Desafios da colheita mecanizada da cana

Um dos cuidados na hora da colheita da cana é com a qualidade do corte, que influenciará diretamente na rebrota das soqueiras. Alguns tipos de facas utilizadas na colheita mecanizada tem melhor desempenho que outros, de acordo com pesquisa r

14.11.2016 | 21:59 (UTC -3)

O corte de base quando realizado com qualidade, durante a colheita mecanizada de cana-de-açúcar, poderá assegurar o melhor aproveitamento da lavoura, bem como menores índices de danos e abalos as soqueiras e de contaminações da matéria prima, garantindo assim as condições agronômicas propícias para haver a rebrota do canavial sem a diminuição da produtividade nas safras futuras.

Neste sentido, diversos estudos tem apontado o mecanismo de corte basal como responsável por uma boa quantidade das perdas na colheita mecanizada da cana-de-açúcar, além de proporcionar a incorporação de impurezas minerais devido ao contato das lâminas com o solo (Figura 2). Associado a isso, o desgaste das facas de corte também pode possuir influência nos índices de danos e abalos causados às soqueiras, podendo este ser um dos fatores principais destes problemas. Porém, no mercado brasileiro existem atualmente diversos tipos e modelos de facas para a realização do corte basal, cada uma com suas peculiaridades específicas, e o uso destas pode influenciar os índices de danos e abalos causados às soqueiras, refletindo na rebrota do canavial.

Diante disso, partindo do pressuposto que os diferentes tipos de facas e suas inclinações afetem a qualidade do corte de base, o Laboratório de Máquinas e Mecanização Agrícola (LAMMA), desenvolveu um trabalho para avaliar a qualidade do corte basal na colheita mecanizada de cana-de-açúcar crua, efetuado por três modelos de facas, sendo duas delas revestidas com carbeto de tungstênio com ângulos de 10º e 13º e a outra sem revestimento com ângulo de 10º.

O experimento foi realizado em áreas produtivas de uma usina de cana-de-açúcar, localizada no município de Pradópolis (SP), com declividade média de 3% e solo de textura argilosa, com média de aproximadamente 57% do teor de argila. A cana-de-açúcar da variedade RB86-7515 foi implantada com espaçamento de 1,50 m nas entrefileiras. A colheita da cana-de-açúcar foi realizada por uma colhedora Case-IH modelo A7700, fabricada em 2007, equipada com motor Cummins, cuja potência nominal é de 246 kW (330 cv). A colhedora é equipada com rodados de esteiras, com bitola de 1,88 m e trabalhou com velocidade média de deslocamento de 5 km/h, com copiador do perfil do solo desligado no momento da colheita.

As facas revestidas com a liga metálica de carbeto de tungstênio utilizadas apresentavam ângulos das faces inferiores de 10 e 13º, espessura de 6 mm, com granulometria do revestimento de 0,15 a 0,30 mm e espessura de 0,5 a 1,0 mm. O revestimento é depositado na parte inferior do perfil de corte (Figura 3). As facas lisas com ângulos de 10° não apresentavam revestimento, e também possuíam espessura de 6 mm. A caracterização do porte do canavial foi determinada, realizando cinco amostragens ao acaso, utilizando-se a metodologia padrão, por meio de auxílio de um triangulo com angulações de 45 e 90°.

Os dados foram coletados entre julho e agosto de 2011, utilizando-se os três modelos de facas para o corte basal durante o prazo de 60 horas de trabalho, tempo este correspondente à vida útil das quatro faces das facas lisas sem revestimento, sendo invertidas suas faces cortantes a cada 15 horas de uso. Neste mesmo período a faca revestida de 10 e 13° de inclinação trabalhou com uma única face cortante, sem a necessidade de inversão (Tabela 1).

Tabela 1. Tempo de uso de cada modelo de faca do mecanismo de corte basal.

Modelo de faca

Tempo total de uso (horas)

Faca revestida 13° (FR 13°)

60*

Faca revestida 10° (FR 10°)

60*

Faca lisa sem revestimento 10° (FLSR 10°)

60**

*Utilização somente de uma das faces cortantes da faca.

**Utilização de todas as faces cortantes da faca.

Tabela 1. Tempo de uso de cada modelo de faca do mecanismo de corte basal.

Modelo de faca

Tempo total de uso (horas)

Faca revestida 13° (FR 13°)

60*

Faca revestida 10° (FR 10°)

60*

Faca lisa sem revestimento 10° (FLSR 10°)

60**

*Utilização somente de uma das faces cortantes da faca.

**Utilização de todas as faces cortantes da faca.

O delineamento estatístico utilizado foi inteiramente casualizado, com diferentes repetições para cada modelo de faca após a colheita mecanizada. A escolha do momento de inversão das facas foi definida de acordo com critérios da usina, que considerou somente o desgaste do fio de corte das facas. Para avaliar a qualidade do corte de base foram avaliados os índices de danos e de abalos às soqueiras encontrados dentro de uma área amostral de 0,25 m2. O índice de danos às soqueiras foi definido visualmente a partir da classificação dos danos causados aos colmos após a colheita mecanizada de cana-de-açúcar. Após a identificação e contagem de cada tipo de dano existente (sem danos (-1,00), danos periféricos (-0,33) e danos fragmentados (1,00)), calculou-se do índice de danos em cada soqueira, atribuindo-se os pesos para cada classificação (Toledo, 2012), calculando-se conforme a equação 1.

