Por que se preocupar com a brucelose bovina?

A chamada "doença das mil faces" é difíci de ser diagnosticada. Saiba mais sobre essa enfermidade para minimizar os riscos à saúde do rebanho.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

Quem nunca apreciou aquele leite cremoso tirado logo cedo, no curral, diretamente da vaca? E uma deliciosa fatia de queijo fresco artesanal? Irresistível, não? Porém, nosso paladar poderá nos envolver, atraindo-nos a um caminho perigoso: a brucelose.

Compondo o grupo das zoonoses, doenças transmitidas dos animais ao homem, a brucelose é causada por uma bactéria, que pode alojar-se dentro das células de defesa, o que dificulta seu controle. Devido à inespecificidade de sintomas, torna-se difícil o diagnóstico no homem, sendo conhecida como “Doença das mil faces”. Na fase inicial, o indivíduo enfermo pode apresentar sintomas como fraqueza, mal-estar, dores musculares e articulares, cefaléia e febre intermitente. O quadro pode evoluir e, geralmente, o tratamento é prolongado.

O consumidor pode contrair a brucelose através da ingestão de leite cru e derivados, preparados com leite que não foi submetido à tratamento térmico, onde a bactéria pode persistir durante vários meses. Em diversas regiões do Brasil é comum as pessoas consumirem produtos de origem animal, que não sofreram inspeção pelos órgãos e profissionais competentes. O comércio clandestino destes produtos constitui ameaça à saúde pública.

Vale ressaltar que a brucelose humana é de caráter principalmente ocupacional, ou seja, o grupo de maior risco é composto pelas pessoas que lidam diretamente com os animais infectados, como veterinários, criadores e tratadores, e ainda os que trabalham com produtos de origem animal. Portanto, a manipulação de leite e derivados ou carne contaminada, também pode levar à transmissão da doença ao homem.

A brucelose não é transmitida habitualmente de um ser humano a outro e, portanto, a profilaxia no homem deve ser feita pelo controle da doença nos animais. Uma das principais medidas de controle é a vacinação, obrigatória em todas as fêmeas bovinas e bubalinas de 3 a 8 meses de idade, sendo utilizada a vacina B19. Sem o certificado de vacinação, as fêmeas não podem participar de leilões e demais eventos.

Outra importante forma de controle da brucelose bovina é a eliminação dos animais reagentes positivos aos testes sorológicos. Estes exames diagnósticos devem ser realizados por médico veterinário habilitado, sempre que forem adquiridas fêmeas com idade igual ou superior a 24 meses, vacinadas entre três e oito meses de idade, e em fêmeas não vacinadas e machos com idade igual ou superior a oito meses. Muitas vezes, a introdução da brucelose no rebanho faz-se a partir da compra de bovinos aparentemente sãos que, no entanto, estão infectados pela bactéria Brucella abortus. A emissão de Guia de Trânsito Animal (GTA) fica condicionada à apresentação de atestados de exames negativos para brucelose.

A brucelose bovina encontra-se disseminada por todo o território nacional, sendo uma das principais causas de aborto em vacas. Animais sexualmente maduros, especialmente vacas prenhes, são mais suscetíveis à infecção, porém touros também adquirem a doença, podendo desenvolver inflamação dos testículos. Quanto aos bezerros, aqueles que não adquirem a doença via intra-uterina, ao ingerir leite de vacas brucélicas, poderão infectar-se. Estes animais só manifestarão sintomas de brucelose na fase da maturidade sexual, parecendo, até então, animais saudáveis, porém tornar-se-ão fontes de infecção para o rebanho.

A infecção por

em bovinos ocorre principalmente pela ingestão de alimentos e água contaminados com produtos de aborto, como fetos, descargas uterinas e restos placentários. Nas vacas brucélicas a primeira, e muitas vezes, a segunda gestação terminam em aborto, sendo eliminadas as bactérias junto à placenta, contaminando os pastos e consequentemente, os animais do rebanho. As gestações seguintes normalmente ocorrem sem grandes problemas, aparentando que o animal está curado ou, ainda, que ocorreu apenas algum problema de menor importância na prenhez anterior. Porém, apesar de não apresentar sinais clínicos, estas vacas continuam eliminando bactérias e contaminando o ambiente.

A brucelose bovina tem importância sócio-econômica e de saúde pública para o Brasil, podendo determinar consequências significativas para o comércio internacional de animais e seus produtos. Somente em 2004, no Brasil, foram diagnosticados 81.298 casos. Estima-se que esta enfermidade leve a redução de 20 a 25 % na produção leiteira, devido aos abortos, mortalidade de bezerros e demais problemas de fertilidade, determinando assim, importantes prejuízos econômicos à pecuária nacional.

O leite é um dos alimentos mais completos, devendo ter garantia de qualidade para segurança do consumidor. Uma das medidas mais importantes para assegurar a qualidade dos produtos de origem animal é a educação sanitária, pois visa a conscientização dos diversos profissionais envolvidos neste setor, bem como da população consumidora.

Karina Neoob de Carvalho Castro

Pesquisadora da Embrapa da Agropecuária Oeste (Dourados, MS)

Andrea Maria de Araújo Gabriel

Médica veterinária, doutora em Reprodução Animal, professora da Universidade Federal da Grande Dourados

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