Mato na lavoura

A escassez de informações técnicas dificulta o controle das plantas daninhas na cultura da melancia, que além da competição por espaço e recursos naturais também servem como hospedeiras de pragas e d

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

A melancia (

- Schard), pertencente à família cucurbitácea e originária da África tropical, ocupa lugar de destaque entre as principais hortaliças fruto produzidas e consumidas no Brasil, chegando a situar-se entre as cinco primeiras em termos de volume e valor econômico na comercialização nacional (Nagai, 1987; Castellane & Cortez, 1995). Planta de ampla utilidade medicinal, a melancieira apresenta ciclo cultural curto, variando entre 80 a 110 dias, sendo constituída por crescimento rasteiro, na forma de ramificações que podem alcançar até três metros de comprimento. Sua adaptação climática é mais favorável a regiões de clima quente e seco, desde que apresentem condições de disponibilidade hídrica entre 400 a 600 mm (Carvalho, 1999).

Com relação à presença de plantas daninhas (mato) na cultura da melancia, assim como em outra cultura qualquer, já é conhecido que a sua emergência espontânea em ecossistemas agrícolas pode condicionar uma série de fatores atuantes sobre as plantas cultivadas que irão interferir não só na produção e crescimento biológico, mas também na operacionalização do sistema de produção empregado.

Esses efeitos negativos que afetam a cultura devido à sua convivência com plantas daninhas, (a matointerferência) não podem ser atribuídos exclusivamente à competição entre as espécies por recursos disponíveis no meio como água, luz, CO2, nutrientes minerais e espaço físico, e sim, pela somatória de pressões ambientais de forma direta (competição por recursos disponíveis, alelopatia, interferência na colheita etc) ou indireta (hospedeira de pragas, doenças, nematóides e outros) relacionadas à sua presença no ambiente agrícola. Contudo, a condição considerada como matointerferência refere-se à somatória de todos os seus componentes, incluindo a alelopatia e outros efeitos da competição pelos fatores de crescimento (Velini, 1997).

No Brasil, apesar da falta de resultados de pesquisa sobre a interferência de plantas daninhas em muitas hortaliças, sabe-se que, em geral, ela é prevalecente e, portanto, danosa entre os 20% e 50% do ciclo de vida da cultura (Pereira, 1987).

O conhecimento do período crítico de competição das plantas daninhas é importantíssimo para o manejo de qualquer cultura, uma vez que permite, através do estabelecimento de um conjunto de informações regionais, definir as épocas mais adequadas de eliminação da infestação e que, conseqüentemente, não causará prejuízos na produtividade da cultura.

Para a cultura da melancia, poucos são os resultados de pesquisa ou citações evidenciando os prejuízos causados pela interferência das plantas daninhas, assim como estabelecendo o período crítico de prevenção à interferência (PCPI) para as diferentes regiões produtoras. Entretanto, grande parte da bibliografia nacional menciona a necessidade de controlar-se a infestação (mato) desde o início do desenvolvimento até o fechamento das ramificações da cultura em crescimento (Blanco et al., 1997; Carvalho, 1999; Filgueira, 2000).

Medeiros et al. (2000) e Maciel et al. (2002) constataram redução de produtividade da melancieira submetida à convivência e competição durante todo o ciclo da cultura da ordem de 95,00% e 35,85%, respectivamente, para alta infestação mista de plantas daninhas e infestação constituída apenas por plantas de capim-colchão (Digitaria horizontalis).

Segundo Durigan (1992), de forma semelhante à outras culturas, algumas espécies de plantas daninhas estão naturalmente associadas às plantas oleráceas, em função das alterações microclimáticas proporcionadas pelo manejo peculiar desenvolvido. Entre algumas destas alterações, enquadram-se a grande adição de matéria orgânica e adubos químicos, irrigação em maior parte do ano e revolvimento acentuado do solo, características estas intensamente relacionadas à cultura da melancia.

Por outro lado, algumas espécies são comuns a várias culturas e freqüentemente também ocorrem na melancieira, o que lhe causa sérios prejuízos. Além disso, a germinação das sementes de plantas daninhas é normalmente desuniforme ao longo do ciclo da cultura, por apresentar mecanismos de dormência eficientes, garantindo a sobrevivência e persistência na área mesmo em condições adversas. Em cada época do ano, ocorre a predominância de diferentes espécies de plantas daninhas. No inverno, por exemplo há maior tendência de predominarem espécies de folhas largas (dicotiledôneas) e, no verão, de folhas estreitas (monocotiledôneas).