O índice de abalo às soqueiras foi avaliado por meio da aplicação de força manual, verificando-se a mobilização direta das soqueiras no solo, classificando-se o abalo como forte, médio e fraco, de acordo com a mobilidade da soqueira provocada pela força aplicada. Quanto maior a mobilização, maior é o abalo das soqueiras. Após a identificação e contagem de cada tipo de abalo existente, propôs-se o cálculo do índice de abalo em cada soqueira, atribuindo-se pesos para cada classificação, calculando-se conforme a equação 2 (Toledo, 2012).

Pela proposta apresentada, os índices de danos e abalos às soqueiras representam em um único valor a classificação atribuída às soqueiras com colmos sem danos, danos periféricos e fragmentados, bem como abalos fraco, médio e forte, respectivamente. Quanto mais próximo de 1,00, maior é o nível de dano e/ou abalo ocasionado às soqueiras, pois, demonstra que houve maior quantidade de colmos classificados como fragmentados e/ou com abalo forte em relação às outras categorias. Inversamente, quanto mais próximo de -1,00, os colmos sofreram menos danos e/ou abalo fraco, sendo totalmente sem danos ou com abalo fraco quando os índices forem iguais a este valor.

A caracterização do porte do canavial foi classificado como ereto, com 38,9, 53,3 e 48,3% de colmos acimas de 45°, para os tratamentos FR 10°, FR 13° e FLSR 10°, respectivamente.

O índice de danos às soqueiras apresentou maiores valores para a FLSR 10°, seguida por FR 10 e 13° (Figura 1), em virtude acentuação das retas. Estes resultados indicam que, sob a óptica deste indicador de qualidade do corte basal, as facas revestidas com carbeto de tungstênio 13° possuem maior eficácia no momento do corte, em virtude de serem utilizadas somente um quarto do todo das facas, em relação às facas lisas sem revestimentos 10°, que chegaram ao final da sua vida útil mais rapidamente e com menor qualidade de corte basal demostrada.

Figura 1. Índice de danos às soqueiras na colheita mecanizada de cana-de-açúcar por três modelos de facas com (FR 10 e 13°) e sem revestimento (FLSR 10°) em 60 horas trabalhadas.

Figura 1. Índice de danos às soqueiras na colheita mecanizada de cana-de-açúcar por três modelos de facas com (FR 10 e 13°) e sem revestimento (FLSR 10°) em 60 horas trabalhadas.

Porém, há que se considerar que o tratamento com a FLSR 10° foi o que apresentou nas primeiras horas trabalhadas maiores valores de danificação das soqueiras (estando mais próximo da condição de danos fragmentados), no entanto, ainda sendo classificados como danos periféricos. Os tratamentos com as facas revestidas (FR10 e 13°), além de apresentarem menores danos iniciais, em relação à FLSR 10°, os mesmo apresentaram comportamento decrescente na medida em que o tempo de utilização das faces cortantes aumentava situação esta que pode comprovar o auto-afiamento destes modelos de facas, sendo que a FR 13°, em algum momento apresentou soqueiras sem danos.

O índice de abalos às soqueiras foi maior para a FLSR 10°, na qual para cada face cortante no período de sua vida útil de 15 horas há um incremento mais acentuado neste índice, em relação aos demais modelos de facas utilizados (Figura 2). Por outro lado, a FR 10° foi a que apresentou o menor índice de abalos às soqueiras entre 15 e 30 horas de trabalhadas. Entretanto, houve posterior incremento, acima das 30 horas trabalhadas, até o final da vida útil de sua face cortante, podendo este fato ser explicado pela variação na velocidade de trabalho das colhedora e maior contato das faces cortantes com o solo, associando-se a sua angulação o que influencia em um potencial desgaste do fio de corte mais acentuado, havendo, portanto, diminuição na qualidade do corte de base.

Figura 2. Índice de abalo na colheita mecanizada de cana-de-açúcar por três modelos de facas com (FR 10 e 13°) e sem revestimento (FLSR 10°) em 60 horas trabalhadas.

Figura 2. Índice de abalo na colheita mecanizada de cana-de-açúcar por três modelos de facas com (FR 10 e 13°) e sem revestimento (FLSR 10°) em 60 horas trabalhadas.

A FR 13° foi a que apresentou maior regularidade na qualidade do corte basal, com os menores valores do índice de abalos às soqueiras, ao longo das 60 horas de utilização da vida útil de uma de suas faces cortantes, o que, portanto, vem a ser interessante a sua utilização nas colhedoras durante a safra da cultura, refletindo em maior qualidade e potencial redução dos custos com facas de corte ao longo da safra pela maior vida útil de suas faces cortantes.

A menor e maior qualidade do corte basal ocorre para as facas lisas sem revestimentos com ângulo de 10° (FLSR 10°) e para as facas revestidas com 13° (FR 13°), respectivamente, em relação aos índices de danos e abalos às soqueiras de cana-de-açúcar, situação esta que pode influenciar a rebrota do canavial.


Este artigo foi publicado na edição 137 da revista Cultivar Máquinas. Clique aqui para ler a edição.



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