componente central e duas cruzetas, sendo indicada quando os dois eixos estão em ângulos diferentes e não na mesma altura, assegurando igualdade entre as rotações instantâneas de saída e de entrada. Este tipo de junta pode atingir por breve período um ângulo de trabalho de 80º facilitando manobras de cabeceiras.

Quando temos apenas uma junta universal com ângulo de operação diferente de zero, a velocidade instantânea de saída, na maior parte das vezes, é diferente da velocidade de entrada. Com duas juntas é possível obter velocidade de saída igual à velocidade de entrada desde que os ângulos nas duas juntas sejam iguais. Já com juntas homocinéticas é garantida a uniformidade da velocidade de saída praticamente em qualquer condição de ângulo.

CRUZETAS

A cruzeta desempenha papel fundamental na transmissão de força pelo eixo cardan, pois através das castanhas e roletes que a compõem é que a transmissão acontece. A cruzeta é formada por dois eixos em cruz, cujas extremidades são chamadas de munhões. Em cada um dos quatro munhões da cruzeta articula-se uma castanha (espécie de capa), cujo espaço é ocupado por roletes, através dos quais são transmitidas forças responsáveis pelo movimento (Figura 3). O movimento alternativo na cruzeta penaliza as superfícies atritantes dos munhões e castanhas, levando a desgastes e até a “falha" prematura do componente quando as condições de operação são adversas.

EIXO TELESCÓPICO

O eixo telescópico poderá ter formato redondo, triangular, quadrado, oval, estrela, estriado ou outro formato, visando reduzir pressões de contato e reduzir vibrações.

Para o bom funcionamento da transmissão, os olhais dos garfos da árvore intermediária (tubo telescópico) devem estar contidos num mesmo plano, isto é, em fase. Nos perfis quadrados, por exemplo, é possível uma defasagem de 90° entre os olhais dos garfos; nos estriados podem ocorrer várias angularidades, dependendo do número de estrias defasadas; nos retangulares e oblongos, a montagem só pode ser realizada em duas posições, uma deslocada de 180° em relação à outra, o que equivale a 0°, em condição ideal; os triangulares são construídos de maneira que em apenas uma posição é possível a montagem. Para garantir que, nos perfis quadrados, os garfos estejam com os olhais alinhados, os componentes macho e fêmea podem conter ranhuras e saliências de guia. Por exemplo, em altas rotações (1.000rpm) o perfil estriado é mais indicado pois diminui as folgas entre tubos.

Os perfis tubulares circulares apresentam a relação capacidade de transmissão/massa mais favorável entre todos os demais e são, por isto, preferíveis em acionamentos de alta velocidade como em veículos automotores. Neste caso, é usual que uma de suas extremidades apresente um prolongamento em forma de espiga estriada, curta, a qual se encaixa numa luva que permite o movimento telescópico

Em acionamentos agrícolas, com baixas velocidades de operação, além dos perfis circulares, outros como quadrados, retangulares, ovais, triangulares funcionam satisfatoriamente, sendo bastante utilizados.

Os tubos são dimensionados para um torque máximo de segurança, sendo muitas vezes tratados superficialmente, para minimizar a pressão telescópica. Um dos tratamentos, denominado "Rilsan", reduz o coeficiente de atrito de 50% em comparação com o contacto normal, entre duas superfícies de metal. Se as condições de trabalho forem altamente abrasivas, o tubo pode ser tratado termicamente para aumentar a sua dureza.

CONFIGURAÇÕES DE EIXOS CARDANS

A norma ISO 5673-2:2005 apresenta três arranjos possíveis (Figura 4) envolvendo juntas universais simples e homocinéticas e que operam em conjunto em transmissões agrícolas, sempre com o objetivo de uniformizar o movimento de rotação na entrada e na saída de potência. Uma vez que a irregularidade do movimento rotatório gera ruído e vibração, que podem reduzir a vida útil dos seus componentes, é importante observar a melhor configuração.

A configuração A é composta por duas juntas cardans simples; em ângulos pequenos e iguais, esta transmissão compensa as variações de ângulo e comprimento do tubo telescópico, garantindo uma transmissão uniforme do movimento de rotação.