Nas mais diferentes regiões do Brasil, os métodos de manejo mecanizado através de gradagens e/ou de capina manual da infestação são as formas mais prevalecentes na cultura da melancia. A escolha do espaçamento entre plantas também tem relação direta com o controle das plantas daninhas, e deve ser adotada de acordo com o comprimento das ramas da cultivar. Normalmente, híbridos modernos, por apresentarem ramas menores, adaptam-se adequadamente a espaçamentos mais adensados e com adoção de maior nível tecnológico, quando comparados às cultivares tradicionais. Assim, em virtude do nível tecnológico adotado, os espaçamentos utilizados para melancieira nas diferentes regiões do país são normalmente amplos, podendo variar de 2,5-3,0 m x 1,5-2,0 m, o que, conseqüentemente, proporciona fácil execução dos procedimentos de gradagem e/ou capinas superficiais nas linhas e entrelinhas antes do fechamento e sombreamento da cultura.

Na prática, a recomendação tradicionalmente desenvolvida pelos produtores para o controle mecânico e/ou manual de plantas daninhas na melancieira é a utilização de duas a três capinas antes do fechamento pleno das ramas da cultura. O número de capinas está diretamente relacionado à velocidade de desenvolvimento da cultura, a qual determinará a quantidade de operações necessárias ao longo do tempo, através das condições fenológicas prevalecentes.

Uma apurada revisão na literatura também revela a escassez de informações técnicas que propiciem a utilização adequada de insumos na cultura. No que diz respeito ao uso de herbicidas, atualmente, nenhum produto está oficialmente registrado para a cultura no Brasil (Andrei, 1993; Rodrigues & Almeida, 1998; Agrofit, 2002). As informações encontradas e utilizadas pelos produtores referem-se a outras espécies da família curcubitacea. Sonnenberg (1985) relata o uso dos herbicidas DCPA e trifluralin nas culturas da abóbora e do pepino, respectivamente. Rodrigues & Almeida (1988), Lorenzi (1994) e Durigan (1992) recomendam o uso do DCPA na cultura do melão. Cantamutto et al. (1996) relatam o aumento de produtividade pelo uso de pendimethalin e pendimethalin + linuron na cultura do melão transplantado. Os herbicidas DCPA e napropamide são registrados em outros países para controle de plantas daninhas na cultura da melancia, sendo esta uma das poucas referências encontradas no Brasil (Rodrigues & Almeida, 1995). Mais recentemente, Vidal et al. (2000) relataram alta tolerância das espécies abobrinha cv. Menina Brasileira, melancia cv. Charleston Gray e moranga cv. Abóbora Moranga, aos efeitos fitotóxicos do herbicida graminicida fluazifop-p-butil aplicado na modalidade de pós-emergência. De forma semelhante, Medeiros et al. (2000) e Maciel et al. (2002) relataram elevada seletividade da cultura da melancia para os graminicidas fenoxaprop-p-ethil, clethodim e sethoxydim, aplicados em pós-emergência em trabalhos conduzidos a campo. Estes herbicidas são importantes para melancieira, haja visto que a realidade da cultura no Brasil é a implantação da lavoura em áreas de renovação de pastagens, na modalidade de arrendamento e, portanto, havendo elevadas infestações de gramíneas na forma de rebrote e/ou germinação do banco de sementes remanescentes.

Ainda assim, apesar da ausência de recomendações e/ou registro para a cultura, alguns produtores lançam mão, por experiência prática, do uso de herbicidas mais antigos e de elevada seletividade para várias culturas, como o trifluralin, evitando assim a interferência de algumas espécies de plantas daninhas na produtividade e qualidade dos frutos.

A falta de informações regionais de matointerferência e o desinteresse da indústria agroquímica brasileira pelo registro de produtos, dificultam maior viabilidade do manejo de plantas daninhas, principalmente considerando-se que a melancieira também pode ser cultivada em grandes áreas, onde o processo de capina pode ser oneroso e deficiente. Entretanto, medidas paliativas poderiam ser adotadas para melhorar a viabilidade da cultura da melancia no Brasil. Por exemplo, a liberação regional de alguns herbicidas via Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, submetida à fiscalização dos órgãos responsáveis, e o incentivo às universidades publicas e privadas ao desenvolvimento de pesquisas referentes à implantação de novos sistemas produtivos, como o caso do plantio direto e estudos de matointerferência, através de parcerias com prefeituras e/ou órgãos vinculados ao setor privado.

Estas medidas certamente poderiam ajudar a reverter o cenário agrícola para culturas oleráceas ou para hortaliças-fruto de destaque, como é o caso da melancieira.

ESAPP/ Paraguaçu Paulista-SP

UEM/ Maringá-PR

UNESP/ Botucatu-SP

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