Manejo de míldio em soja

Oferta de fosfitos tem importante papel na ativação dos mecanismos de defesa e no manejo deste patógeno

10.02.2020 | 20:59 (UTC -3)

O míldio tem apresentado incidência crescente nas últimas safras de soja no Brasil, com perdas acentuadas de produção. Entre os fatores que causam predisposição à doença está o desequilíbrio nutricional, que afeta a capacidade das plantas se defenderem. Por isso a oferta de fosfitos tem importante papel na ativação dos mecanismos de defesa e consequentemente no manejo deste patógeno.

A soja é a cultura anual que apresentou maior crescimento nos últimos anos, tanto em produtividade, quanto em hectares semeados, sendo que em Santa Catarina cresceu 5,9% na área semeada e 4,2% na produção. Porém, existem muitos entraves que limitam a exploração do máximo potencial produtivo da cultivar. Dentre os vários limitantes, encontram-se as doenças que causam muitas perdas, como é o caso da ferrugem, que pode chegar a prejuízos de até 100%.

O míldio é uma doença causada pelo fungo Peronospora manshurica (grupo dos Oomicetos) e apesar de ser considerada secundária, vem ocorrendo com maior frequência nas últimas safras, com perdas de produção que podem chegar a 14%. Os sintomas iniciais do míldio são manchas verde-claro, que evoluem para a cor amarela na página superior da folha, e mais tarde para tecido necrosado (Figura 1). No verso da folha as manchas são amareladas e surgem estruturas de frutificação do fungo, de aspecto cotonoso e de coloração levemente rosada a cinza.

Figura 1 - Sintomas de míldio (Peronospora manshurica) nas folhas da cultura da soja
Figura 1 - Sintomas de míldio (Peronospora manshurica) nas folhas da cultura da soja

Os fungicidas que são normalmente usados para o controle de outras doenças de final de ciclo da cultura da soja não possuem efeito no controle de míldio, sendo necessário usar meios alternativos ou novas estratégias para o controle e manejo desta doença.

Dentre as principais causas para ocorrência da doença e predisposição das plantas a patógenos está o desequilíbrio nutricional, que pode ser considerado um dos principais fatores responsáveis pelo desencadeamento dos mecanismos de defesa. Os fosfitos são uma importante estratégia de manejo, pois possuem capacidade de ativar os mecanismos de defesa das plantas e reduzir a severidade das doenças.

A função mais aceita atualmente do fosfito é a de mostrar-se um excelente indutor de mecanismos de defesa das plantas, aumentando a quantidade de fitoalexinas e proteínas relacionadas com patogênese, que evitam a infecção de patógenos como as bactérias e os fungos.

Os fosfitos podem atuar de forma direta, por ter ação fungicida sobre alguns fungos invasores no interior do tecido da planta, causando a morte ou inibição do crescimento do fungo, mostrando-se efetivos no controle de doenças do grupo dos Oomicetos, como o míldio, ou atuar de forma indireta através da ativação dos sistemas de defesa das plantas.

Os fosfitos são os únicos compostos químicos antifúngicos sistêmicos de rápida absorção que, além de mobilizarem-se pelo xilema, também o fazem através do floema.

Pesquisas realizadas por Silva (2011) na cultura do milho concluíram que a aplicação foliar de fosfito reduziu a severidade em ordem decrescente das doenças: mancha de cercospora, mancha branca, helmintosporiose comum e ferrugens. Além disso, o fosfito de potássio proporcionou incremento de produtividade no milho variando entre 6,5% e 7% em relação à testemunha, devido ao controle das doenças foliares.

Já na cultura da soja, o fosfito de potássio reduziu a severidade da ferrugem asiática quando foi feita uma única aplicação, aplicado duas vezes e após a aplicação dos fungicidas (piraclostrobina + epoxiconazole, tiofanato metílico + flutriafol e tebuconazole), mostrando que o fosfito teve efeito sobre severidade da doença, porém, não houve diferença em produtividade (Neves, 2006).

