Como controlar podridão abacaxi em cana

Manejo exige integração de medidas, que incluem atenção à época do plantio e emprego de fungicidas quando necessário

23.04.2020 | 20:59 (UTC -3)

Causada por Ceratocystis paradoxa, a podridão do abacaxi é uma doença fúngica que ataca a cana-de-açúcar e provoca prejuízos capazes de comprometer a produtividade em até 35%. Seu manejo exige integração de medidas, que incluem atenção à época do plantio e emprego de fungicidas quando necessário.

Dentre os fungos que podem atacar os rebolos de cana-de-açúcar após o plantio, destaca-se a espécie Ceratocystis paradoxa, agente causal da doença conhecida como Podridão Abacaxi. Esse fungo é capaz de atacar diversas plantas, como bananeira, palmeira, coqueiro e abacaxizeiro, e está presente em praticamente todas as regiões produtoras de cana do país.

A Podridão Abacaxi inibe ou retarda a germinação da cana. Áreas atacadas ficam com aspecto irregular, apresentando muitas falhas; em alguns casos, é necessário o replantio, operação bastante onerosa. Os prejuízos não se resumem às falhas, mas também ao menor desenvolvimento das plantas. Áreas com ataques severos de Podridão Abacaxi podem apresentar reduções de até 35% na produtividade. Havendo queda de produtividade, é certo que a rentabilidade do produtor também será afetada.

Dos fatores ambientais que influenciam a germinação da cana, a temperatura é o mais importante. Para uma germinação satisfatória, a temperatura do solo deve estar acima de 21°C. De um modo geral, pode-se afirmar que em temperaturas abaixo de 21°C o desenvolvimento das gemas é bastante lento; acima de 21ºC, a velocidade de germinação aumenta progressivamente e atinge um ótimo entre 31°C e 36°C. Outro fator importante é a umidade do solo; sua falta, ou até mesmo o excesso, podem prejudicar a germinação.

Quando condições desfavoráveis de temperatura e umidade atrasam a germinação da cana, os esporos de Ceratocystis paradoxa presentes no solo são estimulados a germinar por substâncias liberadas pelos rebolos e penetram por suas extremidades. Essa observação é particularmente importante, pois durante o plantio os colmos são seccionados em rebolos de três a quatro gemas, medida que ajuda a uniformizar a germinação; por outro lado, as extremidades dos rebolos são a principal porta de entrada para o fungo.

Em rebolos recém-invadidos, observa-se um encharcamento, que se inicia na região do corte e que se aprofunda rapidamente, acompanhado por um avermelhamento na parte interna dos rebolos, decorrente da produção de substâncias de defesa pela planta. À medida que a podridão avança, a coloração interna dos rebolos vai se alterando, passando para cinza, pardo-escura e negra. Nesta última fase, somente a casca dos rebolos continua intacta; os feixes vasculares internos estão soltos e recobertos por uma massa negra de esporos do fungo.

Rebolos infectados podem começar  o desenvolvimento de raízes e gemas. No entanto, são geradas plantas fracas, que morrem antes de emergirem do solo, ou que são dominadas pelo mato ou pela competição com plantas vizinhas. O sintoma típico da Podridão Abacaxi é a fermentação dos rebolos, que passam a exalar odor característico de abacaxi maduro. Esse sintoma ocorre principalmente nas fases iniciais do ataque, quando os rebolos ainda possuem reservas de açúcar.

Outros fatores que retardam a germinação da cana e favorecem a Podridão Abacaxi são o  uso de mudas de má qualidade, cobertura muito profunda dos rebolos e plantios em solos mal preparados. Os impactos da Podridão Abacaxi tendem a crescer com a adoção do plantio mecanizado. Neste sistema, os rebolos são colhidos mecanicamente e, por isso, possuem mais ferimentos em relação aos apanhados manualmente. Com isso, aumentam-se as portas de entrada para o fungo.

Fase inicial de ataque da podridão abacaxi em cana.
Fase inicial de ataque da podridão abacaxi em cana.
Sintomas da fase final da doença.
Sintomas da fase final da doença.

Como controlar

Dentre os métodos que podem ser empregados para minimizar a Podridão Abacaxi, o mais simples e eficaz é a escolha da época de plantio. Quando existem condições ótimas de temperatura e umidade para a germinação da cana, o fungo pode estar presente no solo, porém seus danos não ocorrem. Assim que as plantas emergem do solo e começam os processos fotossintéticos, se tornam imunes à doença. Na região Centro-Sul do Brasil, o plantio realizado entre os meses de setembro e março é suficiente para controlar a doença.

