Manejo integrado contra brusone em arroz

Prevenção e a adoção de medidas integradas são indispensáveis para minimizar os danos da doença

03.09.2020 | 20:59 (UTC -3)

Doença mais importante da cultura do arroz a brusone pode levar, em casos severos e sem o manejo adequado, a perdas de produtividade da ordem de 100%. A prevenção e a adoção de medidas integradas são indispensáveis para minimizar os danos. Em lavouras com histórico do patógeno, semeadas tardiamente e/ou com cultivares suscetíveis podem ser necessárias de uma a duas aplicações de fungicidas.

A brusone do arroz é causada pelo fungo Magnaporthe oryzae (forma perfeita) ou Pyricularia oryzae (forma imperfeita). É a doença mais importante na cultura do arroz no mundo, tendo sua ocorrência confirmada em mais de 85 países. Em condições ambientais favoráveis, pode apresentar altos índices de severidade e rápida disseminação. Em casos severos e sem manejo adequado, as perdas de produtividade podem alcançar 100%. O fungo P. oryzae pode desenvolver-se sob diversas condições, sendo beneficiado por dias nublados, umidade relativa do ar superior a 93%, temperaturas na faixa de 15ºC a 35 ºC, com ótimo de 25ºC a 28 ºC e, principalmente pelo molhamento foliar.

Os sintomas da doença podem ser observados, principalmente, a partir do início do perfilhamento e, quando a cultura estiver no estádio reprodutivo, nas suas panículas em florescimento. Quando a brusone infecta as folhas, é possível visualizar pequenas pontuações elípticas com centro cinza e bordos marrom. Estas lesões crescem no sentido das nervuras e seu tamanho varia de acordo com o grau de resistência da cultivar e estágio fenológico. No centro da mancha de P. oryzae ocorre a necrose do tecido e, sob condições de alta umidade ocorre intensa esporulação. Nessas condições, a propagação da doença é facilitada, permitindo que se espalhe rapidamente para plantas de arroz adjacentes, através do vento, respingos de chuva e orvalho. É importante ressaltar que P. oryzae apresenta estruturas de sobrevivência como micélio e conídios, que em restos culturais, sementes de arroz e plantas infestantes permitem sua propagação e reinfestações futuras.

Quando os sintomas são identificados no colmo ou mais especificamente, na inserção da panícula, a doença recebe o nome de brusone do pescoço. As injúrias causadas pelo patógeno podem acarretar a quebra na base da panícula, caracterizando o sintoma conhecido como “pescoço quebrado”. Neste caso, há interrupção da passagem de fotoassimilados, impedindo o processo de enchimento de grãos, o que consequentemente reduz o peso e ocasiona chochamento parcial ou total dos grãos nas panículas, causando reduções severas na produtividade.

No Rio Grande do Sul a incidência e a severidade da brusone variam de acordo com o ano e a região, sendo a depressão central e o litoral norte os locais com maior incidência. Caracterizam-se por elevada precipitação, alta umidade relativa do ar e, deste modo, maior período de molhamento foliar, beneficiando o desenvolvimento da doença. O estágio de desenvolvimento fenológico da cultura também é um fator a ser considerado. Plantas em R2 a R4 (emborrachamento e floração) são mais suscetíveis a P. oryzae, sendo recomendado intenso monitoramento da lavoura neste período.

Estratégias de manejo para a brusone devem começar antes mesmo do plantio, com a escolha de cultivares com resistência a doença e/ou mais adequadas a região e ao sistema de cultivo. No Rio Grande do Sul é recomendada a semeadura de arroz de setembro até meados de dezembro. Porém, devido a imprevistos, como as chuvas ocorridas durante o início da janela de semeadura, alguns produtores têm realizado a semeadura tardiamente. Esses atrasos podem beneficiar o desenvolvimento da doença, que se intensifica quando o plantio é realizado a partir do final de novembro, devido às condições climáticas mais favoráveis ao patógeno. Isso ocorre porque essas plantas irão atingir o estádio reprodutivo sob condições de menor insolação, menores temperaturas e maior tempo de molhamento foliar, potencializando a presença do patógeno.

A avaliação do histórico da área também é um fator relevante para a escolha da cultivar, em locais de ocorrência frequente da doença. Deve-se, sempre que possível, optar por genótipos resistentes. O preparo antecipado das áreas também é uma alternativa que minimiza as chances de desenvolvimento de P. oryzae, pois viabiliza o plantio na época desejada. Esta prática é importantíssima em anos de elevada precipitação, pois permite que a área esteja pronta para semeadura independentemente das condições climáticas.

A utilização de sementes sadias, certificadas e, de preferência tratadas, devem ser levados em consideração no momento do planejamento da lavoura. Sementes contaminadas servem como fonte de inóculo inicial, pois quando plântulas jovens são infectadas, toda a planta morre, dispersando esporos (conidiósporos) para plantas adjacentes. Uma fertilização equilibrada, evitando-se quantidades excessivas de nitrogênio, aliada a manutenção da lâmina d’água e rotação de culturas, também são práticas importantes para mitigar os danos causados pela doença em lavouras de arroz irrigado.  

