Olho na resistência

Ivan Cruz mostra quais são as formas adequadas para se fazer o manejo da resistência de Spodoptera frugiperda a inseticidas.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

é a principal praga da cultura de milho no Brasil, causando severos prejuízos para a economia do país. Em função do seu controle ser dependente quase que exclusivamente de inseticidas químicos, o inseto tem desenvolvido, ao longo do tempo, resistência às principais classes de inseticidas. Segundo Yu (1991, 1992), o grau de resistência encontrado para piretróides pode variar de 2 a 200 vezes, quando se compara uma raça suscetível com uma resistente. Para os organofosforados essa variação foi de 11 a 517 vezes, sendo o maior grau de resistência observado para o metil paration. Para os carbamatos, entre 10 a 507 vezes, sendo o maior valor encontrado para o carbaril. Leibee & Capinera (1995) encontraram na Florida, EUA, populações de S. frugiperda resistentes ao malathion, carbaril, metil paration, diazinon, triclorfon, fluvalinate, fifentrin e tralometrin.

Yu & Nguyen (1994), baseados em estudos bioquímicos, concluíram que o amplo espectro da resistência observado em raças de campo foi causado por mecanismos múltiplos, incluindo aumento da taxa de desintoxicação desses inseticidas por enzimas diversas e por insensibilidade da acetilcolinesterase. No Brasil, o problema da resistência da S. frugiperda a inseticidas, embora com poucos dados oficialmente documentados, pode ser visto em várias regiões produtoras de milho, onde o número de aplicações de inseticidas pode chegar a dez durante uma única safra (Cruz et al. 1999b). Estudos de laboratório mostraram que a herança da resistência dessa espécie à lambdacialotrina é autossomal e incompletamente recessiva, sendo determinada por um gene principal, sob a influência de alguns genes secundários (Diez-Rodriguez, 2000).

Segundo Hoy (1995), táticas de manejo têm sido amplamente discutidas, mas tais táticas não têm dado resultados práticos no manejo da resistência, embora muito se tenha aprendido nos últimos 40 anos em relação aos mecanismos, herança e base molecular da resistência (Georghiou & Saito, 1983; Corbett et al., 1984; Scott, 1990, 1995; Soderlund & Bloomquist, 1990). Ainda tem sido muito difícil manejar a resistência, uma vez que já ocorra naturalmente na população da praga entre 5 e 10% de indivíduos resistentes (Hoy, 1995).

Segundo o autor, pode-se assumir que o desenvolvimento de resistência é quase um problema inevitável e não se deve pensar “se a resistência” irá aparecer. Na verdade o pensamento correto é “quando” ela aparecerá. Considerando essa situação, geralmente o melhor que se pode fazer é retardar, em alguns anos, o desenvolvimento de altos níveis de resistência, através do uso menos freqüente de produtos químicos (Hoy, 1992).

De qualquer maneira, uma estratégia mais eficiente para o manejo da resistência deverá combinar uma variedade de táticas de manejo de pragas juntamente com a redução no número e doses dos inseticidas aplicados. Em função dessa premissa, as táticas de manejo de resistência propostas por Hoy (1995) parecem apropriadas para diferentes pragas, incluindo S. frugiperda, tanto na cultura de milho, quanto em outros hospedeiros, quais sejam:

1. Utilização de controle cultural.

2. Utilização de controle biológico.

3. Utilização de genótipos resistentes.

4. Utilização de controle bio-racional.

5. Utilização de inseticidas químicos compatíveis com agentes de controle biológico.

6. Utilização de monitoramento da praga para reduzir aplicações e doses desnecessárias de produtos químicos.

7. Ação conjunta entre empresas de insumos, produtores, extensionistas e pesquisadores.

8. Informações adicionais nos rótulos dos produtos especialmente em relação a seletividade a inimigos naturais.

Hoy (1995) salientou que o melhor paradigma para o manejo da resistência em Arthropoda deve envolver uma mudança no padrão de utilização de inseticidas o que é concordado por vários pesquisadores (Croft, 1990 a; Tabashnik, 1990; Leeper et al., 1986). Os produtores rurais e os agentes de extensão rural e até mesmo os técnicos de revendas de produtos químicos devem se conscientizar que não se pode depender apenas dos inseticidas químicos como prática principal de manejo. Deve-se também considerar o aumento das pressões sociais, econômicas e ecológicas, visando a redução do uso de inseticidas químicos. Com isso fatalmente deve-se pensar no aumento do uso de táticas de controle que não envolvam os inseticidas químicos e em especial para a S. frugiperda como salientado por Cruz (1995 ab, 1997 a, 2000 abc). A utilização de agentes de controle biológico já vem sendo avaliada há alguns anos no Brasil, para o controle da praga (Cruz et al., 1997ab, 1999a; Figueiredo et al., 1999).

A compatibilidade de inseticidas com esses agentes de controle biológico e mesmo com outras táticas de controle é um ponto crítico não só para a melhoria dos programas de manejo integrado e da qualidade ambiental como também para o manejo da resistência (Tabashnik & Croft, 1985; Croft, 1990 b). Embora a determinação da seletividade dos inseticidas em relação aos inimigos naturais das pragas seja um assunto complexo (Croft 1990 b; Hoy 1985 a, 1990), alguns resultados obtidos para a

podem ajudar na escolha dos produtos (Cruz, 1995a, 1997 a; Simões et al. 1998).

Segundo Hoy (1985 b, 1992), muitas vezes um inseticida químico não é tóxico para alguns inimigos naturais importantes de pragas agrícolas, quando utilizados em doses que seriam suficientes para controlar uma determinada praga. No entanto, a dose recomendada no rótulo é muito mais alta. Tal dose rompe o equilíbrio biológico, que poderia estar sendo efetivo no controle da praga, gerando, como conseqüência, aplicações adicionais do produto, que leva, sem necessidade, a uma seleção para resistência. Recomendações de doses de acordo com a situação deveriam constar no rótulo do produto.

Em resumo, para que se alcance sucesso no manejo da resistência de insetos a inseticidas deve-se pensar na introdução efetiva das táticas de manejo integrado das pragas. Não se pode considerar o manejo da resistência como um programa separado do manejo integrado. Apesar da consciência de que o problema da resistência das pragas aos inseticidas é mundial, e que precisamos diminuir o uso de tais químicos, não se deve esquecer que tais produtos ainda são muito úteis em programas de manejo integrado, pois são altamente eficientes, de ação rápida, adaptáveis em muitas situações e relativamente econômicos.

No entanto, deve-se reconhecer que para um manejo efetivo da resistência, deve-se mudar a filosofia de uso dos produtos, dando lugar crescente ao uso de outras táticas de manejo, especialmente envolvendo o uso de controle biológico e de genótipos resistentes as pragas. Sempre deve-se manter o pensamento de que produtos químicos só poderão ser utilizados de maneira precisa (dose, época, etc.) e seletiva (sem romper o equilíbrio com os inimigos naturais).

Embrapa Milho e Sorgo

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