Cancro - a ameaça constante

O cancro cítrico, causado pela bactéria Xanthomonas axonopodis, é extremamente prejudicial aos pomares. Porém, diversas medidas podem ser adotadas para controlar o problema.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

O cancro cítrico é uma doença causada pela bactéria

, existindo cinco diferentes tipos (patovares - pv.) relacionados com as espécies cítricas hospedeiras e a região de ocorrência. O Cancro cítrico Asiático, ou Cancrose A, causada pelo pv. citri, é a de maior distribuição mundial e ataca todas as espécies de laranjeiras doces e limoeiros. As laranjeiras doces comumente cultivadas no Brasil (‘Pera’, ‘Natal’, ‘Valência’ e ‘Hamlin’) não apresentam resistência à doença. Materiais considerados resistentes, mas não imunes, são as tangerineiras ‘Satsuma’ e ‘Ponkan’, a limeira ácida ‘Tahiti’ e a laranjeira doce ‘Folha Murcha’. Maior suscetibilidade é observada em limeira ácida ‘Galego’, limoeiro ‘Siciliano’ e laranjeiras doces ‘Bahia’ e ‘Baianinha’.

A bactéria sobrevive em folhas, ramos e frutos com sintomas, destacados ou não das plantas, constituindo o inóculo para novas infecções. A sobrevivência também ocorre em plantas daninhas, restos de cultura e materiais de colheita por períodos de tempo que variam de alguns dias a meses. No caso de órgãos da planta com sintomas da doença, como folhas, por exemplo, a bactéria se mantém viável até a decomposição total dos tecidos.

A disseminação da bactéria ocorre por diferentes meios. Em condições naturais, sem a influência direta do homem, dá-se principalmente por respingos de chuvas. Quando estes ocorrem juntamente com ventos, a disseminação dá-se a média/longa distâncias, podendo a bactéria atingir outros pomares. Materiais contaminados, como mudas, restos de cultura (folhas, frutos), equipamentos de colheita, máquinas e implementos agrícolas permitem a dispersão a longa distância, pela influência do homem, podendo introduzir a doença em regiões ou países sem histórico de sua ocorrência.

A bactéria pode penetrar pelas aberturas naturais, como os estômatos, ou através de ferimentos provocados por espinhos, insetos, etc. Tecidos jovens, tanto de folhas como de ramos e frutos, são mais suscetíveis à infecção pela bactéria.

Os sintomas da doença ocorrem em folhas, ramos e frutos. O primeiro sinal visível da doença é o aparecimento de pequenas lesões salientes, que surgem nos dois lados das folhas, sem deformá-las. As lesões aparecem na cor amarela e logo se tornam marrons. É a única doença de citros com lesões salientes que aparecem nos dois lados da folha. Em estádio mais avançado, as lesões nas folhas ficam semelhantes a verrugas, com centro marrom e um halo amarelado. Nos frutos, a doença se manifesta pelo surgimento de pequenas manchas amarelas que aos poucos vão crescendo e tornando-se marrons. As manchas são salientes, parecidas com verrugas, de cor marrom no centro. As lesões nos ramos também são salientes, na forma de crostas de cor parda.

As perdas ocorrem em função da redução da área fotossintética da planta, provocada pelos sintomas necróticos nas folhas e pela desfolha, perda de valor de mercado dos frutos com sintomas, queda de frutos, depreciação da propriedade, gastos com prevenção e erradicação de plantas. Além disso, o cancro cítrico é uma doença quarentenária, podendo barreiras comerciais nacionais e internacionais serem impostas a áreas com ocorrência da doença.

O cancro cítrico é originário do continente Asiático, onde ocorre de forma endêmica. Sua primeira constatação foi em material cítrico coletado na Índia no início do século XIX. Atualmente, encontra-se em dezenas de países, entre os quais os dois maiores produtores mundiais de citros - Brasil e E.U.A., além dos demais países do Cone Sul - Argentina, Paraguai e Uruguai. A doença nunca foi constatada no continente europeu.

