Manejo integrado para controle da planta daninha Caruru palmer

Resistente a vários herbicidas, provoca perdas de produtividade de até 91% no milho, 65% no algodão e 79% na soja

07.05.2020 | 20:59 (UTC -3)

Principal planta daninha da cultura do algodoeiro nos EUA, caruru palmer foi identificado em áreas de cultivo no Brasil  em 2015. De efeito devastador quando não controlada, esta planta daninha, resistente a vários herbicidas, tem poder de fogo para provocar perdas de produtividade de até 91% na cultura do milho, 65% no algodão e 79% na soja.

Identificada pela primeira vez no Brasil, no ano de 2015, em áreas de plantio de algodão no estado do Mato Grosso, a planta daninha caruru palmer (Amaranthus pameri) é tema de importantes debates acerca de seu potencial impacto negativo sobre as culturas não só desta região, com de todo pais. Trata-se de uma planta resistente ao herbicida glifosato, bem como aos herbicidas inibidores da enzima ALS, especulando-se bastante se poderia ser resistente também a outros herbicidas e assim, quais alternativas de controle eficientes restariam para o controle.

As espécies de caruru com ocorrência no Brasil são de ciclo de vida anual, reproduzidas exclusivamente por sementes e, de modo geral, de difícil diferenciação visual entre as espécies. Uma planta de grande porte pode produzir até 1.000.000 de sementes. A. palmeri é uma espécie de planta daninha oportunista e competitiva por excelência, com alta fecundidade, germinação e crescimento rápido, capacidade fenotípica e plasticidade fenológica que permitem a produção de sementes em condições diferentes. Estudos realizados nos Estados Unidos mostram que A. palmeri pode produzir entre de 600 mil  e 2 milhões de sementes por planta e levar de 3 dias a 8 dias para germinar. 

Caruru palmer é uma espécie dióica, o que significa que, em uma população, parte das plantas terão somente flores femininas (plantas “fêmea”) e outra parte, somente flores masculinas (plantas “macho”). Essa é uma característica que facilita a identificação de A. palmeri, uma vez que todas as outras espécies de caruru já identificadas no Brasil têm flores masculinas e femininas na mesma planta, sendo classificadas como monóicas. As sementes são produzidas somente nas plantas com flores femininas, mas há um detalhe importante e agravante da reprodução da espécie: flores femininas podem produzir sementes mesmo sem a ocorrência de polinização.

Figura 1: Detalhe das flores femininas e masculinas de Caruru palmer, com destaque para as anteras expostas e bem visíveis.
Figura 1: Detalhe das flores femininas e masculinas de Caruru palmer, com destaque para as anteras expostas e bem visíveis.

O Caruru palmer é originário de regiões áridas do centro sul dos Estados Unidos da América do Norte (EUA) e norte do México, e está presente em vários países do mundo.  Nos últimos anos, esta espécie se tornou a principal planta daninha do algodoeiro nos EUA, em função de suas características biológicas e da resistência a herbicidas de diferentes sítios de ação. Nos EUA, além do glifosato há relatos de populações de A. palmeri resistentes a outros mecanismos de ação, tais como: 
• Inibidores da síntese de tubulinas (K1)

Foi o primeiro relato de resistência a herbicidas de A. palmeri nos Estados Unidos. A resistência ao herbicida trifluralina foi confirmada em 1989 em oito populações de diferentes locais da Carolina do Norte e em 1998 no estado do Tennessee. 

• Fotossistema II (C)

Os primeiros relatos vieram do estado americano do Texas em 1993 referentes ao herbicida atrazina. Posteriormente a resistência a atrazina foi relatada novamente no Texas e também no Kansas em 1995 e na Geórgia em 2008. 

• ALS (A)

Nos Estados unidos os inibidores de ALS têm sido amplamente utilizados no controle de A. palmeri desde a sua introdução em 1982. A maioria dos casos de resistência a herbicidas inibidores da ALS são causadas por alterações na sequência de bases do gene de ALS, resultando em uma enzima que é menos sensível à ligação de inibidores da ALS. Esta sequência alterada é normalmente herdada como um alelo único com um alto grau de predominância. A resistencia de Caruru palmer aos herbicidas inibidores da ALS esta difundida em todo o sul os EUA. Foram relatados casos em Arkansas em 1994, Carolina do Norte em 1995, Carolina do Sul em 1997, Geórgia em 2000 e Flórida e Mississippi em 2008. A resistência cruzada a vários herbicidas inibidores da ALS é comum em Caruru palmer.

