Melhor desde a raiz

Hidroponia permite produzir batata-semente com qualidade e menor custo. A não utilização do solo elimina a necessidade de aplicação de agentes fumigantes, como o brometo de metila.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

O Rio Grande do Sul, embora seja o estado com a maior área cultivada com batata, acima de 50.000 ha, é detentor de umas das menores produtividades a nível nacional, cerca de 8 a 9 toneladas por hectare. Dentre as diversas causas que contribuem para essa reduzida produtividade, destaca-se a utilização de sementes de baixa qualidade fitossanitária. Sobre os problemas fitossanitários enfrentados, merecem particular atenção, as viroses, e doenças bacterianas transmitidas via semente, especialmente a murcha bacteriana, ou murchadeira. O comprometimento da produtividade pela qualidade da semente, atinge tal nível, que com a simples utilização de material propagativo de alta qualidade, estima-se que se poderia dobrar o rendimento obtido nas lavouras gaúchas.

Sementes sem doenças

A produção de material de alta qualidade fitossanitária, ou seja, livre de doenças que possam ser transmitidas via semente, inicia-se em condições de laboratório. É no laboratório de cultura de tecidos, que pequenas partes destacadas da planta, os chamados meristemas, selecionados por serem potencialmente livres de qualquer doença, dão origem a uma nova plântula produzida "in vitro", capaz de, em uma etapa posterior, multiplicar-se e produzir tubérculos.

Essa plântula, após um crescimento inicial em meio de cultura, em condições controladas, entra em uma nova fase da multiplicação, a fase "ex vitro", quando vai produzir os tubérculos, que se constituirão nas primeiras sementes pré-básicas.

A fase "ex-vitro" de multiplicação ocorre geralmente no solo. Para se evitar que aquele material livre de doenças venha a ser contaminado por viroses ou patógenos de solo, essa multiplicação é feita sob telado, sendo o solo antes do plantio, esterilizado com produtos químicos, normalmente o brometo de metila. O solo utilizado para multiplicação, é geralmente descartado e substituído após um ano de uso, em um processo trabalhoso e de alto custo, além de danoso ao meio ambiente.

Problemas do brometo de metila

A esterilização do solo com brometo de metila, nesse sistema de produção de sementes, enfrenta alguns problemas. Em primeiro lugar, pelo risco que o produto representa para a saúde humana, o que determina que o seu manuseio seja feito com cuidados especiais. Um segundo aspecto de extrema importância, são os prejuízos causados por esse agroquímico ao meio ambiente; embora aplicado ao solo, até oitenta por cento do produto pode ser liberado na atmosfera.

O brometo de metila constitui-se em uma das chamadas SDO, "substâncias destruidoras da camada de ozônio", ou seja, é um dos responsáveis pela rarefação desse importante filtro estratosférico, razão pela qual deverá ser nos próximos anos, retirado do mercado mundial. O governo brasileiro em um cronograma inicial que restringe seu uso determinou a eliminação de sua utilização como fumigante de solo a partir de janeiro de 2006, o que produz uma certa urgência na busca de alternativas eficientes para sua substituição. Por fim, a fumigação do solo com brometo de metila é um processo extremamente drástico, eliminando de forma não seletiva, microrganismos patogênicos e também aqueles benéficos, particularmente aqueles associados à absorção de nutrientes, com conseqüente prejuízo para o desenvolvimento das plantas.

Vantagens da hidroponia

A produção de batata-semente em hidroponia é o que se pode chamar de um sistema ecologicamente correto. A não utilização do solo elimina a necessidade de aplicação de agentes fumigantes, como o brometo de metila. Dessa forma, o meio ambiente, particularmente, a camada de ozônio, não é agredida no processo.

No sistema hidropônico, todos os nutrientes que a planta normalmente retiraria do solo, são fornecidos através da solução nutritiva que irriga suas raízes. Elimina-se, dessa forma, qualquer risco de contaminação por patógenos de solo. Desaparecem, por exemplo, as preocupações com a murcha bacteriana, doença que traz graves problemas para as áreas contaminadas. Saliente-se, entretanto, que o sistema não prescinde da utilização de telados protetores contra insetos, prevenindo-se dessa forma a infecção das plantas por viroses, transmitidas por esses vetores.

Maior produtividade é outra vantagem. No sistema tradicional de multiplicação de sementes pré-básicas, normalmente produz-se de três a cinco tubérculos por planta, taxa de multiplicação muito baixa, que estrangula o processo, elevando seus custos. No sistema hidropônico as taxas de multiplicação são bastante superiores, podendo-se atingir médias superiores a vinte tubérculos por planta. Essa maior velocidade de multiplicação, faz com que volumes maiores de sementes de boa qualidade cheguem ao produtor, com conseqüências diretas no aumento de produtividade da lavoura.

Descrição do sistema

Embora outros sistemas hidropônicos encontrem-se em fase de testes na Embrapa, o sistema atualmente validado e preconizado é aquele montado sobre telha de fibrocimento. Os elementos constituintes do sistema são: telha de cimento amianto, com canais de 6 cm de altura e espaçados de 18 cm, recoberta por um filme de polietileno, que constitui-se na plataforma do sistema; granito fragmentado (brita) de tamanho médio, colocado nos canais da telha e utilizado como meio físico de sustentação das plantas; reservatório para a solução nutritiva, moto-bomba com corpo em PVC (ou outro material resistente a oxidação), temporizador (regulador de tempo) e tubulação de PVC rígido. A solução nutritiva, composta de macro e micro nutrientes necessários para crescimento e desenvolvimento das plantas, é fornecida em intervalos pré-determinados, regulados através do temporizador, num sistema de circulação fechado. O pH e a condutividade elétrica da solução devem ser ajustados de acordo com a necessidade. Recomenda-se a cobertura da brita com plástico preto, para se evitar que a penetração da luz interfira na tuberização.

É importante salientar-se que o sistema hidropônico é viável economicamente apenas para a produção de sementes pré-básicas, as quais possuem valor de mercado diferenciado (R$ 0,20 a 0,30 por tubérculo), em função da tecnologia utilizada na sua produção. Dada a sua simplicidade, é um sistema acessível a um segmento significativo de produtores. Mesmo pequenos produtores, associados em grupos, podem se utilizar de suas vantagens.

O objetivo principal, que se espera atingir com a difusão desta nova tecnologia, é a redução do custo de produção da semente, e desta forma eliminar o ponto de estrangulamento da produtividade da cultura da batata no sul do Brasil, ou seja, a utilização de sementes de baixa qualidade.

Carlos Alberto B. Medeiros

Embrapa Clima Temperado

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