Porém, quando a escolha da época de plantio não é possível, outras técnicas devem ser empregadas para o manejo da Podridão Abacaxi. Dentre os métodos disponíveis, qualquer medida que estimule a germinação rápida da cana reduz os impactos da doença. Por exemplo, variedades de rápida germinação e com boa velocidade de desenvolvimento inicial são consideradas resistentes ao fungo e devem ser utilizadas. Outra medida eficaz é empregar rebolos com gemas mais jovens, que germinam mais rápido que as gemas mais velhas.

Antes do plantio, deve-se fazer um bom preparo de solo, com o objetivo de eliminar os torrões e reduzir a compactação, fornecendo melhores condições para a germinação da cana. Além disso, os rebolos devem ser plantados em uma profundidade adequada, uma vez que plantios muito profundos atrasam a germinação e favorecem a ação do fungo.
O corte dos colmos em rebolos maiores, ou mesmo o plantio de colmos inteiros, também reduz o impacto da Podridão Abacaxi. Essa prática tem efeito sobre a doença porque há uma diminuição na quantidade de ferimentos nos rebolos e, consequentemente, diminuem-se as portas de entrada para o fungo.

Quando os rebolos são provenientes de colheita mecanizada, é recomendável o plantio em maiores densidades, ou seja, utilizar uma quantidade maior de gemas por metro de sulco. Essa medida compensa as possíveis falhas de germinação devido à Podridão Abacaxi, uma vez que os rebolos colhidos mecanicamente são menores e mais danificados que os colhidos manualmente. Em alguns casos, o plantio em maiores densidades evita o replantio na área, operação onerosa para usinas e produtores.

A aplicação de fungicidas nos rebolos também produz bons resultados no controle da Podridão Abacaxi e vem sendo bastante utilizada nos plantios de inverno. Seu uso é indispensável quando o plantio é realizado em condições desfavoráveis à germinação e em áreas com histórico comprovado da doença. Alguns fungicidas proporcionam aumentos de 15% a 20% na produtividade em comparação a áreas ou parcelas onde nenhum tratamento foi realizado. Os produtos agem protegendo as extremidades dos rebolos contra a penetração do fungo ou, em alguns casos, acelerando a germinação da cana. Existem diversos produtos registrados para o controle da Podridão Abacaxi, sendo que a maioria é composta por uma mistura de estrobilurina com triazol.

É possível concluir que existem diversas maneiras de se controlar a Podridão Abacaxi, caso se opte pelo plantio de inverno. Porém, o ideal não é utilizar as diferentes técnicas isoladamente.  Ao invés disso recomenda-se fazer o manejo integrado, isto é, utilizar os métodos de controle em conjunto, desde o preparo de solo até o plantio, para reduzir os impactos da doença de maneira sustentável e sem aumentar consideravelmente os custos de produção.

Produção de cana e plantio no inverno 

O Brasil é o maior produtor mundial de cana-de-açúcar, seguido por Índia, China, Tailândia e Paquistão. A produção brasileira na safra 2015/16 está estimada em 658 milhões de toneladas, em uma área de aproximadamente nove milhões de hectares. A produtividade deverá ser 3,9% superior em relação à safra anterior, passando de 70,5 t/ha para 73,2 t/ha. A produção de açúcar será próxima de 35 milhões de toneladas e a de etanol será superior a 29 bilhões de litros. São Paulo é o maior estado produtor, com mais de 50% da produção nacional, seguido por Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Paraná.

Na região Centro-Sul do Brasil, a maior parte do plantio de cana-de-açúcar é realizado entre os meses de setembro e março, período mais quente e chuvoso do ano, quando predominam condições favoráveis à germinação. No entanto, vem crescendo o número de usinas e produtores que fazem o plantio de inverno, realizado entre abril e agosto.

Algumas vantagens do plantio de inverno são a alta produtividade e o fato da área não passar um ano sem colheita, como acontece no plantio de ano e meio, realizado entre janeiro e março. Outra vantagem é que o plantio de inverno permite que usinas e produtores façam o plantio de cana praticamente durante o ano todo. Ao distribuir o plantio ao longo do ano, usinas e produtores utilizam seus maquinários de maneira mais racional; há um ganho em eficiência e diminui-se o número de equipamentos necessários para plantar toda a área.

Entretanto, o plantio de inverno possui algumas desvantagens. Uma delas é a necessidade de irrigação, pois o plantio é realizado na época mais seca do ano. Além disso, predominam condições de baixas temperaturas que, aliadas à menor oferta hídrica, atrasam a germinação da cana; dessa forma, os rebolos - pedaços de colmos utilizados no plantio e que possuem de três a quatro gemas - ficam expostos a algumas espécies de fungos presentes no solo, que podem causar podridões nos mesmos.


Roberto Giacomini Chapola, PMGCA/UFSCar/Ridesa


Artigo publicado na edição 203 da Cultivar Grandes Culturas.

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