Artigo - Aproveitamento de plantas bioativas

02.12.2008 | 21:59 (UTC -3)

O conceito de “plantas bioativas” é relativamente recente e, por vezes, pode causar estranheza, quando se leva em conta que toda a planta possui uma atividade biológica inerente a si própria. Contudo, a expressão foi criada para designar aquelas plantas que possuem alguma ação sobre outros seres vivos e cujo efeito pode manifestar-se tanto pela sua presença em um ambiente quanto pelo uso direto de substâncias delas extraídas, desde que mediante uma intenção ou consciência humana deste efeito. Assim, são consideradas como bioativas as plantas medicinais, aromáticas, condimentares, inseticidas, repelentes, tóxicas, bactericidas e até mesmo as que possuem cunho místico ou religioso.

Os agricultores conhecem e fazem uso de inúmeras plantas bioativas, seja ao beber um chá de marcela após a refeição ou ao preparar uma calda de fumo, para controle de pulgões na horta. Embora as plantas bioativas sejam lembradas mais efetivamente por suas propriedades medicinais, sua aplicação na área agrícola tem ganho muito espaço nos meios científicos nos últimos anos. Uma das plantas de maior destaque na agricultura orgânica é o Nim (Azadirachta indica), cujos efeitos de controle são reportados sobre mais de 500 espécies de insetos, fungos e nematóides. Seu resultado tem sido tão positivo que, hoje, o óleo de Nim é encontrado para venda tanto em casas agrícolas especializadas em produtos ecológicos quanto em lojas agropecuárias convencionais.

Nesse contexto, o aproveitamento de plantas bioativas como estratégia tecnológica para a produção sustentável de alimentos pela agricultura familiar é uma possibilidade real e que deve ser discutida por agricultores, pesquisadores e extensionistas. Dentre as várias formas de aproveitamento das plantas bioativas, está o seu cultivo em consórcio com as espécies de interesse comercial. Sob este ponto de vista, sua ação pode ser pensada no intuito de repelir ou atrair, de suprimir a germinação de sementes de plantas espontâneas por efeito alelopático ou de agir sobre nematóides do solo, por exemplo. Outra forma de utilização das plantas bioativas nos agroecossistemas familiares se dá pela obtenção de extratos vegetais, por meio de tecnologias de custo reduzido e baixa complexidade, para a produção de soluções com ação fungicida, bactericida e inseticida.

Com esse enfoque, a Embrapa Clima Temperado tem realizado, de forma preliminar, testes com algumas espécies bioativas com potencial para serem aproveitadas pelos agricultores familiares. Uma das espécies mais promissoras é o chinchilho (Tagetes minuta L.), também conhecida como erva-fedorenta ou alfinete-do-campo. Essa planta é natural da América do Sul e é tradicionalmente utilizada com sucesso pelos agricultores, para combater a infestação de pulgas em casas e galpões.

O chinchilho é um subarbusto anual que atinge entre 1 e 2 metros de altura, multiplica-se por sementes e tem como uma de suas principais características o forte odor, por muitos considerado desagradável, sendo encontrada em praticamente todos os estados brasileiros. Estudos realizados em diversos países reportam o efeito do chinchilho sobre insetos, fungos, bactérias, nematóides e até mesmo como herbicida natural, efetivo no controle de espécies como a tiririca (Cyperus rotundus).

Além do uso das plantas bioativas na defesa fitossanitária dos cultivos agrícolas, em breve, outra janela para a complementação da renda de agricultores familiares se abrirá através do próprio cultivo de plantas medicinais. Com a recente criação da Política Nacional da Plantas Medicinas e Fitoterápicos e da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no Sistema Único de Saúde, espera-se que espécies como espinheira-santa (Maytenus ilicifolia), guaco (Mykania glomerata) e marcela (Achyrocline satureiroides), entre outras, sejam demandadas em grandes volumes. Embora ainda não estejam definidas as normas para a produção dessas espécies, sabe-se que a inserção dos agricultores familiares passará pela formação de grupos organizados, pelo manejo sustentável e sistemas de produção baseados em práticas ecológicas.

Pesquisador da Embrapa Clima Temperado

gustavo@cpact.embrapa.br

Compartilhar

LS Tractor Fevereiro