• HPPD (F2)

A resistência a vários herbicidas que inibem a HPPD foi recentemente confirmada no estado americano do Kansas, no ano de 2012, mas o mecanismo e modo de herança da resistência ainda não é conhecido.
O manejo das populações de Caruru palmer resistentes a herbicidas se torna ainda mais complexo, sobretudo para as populações com resistência múltipla, já relatada para dois ou três desses mecanismos de ação: ALS/glifosato; ALS/gllifosato/FSII e ALS/FSII/HPPD. Além das fronteiras dos EUA, já foram relatados biótipos de Caruru palmer com resistência a inibidores da ALS em Israel e na Argentina.

O impacto da falta de controle de Caruru palmer, seja por falta de manejo ou pelo fato das plantas serem resistentes a algum tipo de herbicida, em qualquer tipo de cultura, pode ser devastador. Essas perdas de produtividade podem chegar a 91% na cultura do milho, 65% no algodão, 68% no sorgo, 79% na soja, 68% no amendoim e 94% na batata-doce. 

O manejo integrado para o controle de Caruru palmer é essencial visto que se trata de uma planta extremamente agressiva, podendo chegar a crescer de 5 a 7 cm por dia, além da já citada capacidade de produzir grandes quantidades de sementes que germinam rapidamente. Algumas alternativas de controle vêm sendo utilizadas no manejo de Caruru palmer resistente a glifosato com sucesso. É possível destacar aplicação de alguns herbicidas pós-emergentes como amônio glufosinato em culturas Liberty-Link, como algodão e soja, o 2,4-D e o dicamba em culturas resistentes ou tolerantes, como soja e milho, a atrazina isolada ou em associação com herbicidas inibidores de HPPD na cultura do milho, os herbicidas inibidores da protox como fomesafem ou lactofem na cultura da soja. Em relação a herbicidas pré-emergentes vem sendo utilizados com sucesso os herbicidas s-metolachlor, sulfentrazone, flumioxazina e metribuzim. É preciso levar em consideração que para o sucesso da utilização o estádio de desenvolvimento da planta daninha deve ser o menor possível para os herbicidas pós-emergentes. Da mesma forma deve-se observar as características do solo, como matéria orgânica, teor de argila, umidade do solo e época do ano no caso dos pré-emergentes.

Figura 2: Detalhe do crescimento acelerado de Caruru palmer que pode chegar a 7 cm por dia.
Figura 2: Detalhe do crescimento acelerado de Caruru palmer que pode chegar a 7 cm por dia.

Vários fatores podem contribuir para que Caruru palmer se torne uma das principais plantas daninhas dos sistemas de cultivo do brasileiro. Alguns destes fatores estão associados com as práticas de manejo de plantas daninhas. Por exemplo, o plantio direto que preza pelo não revolvimento do solo favorece Caruru palmer com suas sementes pequenas que germinam facilmente na superfície da palhada. Outro fator que pode favorecer o aumento da infestação é a grande dependência por herbicidas no sistema de produção atual a base de glifosato e de inibidores da ALS, o que gera um ambiente favorável para esta planta daninha, que tem um grande potencial para a evolução rápida da resistência. 

Mais estudos sobre estratégias a longo prazo se fazem necessários, principalmente com o objetivo de evitar que Caruru palmer se torne resistente a outros herbicidas além do glifosato e dos inibidores da ALS. A introdução de culturas resistentes a outros mecanismos de ação irá fornecer aos produtores mais flexíbilidade no controle químico, bem como a maior adoção do uso de pré-mergentes especialmente na cultura da soja. Contudo, dada a grande capacidade de adaptação desta planta daninha, a evolução de resistência multipla a herbicidas é altamente provável. O desenvolvimento de práticas de gestão que integram o uso sustentavel de herbicidas, além de implementação adequada de metodos não quimicos para sistemas de cultivos afetados por Caruru palmer devem, portanto, ser uma prioridade. Essencialmente a rotação de mecanismos de ação herbicidas é fundamental, entendendo-se que se deva explorar melhor a dessecação pré-plantio, bem como o uso de pré e pós-emergentes alternativos ao glifosato.


Pedro Jacob Christoffoleti, Acácio Gonçalves Netto, Esalq/Usp; Marcelo Nicolai, Ronald E. H. Weber, Unesp, Botucatu Agrocon


Artigo publicado na edição 203 da Cultivar Grandes Culturas.

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