Como combater o ácaro da lichia

Desde a introdução do ácaro da lichia no Brasil, a produção da fruta caiu drasticamente por conta da incidência da praga que, além de afetar o desenvolvimento das plantas e folhagens, tem poder de danificar

13.07.2016 | 20:59 (UTC -3)

Várias frutas tropicais foram trazidas ao Brasil no tempo da navegação portuguesa. Já no século 16 cultivava-se, no País, o figo, a banana, a carambola, a romã, a jaca, a laranja e a manga. Por volta de 1800 foi introduzida a fruta-pão, em 1810 a lichia e, mais recentemente, em 1970, o quivi (Lorenzi et al, 2006).

Do detalhado trabalho de Higgins (1917), “A lichia no Hawaii", coleta-se a informação sobre o transporte da lichia na outra direção, isto é, do sudeste da Ásia, através do Pacífico, até o Hawai. Informa o autor que relatos sobre a lichia encontram-se em escritos chineses anteriores à era cristã e sua origem deve estar entre o sul da China e o Sudeste Asiático. De lá foi introduzida há muito no Sri Lanka, Índia, Taiwan , Austrália e Ilhas Maurício. Também faz referência à sua presença no Brasil e no Caribe. Em 1873 a primeira árvore foi trazida para o Havaí, tendo a lichia chegado à Flórida (Euan) por volta de 1886. Na Califórnia (Euan) uma planta vinda da Índia teria sido introduzida em 1897. No item sobre propagação, Higgins informa que as sementes, embora germinem bem, têm vida curtíssima, perdendo o poder de germinação em cerca de cinco dias. Ou seja, o transporte da lichia sempre se deu através de plantas, árvores.

Higgins também já faz referência à presença de um ácaro eriofiídio, observado no Havaí pela primeira vez em 1816, que destruía a folhagem, informando que o porta-enxerto então usado, longan (Dimocarpus longan), era resistente a esse ácaro.

A erinose da lichia também é conhecida há muito: desde 1912 na Índia, 1945 na Flórida (Euan), 1963 em Bangladesh, 1981 na Austrália, 1985 em Taiwan, segundo Waite & McAlpine (1992). Esses autores verificaram o transporte do ácaro da erinose da lichia, vivo, pela abelha melífera, discutindo isso no contexto de observações de “infestações espontâneas" em inflorescências de plantas de pomares até então isentos da praga.

A introdução da lichia no Brasil por volta de 1810 (o relato de 1810 menciona uma árvore de porte, portanto, já teria de um a dois anos de cultivo) se deu por plantas isentas do ácaro da erinose, pois a cultura desta fruteira se expandiu por 200 anos sem qualquer indício da presença do ácaro da erinose, cujo primeiro relato se deu em 2008 (Raga et al, 2008), em pomar de Limeira, estado de São Paulo.

Apesar dos muitos trabalhos publicados em outras regiões do mundo alertando acerca dos danos causados à lichia pelo ácaro da erinose e da regulamentação do ácaro como Praga Quarentenária Ausente (A1) (Mapa, Instrução Normativa Nº 52, 20 novembro de 2007), plantas infestadas foram importadas sem os devidos cuidados. As medidas quarentenárias que poderiam/deveriam tê-las interceptado foram inexistentes ou ineficazes. É possível que o ácaro tenha sido introduzido inadvertidamente no país através da importação ilegal de material de propagação por algum cidadão imprudente, desinformado e impune.

Até a introdução do ácaro da lichia no Brasil, a cultura era considerada pelos agricultores como bastante resistente a pragas e vinha se expandindo nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná. Atualmente, o ácaro da erinose da lichia é considerado uma praga-chave da cultura. As infestações do ácaro têm ocasionado perdas quantitativas e qualitativas na produção. Além de afetar o desenvolvimento das plantas e as folhagens, os ácaros podem danificar diretamente os frutos. A aplicação de medidas de controle dos ácaros tem sido indispensável, o que passou a elevar significativamente o custo de produção. A produção de lichia no Brasil caiu drasticamente nos últimos cinco anos e isso se deve, em muito, à erinose das lichieiras.

Restam, agora, indagações. Quem arcará com os prejuízos causados pela praga no país, que vem comprometendo uma cultura que vinha se expandindo em diversos estados e com ótimas perspectivas? Como está o Brasil preparado para a defesa do agronegócio, um de seus grandes alicerces? Será a defesa fitossanitária uma utopia enquanto não houver investimentos que realmente permitam um salto qualitativo no sistema?

No momento o setor agrícola enfrenta o desafio de controlar outro grande inimigo, a bem conhecida Helicoverpa armigera, e manter a sustentabilidade e rentabilidade dos cultivos. O que fazer para nos protegermos de minúsculos organismos que também representam importantes ameaças à nossa agricultura?

Por Carlos Flechtmann e Denise Navia

(Artigo na edição 83 da Revista Cultivar Hortaliças e Frutas.)

Mais informações em: "Manejo do ácaro da lichia".

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