Velocidade certa

As perdas na colheita mecanizada de arroz irrigado são inevitáveis, porém as regulagens corretas e a determinação da velocidade ideal de trabalho são os principais fatores para a diminuição dos gr&at

18.04.2016 | 20:59 (UTC -3)

O município de Itaqui localiza-se na Fronteira Oeste do estado do Rio Grande do Sul(RS), fazendo divisa com a Argentina e, destaca-se no cenário nacional por estar entre os maiores produtores de arroz irrigado do País. Esse statusse deveàs condições edafoclimáticas favoráveis ao desenvolvimento da cultura, aliada a uma topografia suavemente ondulada a plana, e disponibilidade de água para a irrigação por inundação. Segundo dados do Instituto Riograndense do Arroz (IRGA), foram colhidos no município, aproximadamente, 82 mil hectares na safra2013-2014.

A colheita consiste na etapa final do processo produtivo, onde as perdas devem ser mantidas dentro de padrões aceitáveis. A falta de conhecimento das características agronômicas da cultura e das colhedoras, bem como a deficiência na regulagem dessas máquinas, associadas à velocidade excessiva de trabalho são considerados os principais fatores responsáveis pelas perdas de grãos na lavoura arrozeira. Estes fatores nos remetem a uma série de questionamentos que dizem respeito aos elevados valores de perdas na colheita mecanizada, atingindo valores inaceitáveis de, em alguns casos,até 10% do montante colhido.

O arroz irrigado se caracteriza por ser uma cultura de difícil trilha devido a esta apresentar na parte superior,as panículas com grãos praticamente secos e na parte inferior umgrande volume de massa verde com elevado teor de umidade,o que provoca maior exigência dos componentes mecânicos das colhedoras. A colheita é realizada com umidade dos grãosentre 18 e 23%, sendo que esta não pode ser prolongada, pois a permanência do arroz na lavoura diminui sua qualidade e o rendimento de engenho dos grãos. Durante a colheita, existe na maioria das propriedadesdo Sul do Brasil um superdimensionamento do número de colhedoras,visto que a colheita não poder ser realizada quando existir orvalho na planta (período da manhã e final da tarde), fenômeno este comum durante a época de colheita, que causa encurtamentoda jornada diária de trabalho, requerendo desta forma maior capacidade operacional.

As colhedoras utilizadas na colheita do arroz, no caso das que possuem separação axial, são praticamente as mesmas utilizadas em outras culturas como, por exemplo, a soja e o trigo. No entanto, são necessárias regulagens específicas e adaptações, dependendo do modelo e da utilização de diferentes larguras de plataforma, pois a quantidade de produto a ser processado é maior quando comparado a outras culturas. No caso das colhedoras de trilha e separação radial o que se modifica são os elementos de trilha (cilindro e côncavo de dentes ao invés de barras).

Três sistemas de trilha, separação e limpeza predominam: trilha tangencial ou radial (convencional), composta por cilindro e côncavo de dentes e separação por saca-palhas; trilha e separação axial(rotores axiais),e o sistema de trilha tangencial ou radial (convencional) com sistema de separação axial (por rotores)denominadas híbridas. Cada um destes sistemas apresenta particularidades, sendo que a velocidade de trabalho constitui o principal fator determinante na eficiência de cada um, ou seja, podemos dizer que para cada sistema temos uma velocidade específica de colheita, onde velocidades menores comprometem a alimentação do sistema e/ou velocidades maiores sobrecarregam tanto os mecanismos de trilha quanto os mecanismos de separação e limpeza, ocasionando desta forma em um aumento significativo das perdas de grãos durante o processo de colheita.

Na prática, observa-se que as máquinas, muitas vezes, não estão trabalhando dentro da velocidade ideal, pois algumas possuem alta capacidade de trilha, porém baixa capacidade de separação,acarretando desta forma em perdas consideráveis. A grande pergunta é a que velocidade pode-setrabalhar com determinado sistema para que as perdas permaneçam dentro de valores considerados aceitáveis?