O insucesso na utilização das estratégias descritas anteriormente no controle da brusone pode resultar em áreas com elevada incidência, demandando a utilização de produtos químicos. Em lavouras com histórico da doença, semeadas tardiamente e/ou com cultivares suscetíveis e sob condições favoráveis, recomenda-se de uma a duas aplicações de fungicidas. Atualmente existem no mercado diversos produtos comerciais para o controle da doença, com destaque para o Triciclazol pertencente ao grupo químico dos benzotiazóis, que é um produto sistêmico e específico para a P. oryzae. Quando a brusone infecta as folhas, recomenda-se a primeira aplicação na fase de completo perfilhamento e uma segunda aplicação, quando ocorrer uma maior incidência do fungo ou 20 dias após a primeira. Já para a brusone do pescoço, a primeira aplicação deve ser realizada no final do emborrachamento (até 5% de emissão das panículas) e a segunda, aproximadamente 15 dias após, ou com 75% das panículas expostas.

O controle da brusone, em lavouras irrigadas ou de sequeiro, não se apresenta como uma tarefa fácil para o produtor. Contudo, a melhor estratégia recomendada é o manejo integrado de doenças, que corresponde a utilização conjunta do manejo cultural, eliminação de restos culturais, utilização de cultivares resistentes e controle químico, quando necessário. Nesse sentido, a redução da ocorrência da brusone e da necessidade de intensa utilização de fungicidas permitem o pleno desenvolvimento da cultura, bem como da manutenção do potencial produtivo do arroz e elevados rendimentos da lavoura.

Lesão característica provocada pela brusone em plantas de arroz.
Lesão característica provocada pela brusone em plantas de arroz.

O Arroz 

O arroz (Oryza sativa L.) é o segundo cereal mais cultivado no mundo sendo ultrapassado apenas pelo milho. Previsões realizadas pelo Ministério da Agricultura dos EUA (USDA) para a safra 2016/2017, sugerem incremento da produção mundial em 2,37%, atingindo cerca de 483 milhões de toneladas (Mt) de arroz. Enquanto isso, a produção brasileira, deve passar dos 10,6 Mt da última safra para cerca de 12 Mt. Este aumento é reflexo das condições climáticas dessa safra, que possibilitaram a semeadura dentro da época preferencial em um número maior de lavouras.

 Outros fatores como a elevação do investimento em tecnologia e a utilização de cultivares de alto potencial de rendimento refletem no aumento da produtividade média nacional, que poderá passar de 5,3t/ha na safra 2015/2016, para 5,7 t/ha em 2016/2017, representando incremento de 9,4%. Já a produtividade média obtida no Rio Grande do Sul, que planta mais de um milhão de hectares com essa cultura, foi de 6,9 t/ha em 2015/2016. Esse estado representa 68% da produção nacional e somado a Santa Catarina são responsáveis por cerca de 80% da produção nacional de arroz.

A exploração comercial do arroz no Brasil ocorre principalmente, em dois sistemas de cultivos: o arroz irrigado ou de terras baixas, utilizado principalmente na região Sul e, o arroz de sequeiro ou de terras altas, usado no restante do país. As lavouras orizicolas sulinas apresentam condições peculiares de exploração, devido às classes de solo predominante serem Planossolos e Gleissolos, que possuem drenagem deficiente, favorecendo o seu cultivo sob condições de inundação. O arroz irrigado apresenta potencial produtivo superior em comparação ao de sequeiro. Além do fornecimento de água, frente à alta demanda da cultura, a presença de lâmina de água nas áreas de cultivo é uma importante ferramenta no manejo de plantas daninhas, em especial do arroz vermelho.

O impacto na produtividade do arroz causado pela competição com plantas daninhas atingiu um elevado patamar, culminando no desenvolvimento de cultivares com tecnologia Clearfield (CL ou RI), que permitem a utilização de herbicidas do grupo das imidazolinonas, proporcionando o controle das plantas daninhas sem causar danos à cultura. Entretanto, o desenvolvimento dessa tecnologia, em alguns casos, não foi associado à genética de resistência à brusone que é a principal moléstia fungica no arroz irrigado. Entre as principais cultivares de alto rendimento semeadas no Rio Grande do Sul destacam-se, Guri INTA CL, Puitá INTA CL, IRGA  424 e IRGA  424 RI. Porém, apenas as duas desenvolvidas pelo Instituto Riograndense do Arroz (IRGA), apresentam níveis consideráveis de resistência à brusone.


Luiza Elena Ferrari, Gerarda Beatriz Pinto da Silva, Tiago Edu Kaspary, UFRGS 


Artigo publicado na edição 214 da Cultivar Grandes Culturas.

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