Com o objetivo de verificar o efeito do uso de fosfitos associado ou não ao fungicida sobre o míldio na cultura da soja em Campos Novos, a Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc) conduziu experimento a campo na safra 2012/2013 (Figura 2) onde se buscou avaliar o efeito deste produto no controle da severidade da doença e na produtividade de grãos de soja.

Figura 2 - Experimento implantado na safra 2012/2013 no município de Campos Novos (SC)
Figura 2 - Experimento implantado na safra 2012/2013 no município de Campos Novos (SC)

Os dados diários de precipitação, temperatura e umidade relativa para o local de cultivo foram obtidos através da Epagri/Ciram - Campos Novos, onde até os 40 dias após semeadura as condições climáticas foram favoráveis para o desenvolvimento do míldio, sendo registrados neste período 316,5mm de precipitação pluviométrica. De 40 a 60 dias após semeadura não ocorreram chuvas (Figura 3).

Figura 3 - Chuva diária (mm), temperatura média diária (°C), umidade relativa do ar (%), registrada na safra 2012/2013, correspondente ao período de semeadura até a colheita das plantas de soja, em Campos Novos, SC  Fonte: Epagri/Ciram, 2013.
Figura 3 - Chuva diária (mm), temperatura média diária (°C), umidade relativa do ar (%), registrada na safra 2012/2013, correspondente ao período de semeadura até a colheita das plantas de soja, em Campos Novos, SC Fonte: Epagri/Ciram, 2013.

Mesmo com esta irregularidade de chuvas, observou-se uma variação de severidade da doença entre 4,73% e 14,03% entre o estádio fenológico V7 a R5 (Figura 4). Os primeiros sintomas do míldio da soja foram observados no estádio V7 e a severidade máxima ocorreu no estádio R5 no tratamento com apenas fungicida.

Figura 4 - Severidade do míldio da soja na cultivar BMX Força, em Campos Novos (SC), safra 2012/2013. (T1) Fungicida azoxistrobina + ciproconazol; (T2) fosfito de manganês + fosfito de cálcio com boro + fosfito de cobre; (T3) fungicida azoxistrobina + ciproconazol + fosfito de manganês + fosfito de cálcio com boro + fosfito de cobre (dose recomendada); (T4) fungicida + fosfitos em doses duplicadas em relação ao T3. Todos os tratamentos receberam 0,5% de óleo vegetal.
Figura 4 - Severidade do míldio da soja na cultivar BMX Força, em Campos Novos (SC), safra 2012/2013. (T1) Fungicida azoxistrobina + ciproconazol; (T2) fosfito de manganês + fosfito de cálcio com boro + fosfito de cobre; (T3) fungicida azoxistrobina + ciproconazol + fosfito de manganês + fosfito de cálcio com boro + fosfito de cobre (dose recomendada); (T4) fungicida + fosfitos em doses duplicadas em relação ao T3. Todos os tratamentos receberam 0,5% de óleo vegetal.

Na avaliação realizada no estádio R1 e estádio R5 os tratamentos que incluíram o uso de fosfito (T1, T2 e T3), tanto isolado quanto associado ao fungicida, apresentaram menor severidade de míldio em relação ao tratamento com apenas fungicida (T4) (Figura 4), comprovando a eficiência do produto no controle da severidade do míldio.

Além das avaliações de severidade do míldio da soja, também foi avaliada a produtividade da cultura (Figura 5). Os dados obtidos demonstraram que a aplicação dos fosfitos em conjunto com fungicida proporcionou maior rendimento, justificando o uso desta tecnologia no município de Campos Novos.

O tratamento fungicida + fosfito dose recomendada (T3) aumentou 264,4kg/ha e o tratamento fungicida + fosfitos dose duplicada (T4) teve um aumento de 350kg/ha em relação ao tratamento fungicida (T1), e os dois foram superiores ao tratamento fungicida (T1). O tratamento fosfitos (T2) foi significativamente inferior ao tratamento fungicida em 559,4kg/ha. O uso de fosfitos isolado, embora tenha efeitos sobre a severidade do míldio, foi inferior em produtividade quando comparado ao tratamento só fungicida. Isso provavelmente ocorreu devido à incapacidade dos fosfitos controlarem outras doenças. 