Pode-se dizer dessa forma, que cada máquina possui uma velocidade ideal de trabalho, onde as perdas, acima ou abaixo desta velocidade aumentam de forma significativa. Portanto, as perdas são oriundas da interação entre a velocidade de trabalho e o sistema de trilha, quando se avalia somente os mecanismos internos da colhedora.

A colheita de arroz irrigado normalmente é realizada em velocidades que vão desde 1 até 3 km/h, dependendo dos sistemas de trilha e separação utilizados. No entanto, as particularidades da cultura juntamente com extensas áreas cultivadas,tendem a forçar os agricultores a aumentar a velocidade de operação de suas máquinas, objetivando o aumento da capacidade operacional, ou seja, colher uma área maior dentro do mesmo período de tempo.

Neste contexto, nada adianta reduzir a velocidade de trabalho buscando reduzir as perdas de colheita e não conseguir atingir as metas diárias de colheita estabelecidas, sendo o prejuízo ainda maior para o agricultor.Este deve rever o planejamento (épocas utilizadas para implantação da cultura, tratamentos culturais e período disponível para colheita) e se caso for necessário, viabilizar a aquisição de mais máquinas.

O ponto de equilíbrio entre o aumento da velocidade de trabalho e as perdas,devido à demora na realização dacolheita,deve ser muito bem observado, pois variam de lavoura para lavoura e de um ano para o outro, da umidade dos grãos, produtividade da área e da variedade de arroz que está sendo colhida. Neste caso, a melhor maneira para reduzir as perdas de colheita é realizar a avaliação diretamente no campo em funçãoda velocidade ideal de trabalho, de acordo com cada mecanismo interno de trilha, separação e limpeza.

A determinação das perdas no arroz irrigado é bastante complicada em função do grande volume de palha, além da maior parte da lavoura estar sob uma lâmina d'água, tornando impossível coletar e quantificar os grãos assim como é realizado normalmente em lavouras de terras altas, cultivadas com culturas de sequeiro. Em função dessas dificuldades, soluções alternativas como a utilização de uma lona plástica enrolada em um tubo, presoà parte posterior da máquina, permite que toda a palhada, juntamente com grãos e panículas não trilhadas (proveniente dos mecanismos internos da colhedora),possa serrecolhida com a máquina em movimento. Após a estabilização do fluxo de palha e grãos dentro dos mecanismos internos da colhedora, desenrola-se a lona, realizando a coleta do material,sem interromper o deslocamento da máquina.

O cálculo para determinação das perdas é simples.Multiplica-se o comprimento da lona pela largura da plataforma de corte, tendo assim a área de colheita amostrada. Por exemplo, se a lona possui 3 metros de comprimento (a ser desenrolada) e a colhedora tiver uma plataforma de 5,80 metros de largura,sendo coletados 100 gramas de grãos de arroz dentro da área determinada, teremos neste caso o cálculo com o seguinte resultado: 3 x 5,80 = 17,4m2. Se multiplicarmos 0,1 kg (100 gramas)por 10.000m2 (1hectare) e dividirmos pela área (17,4 m2) obtemos diretamente os valores das perdas, sendo neste caso igual a 57,47kg/ha. Cabe ressaltar que essa metodologia só se aplica para a determinação das perdas oriundas dos mecanismos internos da máquina, sendo que as perdas provenientes da plataforma de corte e recolhimento não são mensuradas neste caso.

Ao realizar trabalhospara a determinação da velocidade ideal de operação, em função do nível de perdas de colheita,em propriedadeslocalizadas no município de Itaqui (RS),onde foram cultivadas a mesma variedade de arroz irrigado, pôde-se observar uma grande variação nos valores de perdas envolvendo a velocidade de trabalho e os sistemas de trilha, separação e limpeza das colhedoras.

