Bem-nutridas e prenhas

A subnutrição é a causa básica da baixa fertilidade pós-parto e a otimização da condição corporal das vacas se reflete em maiores taxas de fertilidade.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

Não há coisa mais bela que os ondulados campos sulinos com seus pastos, matos e as criações de bovinos e ovinos. Nestas paragens, uma cena comum no final do inverno são as vacas magras amamentando seus terneiros sobre os pastos lamacentos das chuvas freqüentes. As pastagens nativas que recobrem os diversos tipos de solos geralmente são de boa qualidade, mas disponíveis em quantidade insuficiente para suprir os requerimentos nutricionais das vacas com cria ao pé durante o inverno. Sempre que os produtores se deparam com este cenário sabem que o resultado é baixa taxa de natalidade no ano seguinte.

Com o objetivo de solucionar esse problema diversas tecnologias foram desenvolvidas nas últimas décadas, sendo que, na sua maioria, demandam ingresso de insumos com alimentação ou mesmo com a prescrição de hormônios para que as vacas, quase sem condições de sobreviver, fiquem novamente prenhes na primavera ou no verão que se segue. Neste contexto é importante considerar que os sistemas extensivos praticados na região não suportam economicamente a introdução indiscriminada de insumos, assim, a carga animal por unidade de área é que deve ser ajustada em função da disponibilidade de forragem. Esta deve ter sido a primeira recomendação da pesquisa em produção animal em qualquer lugar do mundo, porém, quase sempre negligenciada, uma vez que os produtores, por estratégia de sobrevivência econômica, mantém um número excessivo de animais nas suas propriedades, como um seguro, como uma poupança, ou mesmo como uma forma de se prevenir da classificação de suas propriedades como improdutivas. Essa estratégia de sobrevivência em alguns locais pode determinar a ocorrência de processos de desertificação, inviabilizando, no futuro, inclusive a implementação desses sistemas extensivos de criação.

A condição de nutrição dos animais pode ser facilmente estimada por uma metodologia de classificação dos animais em função de sua condição corporal. Essa prática tem sido muito recomendada pela extensão e pela pesquisa, porém, não tem sido empregada como um instrumento auxiliar da produção de bovinos de corte em sistemas extensivos. Logo após o parto, no final do inverno, normalmente, os requerimentos nutricionais das vacas, agora com cria ao pé, são superiores aqueles oferecidos pelo campo nativo e estas perdem peso e condição corporal, sendo que dificilmente apresentam condições fisiológicas para uma nova gestação na temporada subseqüente. As informações da pesquisa são de que a atividade ovariana é maior nas vacas com melhor condição corporal e, ainda, que vacas com condição corporal razoável, têm apenas uma probabilidade de 50% de ficarem prenhes na próxima temporada reprodutiva. A figura 1 (

) apresenta a freqüência de vacas em condição igual ou superior a 3 (razoável) em um sistema extensivo de criação ao longo do pós-parto, evidenciando a subnutrição, causa básica e implacável da baixa fertilidade pós-parto em gado de corte.

A alternativa simples seria monitorar os rebanhos, controlando a condição corporal das vacas de cria e tomando medidas corretivas de manejo (desmame ou ajuste da carga animal), de sanidade (profilaxia de enfermidades parasitárias) ou mesmo de suplementação alimentar impedindo que as vacas estejam em condição corporal inferior à razoável (CC3). Na ilustração abaixo são representados os escores de condição corporal mais freqüentes nas vacas com cria ao pé. Com o objetivo de auxiliar os interessados na classificação dos animais estes escores são acompanhados de um desenho esquemático, indicando que nas vacas em CC2 é possível a visualização de suas costelas e o perfil é côncavo; nas vacas em CC3, as costelas já não são visíveis e o perfil é linear; e, finalmente, nas vacas em CC4, já há algum acúmulo de gordura e o perfil é convexo.

Os estudos efetuados na Embrapa Pecuária Sul sobre a fertilidade pós-parto de vacas de corte a partir de meados da década de 90, indicaram que há presença de folículos ditos dominantes a partir da terceira semana pós-parto, independente da condição corporal das vacas. No entanto, uma maior atividade ovariana, caracterizada pelo diâmetro dos folículos nos ovários e população folicular, pode ser constatada em vacas com melhor condição corporal, diretamente relacionada com a ocorrência de ovulação, cio e fecundação de vacas com cria ao pé.

Os principais fatores que afetam a fertilidade pós-parto nos sistemas extensivos praticados na região são a data dos partos e seu estado nutricional, estimado pela avaliação da condição corporal. Todos os ensaios de pesquisa efetuados indicaram que o momento ideal para o início das atividades reprodutivas em vacas com cria ao pé deve ser em torno dos 60 dias pós-parto. Neste momento é importante uma reflexão: podemos empregar uma única prática para controle e/ou incremento da fertilidade? A resposta é não, porque as vacas são diferentes e se encontram em condições metabólicas diferentes em função da idade de suas crias, da sua produção de leite e da sua capacidade de encontrar alimento nas pastagens disponíveis. Nesse contexto, as principais recomendações para o controle da reprodução de bovinos de corte são:

• controlar as datas dos partos, de forma individual ou em grupos semanais, quinzenais ou mensais para facilitar o manejo dos animais;

• iniciar as atividades reprodutivas a partir de 60 dias pós-parto, ou seja, 60-75, 60-81 ou 60-90 dias;

• avaliar a condição corporal das vacas neste momento do pós-parto, nas vacas em CC2 proceder desmame total, pois carecem de maior ingresso líquido de energia, nas vacas em CC3 e 4 é possível o emprego de práticas de desmame temporário, ou mesmo, de práticas hormonais para indução de ovulação.

Resumindo, a busca constante da otimização da condição corporal das vacas é um fator capaz de promover bem-estar animal, proporcionando como reflexo maiores taxas de natalidade. Uma sugestão para os criadores de bovinos de corte seria acompanhar com alguma periodicidade a condição corporal de suas vacas, e, sempre que esta for igual ou inferior a CC2, proporcionar uma melhor condição de alimentação.

Maiores detalhes e informações sobre os efeitos da condição corporal sobre a atividade ovariana, a melhoria das condições sanitárias pós-parto, um modelo para emprego da condição corporal no controle da reprodução, a importância do controle da carga animal e uma alternativa econômica para a alimentação de vacas com cria ao pé podem ser obtidos nas publicações técnicas geradas pela Embrapa Pecuária Sul (

).

José Carlos Ferrugem Moraes

Embrapa Pecuária Sul

* Confira este artigo, com fotos e tabelas, em formato PDF. Basta clicar no link abaixo:

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