Figura 5 - Produtividade da soja, cultivar BMX Força, em Campos Novos (SC), safra 2012/2013.  (T1) fungicida azoxistrobina + ciproconazol; (T2) fosfito de manganês + fosfito de cálcio com boro + fosfito de cobre; (T3) fungicida azoxistrobina + ciproconazol + fosfito de manganês + fosfito de cálcio com boro + fosfito de cobre (dose recomendada); (T4) fungicida + fosfitos em doses duplicadas em relação ao T3. Todos os tratamentos receberam 0,5% de óleo vegetal Letras iguais não diferem entre si pelo teste Tukey (p > 0,05)
Figura 5 - Produtividade da soja, cultivar BMX Força, em Campos Novos (SC), safra 2012/2013. (T1) fungicida azoxistrobina + ciproconazol; (T2) fosfito de manganês + fosfito de cálcio com boro + fosfito de cobre; (T3) fungicida azoxistrobina + ciproconazol + fosfito de manganês + fosfito de cálcio com boro + fosfito de cobre (dose recomendada); (T4) fungicida + fosfitos em doses duplicadas em relação ao T3. Todos os tratamentos receberam 0,5% de óleo vegetal Letras iguais não diferem entre si pelo teste Tukey (p > 0,05)

A massa de grãos é um importante componente de rendimento para a cultura, sendo que está relacionada à produtividade final da cultura. Assim como na produtividade, os tratamentos com uso de fosfito consorciado ao fungicida (T3 e T4) foram os que alcançaram a maior massa de 100 grãos (Figura 6).

Figura 6 - Massa de 100 grãos de soja, cultivar BMX Força, em Campos Novos (SC), safra 2012/2013.  (T1) fungicida azoxistrobina + ciproconazol; (T2) fosfito de manganês + fosfito de cálcio com boro + fosfito de cobre; (T3) fungicida azoxistrobina + ciproconazol + fosfito de manganês + fosfito de cálcio com boro + fosfito de cobre (dose recomendada); (T4) fungicida + fosfitos em doses duplicadas em relação ao T3.  Letras iguais não diferem entre si pelo teste Tukey (p>0,05)
Figura 6 - Massa de 100 grãos de soja, cultivar BMX Força, em Campos Novos (SC), safra 2012/2013. (T1) fungicida azoxistrobina + ciproconazol; (T2) fosfito de manganês + fosfito de cálcio com boro + fosfito de cobre; (T3) fungicida azoxistrobina + ciproconazol + fosfito de manganês + fosfito de cálcio com boro + fosfito de cobre (dose recomendada); (T4) fungicida + fosfitos em doses duplicadas em relação ao T3. Letras iguais não diferem entre si pelo teste Tukey (p>0,05)

No tratamento Fungicida (T1), que normalmente é usado pelos produtores da região de Campos Novos, Santa Catarina, a produtividade foi de 2.864kg/ha, ficando abaixo da média da região que é de 3.300kg/ha. Isso provavelmente ocorreu devido à falta de chuvas entre o período de 40 dias a 60 dias após a semeadura.

O uso dos fosfitos, de modo isolado e associado ao fungicida, proporcionou controle sobre a severidade do míldio da soja. A aplicação dos fosfitos associados ao fungicida proporcionou maior rendimento de grãos, quando comparado à testemunha só fungicida. Os resultados obtidos recomendam o uso de fosfitos no controle do míldio da soja, tendo em mente que deve fazer parte de um programa de manejo integrado associando-se os fosfitos com fungicida.


Sandra Dalla Pasqua, Erivelton Zanon – Acadêmicos do curso de Agronomia da Unoesc; Tamara Pereira Felicio – Professora do curso de Agronomia da Unoesc


Artigo publicado na edição 193 da Cultivar Grandes Culturas. 


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