Foram avaliadas três colhedoras para cada um dos mecanismos de trilha mencionados anteriormente, devidamente reguladas, conforme as orientações contidas nos manuais dos fabricantes, sendo realizadas três repetições para cada velocidade de trabalho comumente utilizada para a colheita mecanizada de arroz irrigado(1;2; 2,5 e 3 km/h). Os resultados obtidos a campo demonstraram que na condição em que a pesquisa foi realizada,cada sistema de trilha apresentou diferentes valores de perdas, em função do aumento da velocidade de trabalho. Essa variação se deve em parte ao fluxo de palha e grãos que passa pelos mecanismos internos da colhedora para uma determinada regulagem. Neste sentido, não basta apenas controlar a velocidade de deslocamento, sem antes realizar a regulagem correta. Pode-se notar claramente que, quando mantida constante a regulagem, as perdas cresceram proporcionalmente em função do aumento da velocidade. Cada sistema apresenta uma capacidade de processamento compatível com a regulagem interna. Sendo assim, quando se altera a velocidade, automaticamente deve-se rever a rotação do rotor ou do cilindro de trilha, bem como a abertura de côncavo, peneiras e fluxo de ar, visto que ocorre maior demanda do sistema de trilha, separação e limpeza devido ao aumento do volume de material coletado pela máquina, ocasionado peloaumento da velocidade de deslocamento. Cada colhedora possui características próprias de regulagem, diferenciando entre marcas e modelos. Neste caso o operador deve estar atento às particularidades inerentes a cada máquina, visando obter o máximo rendimento das mesmas.

Outro ponto importante observado refere-se à falta de conhecimento desses fatores por parte de alguns operadores, sendo que muitos deles se quer têm consciência de que ao aumentara velocidade de deslocamento, aumenta a necessidade de novas regulagensdos mecanismos internos da colhedora, sendo que apenas tem o conhecimento de que ao aumentar a velocidade de trabalho também se aumentam as perdas durante a colheita. Essa falta de conhecimento pode refletir em uma diminuição considerável na capacidade operacional ou até mesmo repassar uma falsa informação de perdas de uma colhedora de determinada marca ou modelo.

As colhedoras axiais, por exemplo, normalmente possuem maiores plataformas de corte, consequentemente apresentam maior capacidade operacional em relação às demais, embora muitos agricultores optem por plataformas de mesmo tamanho que as colhedoras de trilha radial e separação axial (híbridas),acarretando em uma diminuição considerável dos valores de perdas, devido ao menor volume de massa (palhada) a ser processado pelo sistema de trilha, separação e limpeza, podendo dessa forma aumentar a velocidade de deslocamento. O contrário também pode ser feito, ou seja, manter o tamanho original de plataforma diminuindo a velocidade de deslocamento, mantendo-se assim inalterada a capacidade operacional,desde que o formato dos talhões e trajetos existentes na lavoura a ser colhidapermitam que isso seja feito.

Foi possível observar, para todas as máquinas utilizadas no experimento, que quando se empregava maior avanço na velocidade de trabalho, realizando pequenas alterações na regulagem, as perdas não variavam de forma significativa que comprometesse a colheita, porém até determinado limite, no qual as regulagens não apresentavam mais efeito. Esse limite é a capacidade máxima de trilha da máquina para uma dada velocidade,atingindo perdas ainda dentro dos padrões aceitáveis e, difere de um sistema para outro e também entre cultivares de arroz. Desta forma, justifica-se a importância do monitoramento frequente das perdas na colheita do arroz irrigado, levando-se ainda em consideração os inúmeros fatores intrínsecos a cultura e as particularidades na regulagem de cada máquina.

O fator chave para o sucesso de uma máquina, neste caso a colhedora, começa no projeto, onde o desenvolvimento deve ter como foco principal uma colhedora que atenda as necessidades dos clientes.Desta forma, dependendo do sistema de trilha presente na máquina,é de fundamental importância o conhecimento da regulagem e de qual velocidade de trabalho deve ser utilizada para que as perdas de grãos sejam as menorespossíveis dentro de uma capacidade operacional compatível com as necessidades do produtor.

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