Já a configuração B conta com uma junta simples e uma homocinética; nesta forma é possível obter movimento de rotação praticamente uniforme desde que a junta simples opere em linha reta ou com ângulo abaixo de 10o.

A configuração C é composta por duas juntas homocinéticas; é possível obter rotação final sempre uniforme, mesmo com diferentes valores de ângulos entre as juntas, podendo alcançar desalinhamento de 40º. Nesta situação o operador pode executar o trabalho em condições normais, mesmo nas manobras de curvas, sem requerer maior atenção ou esforço.

CLASSIFICAÇÃO DOS EIXOS CARDANS

Embora na prática cada fabricante tenha a sua classificação estabelecida em “séries", onde cada série tem sua capacidade de torque, elas deveriam ter uma correspondência com as categorias estabelecidas pela norma americana Asabe/Ansi S331.5 (2010). Esta norma estabelece oito categorias de capacidade de torque estático para eixos cardans, cada um com dois subconjuntos de membros de conexão (eixo propriamente dito), um para serviço pesado, outro para serviço normal. Na Tabela 1 são apresentadas as categorias da norma americana em função dos requisitos de torque estático.

Com isto é de se esperar que os componentes do eixo cardan sejam intercambiáveis dentro de uma mesma série ou de séries equivalentes quando se tratar de fabricantes diferentes.

Tabela 1 - Requisitos de torque estático

Categoria

Conjunto de garfo, cruzetas e munhões

Membros de conexão

Serviço normal

Serviço pesado

_______________ N.m ______________

1

1.130

565

791

2

1.808

1.130

1.582

3

2.486

1.582

2.147

4

3.955

1.921

2.938

5

5.649

2.938

4.180

6

7.344

3.728

5.423

7

9.604

4.858

7.005

8

12.428

6.779

9.039

Categoria

Conjunto de garfo, cruzetas e munhões

Membros de conexão

Serviço normal

Serviço pesado

_______________ N.m ______________

1

1.130

565

791

2

1.808

1.130

1.582

3

2.486

1.582

2.147

4

3.955

1.921

2.938

5

5.649

2.938

4.180

6

7.344

3.728

5.423

7

9.604

4.858

7.005

8

12.428

6.779

9.039

MANUTENÇÃO DO CARDAN

A lubrificação dos componentes do cardan é fundamental para sua durabilidade. O ponto principal é a lubrificação das partes móveis do cardan – cruzetas e partes macho e fêmea – que deve ser feita de acordo com a recomendação do fabricante e com a graxa adequada de sabão de lítio (EP 2 - Extrema Pressão com grau de consistência 2), resistente à alta temperatura e à água. Produtos à base de silicone, graxas grafitadas e para chassis não são indicados, pois dão apenas proteção superficial. Além de reduzir o atrito, o lubrificante protege os componentes contra ferrugem ou corrosão.

Eixo cardan sem lubrificação, ou lubrificado com produto inadequado, apresenta desgaste prematuro dos componentes móveis. Em decorrência dela, temperaturas da ordem de 200ºC podem ser atingidas, situação em que algum lubrificante porventura ainda disponível, torna-se fluido o bastante, escapando dos locais onde deveria atuar, abreviando ainda mais a vida útil do componente. Pode ocorrer também carbonização da graxa nos condutos do lubrificante, bloqueando a sua passagem.

O lubrificante aplicado por meio de bomba manual, através de pino graxeiro, é armazenado nos canais de lubrificação das cruzetas e conduzido às castanhas pela ação da força centrífuga, sendo essencial, por isso, que os mesmos não estejam obstruídos. Na árvore intermediária o lubrificante é aplicado entre as partes macho e fêmea, por meio de pincel.

A lubrificação adequada ao bom funcionamento da transmissão varia com o uso. Quando o componente é utilizado em serviços leves, em pequenos ângulos de operação, a lubrificação permanente ou por um período longo pode ser adequada. Quando as transmissões são utilizadas com grandes ângulos de operação, altas velocidades, cargas excessivas e presença de intensa poeira e umidade podem exigir lubrificação diária.

Este artigo foi publicado na edição 145 da revista Cultivar Máquinas. Clique aqui para ler a edição.

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