No Brasil, a doença foi observada primeiramente em 1957, na cidade de Presidente Prudente, no Estado de São Paulo. Em 1958, foi detectada nos Estados do Paraná e Mato Grosso do Sul. Atualmente, o cancro cítrico também ocorre em pomares do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Em Minas Gerais e Goiás, focos da doença não têm sido encontrados nos últimos anos.

Em São Paulo, um programa de erradicação foi iniciado logo após a detecção da doença em 1957. Com o passar dos anos, novos focos foram sendo encontrados em diferentes municípios da área nobre da citricultura paulista, apesar da continuidade da campanha de erradicação. Em 1996, ocorreu a introdução da larva minadora dos citros (

) em São Paulo e o aumento no número de focos da doença em todo parque citrícola. O mesmo ocorreu em outros estados brasileiros, assim como nos E.U.A., Argentina e Uruguai, entre outros. A larva minadora se desenvolve em brotações novas, formando galerias que facilitam a penetração da bactéria nas folhas e, também, permitem um aumento do número de lesões nas folhas, potencializando a epidemia de cancro cítrico.

Em setembro de 1999, a legislação concernente à erradicação do cancro cítrico no Estado de São Paulo foi alterada em função da ineficiência do método anteriormente adotado. Passou-se a adotar como critério a porcentagem de plantas doentes no talhão. Quando essa porcentagem for superior a 0,5% (seis plantas ou mais em um talhão com mil plantas), todo o talhão deve ser erradicado. Quando essa porcentagem for inferior ou igual a 0,5%, adota-se o raio de trinta metros ao redor da(s) planta(s) doente(s). A adoção desse novo critério de erradicação tem resultado num eficiente controle da doença no Estado.

O emprego de cortinas quebra-vento é uma das principais técnicas de prevenção à doença. Plantas como pinus, eucalipto, grevilha, casuarina e leucena, podem ser empregadas como quebra-vento, devendo-se considerar vários fatores para a escolha da melhor espécie, o que varia de local para local e em função dos objetivos do proprietário. Associado ou não ao quebra-vento, pode-se empregar, sempre preventivamente, produtos cúpricos na cultura. Estes devem ser aplicados na estação das chuvas, na época do surgimento de brotações novas, podendo também serem direcionados para outras doenças, simultaneamente. É importante atentar para o fato de que pulverizações cúpricas somente deverão ser empregadas para a prevenção do cancro cítrico, quando da existência da doença em talhões ou propriedades vizinhos ou em talhões que sofreram erradicação parcial (raio).

Por tratar-se de doença quarentenária, o único método de controle eficiente é a eliminação das plantas doentes e das suspeitas de infecção ao redor. Em função disso, a queima dos restos de cultura, a eliminação das plantas daninhas e o impedimento de plantio de citros por dois anos, em áreas que sofreram erradicação, constituem-se em medidas empregadas para assegurar a eliminação total da bactéria. O uso de desinfetantes, como amônia quaternária, digluconato de clorohexidina e hipoclorito de sódio, são imprescindíveis na limpeza de equipamentos de colheita, equipamentos e máquinas utilizadas no pomar e na desinfetação de veículos que adentram a propriedade.

Apesar de a bactéria ainda não ter sido totalmente eliminada do país, mesmo no Estado de São Paulo, que apresenta maior rigor na erradicação das plantas, a campanha de erradicação conduzida desde 1957 manteve a doença em baixa incidência.

A união entre produtores e poder público é essencial no combate à doença. Medidas de prevenção e inspeções no pomar devem ser adotadas pelo produtor. Qualquer suspeita de cancro cítrico deve ser comunicada imediatamente aos órgãos de defesa da citricultura (Secretarias da Agricultura e Fundecitrus - Fundo de Defesa da Citricultura). A rápida adoção de medidas de erradicação, conforme a legislação de cada Estado, faz parte das ações do Governo Estadual. A fiscalização das divisas entre Estados e Países e em portos e aeroportos nunca deve ser colocada em segundo plano, devendo fazer parte da rotina em cada Estado. Órgãos de assistência técnica, governos e universidades devem esclarecer os produtores acerca da doença e de como fazer a prevenção adequada.

José Belasque Júnior, Renato Beozzo Bassanezi, Marcel Bellato Spósito e Pedro Takao Yamamoto,

Fundecitrus

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