Quatro problemas na agricultura que afetam o financiamento agrícola

Por João Paulo Torres, sócio diretor da TerraMagna

23.04.2020 | 20:59 (UTC -3)

No agronegócio, temos quatro grandes problemas escondidos a plena vista, são eles logística, armazenagem estática, problemas no seguro e problemas no crédito. Sim, eles são os grandes desafios do agro e vou te explicar o motivo. No Brasil, temos muita cobertura referente a ganhos incrementais, tais como no gerenciamento para dentro da porteira ou no manejo de pragas. Porém, problemas para fora da porteira - referentes à infraestrutura - são sistêmicos e atingem silenciosamente a rentabilidade do produtor rural.

Vou descrever abaixo sobre as características de cada problema:

A logística: O desafio da logística refere-se à baixa qualidade do escoamento da safra, que sofre com os problemas de infraestrutura. Apesar do grão brasileiro ser na porteira um dos mais baratos, o transporte deixa o valor similar a outros países. Os maiores custos logísticos reduzem diretamente da margem do produtor.

A armazenagem estática: Por outro lado, refere-se à capacidade de protegermos nossa safra da volatilidade do mercado e não termos que vender no preço atual. Na falta de armazenagem, por vezes resta a venda à vista do grão que não teve sua venda futura feita no preço corrente do mercado. Na medida em que precisam vender no preço à vista, os produtores ficam expostos à volatilidade e reduzem suas margens.

O seguro: O maior fator de risco na agricultura é o clima. Há quem deseje ser remunerado por se expor a esse risco (as seguradoras e resseguradoras) e aqueles que servem de fonte de exposição, devido à sua atividade (os produtores rurais). Para que faça sentido nas duas pontas, o valor dos prêmios pagos aos tomadores de risco deve ser compatível com a perda esperada historicamente. No mundo inteiro, a compatibilização dessa equação é feita por meio de subvenção aos prêmios pagos. Visto que a política agrícola brasileira apenas recentemente mudou seu enfoque de subvenção do crédito para o seguro e há uma carência de informações de produtividade agrícola, apenas uma pequena parcela (24%, sendo 12% em seguro privado e 12% do Proagro) das lavouras brasileiras é segurada. A comparação com os 92% de cobertura de lavouras americanas mostra a exposição climática que temos.

O crédito: O produtor brasileiro não tem liquidez. Ele tem um grande patrimônio - sua terra. Para produzir a safra, ele depende de dinheiro de um grande volume de capital de giro, para comprar sementes, fertilizantes, defensivos, que geralmente são financiados. Pode-se dizer que o importante insumo para safra brasileira é, no final, o crédito. Por conta disso, o custo do crédito impacta diretamente a rentabilidade do produtor rural, uma maior taxa de juros, real ou oculta, reduz margens. As taxas de juros livres praticadas na agricultura eram, até pouco tempo, incompatíveis com as margens dos produtores, motivo pelo qual o crédito subsidiado era tão importante. Agora, o crédito subsidiado tanto encareceu quando minguou, forçando produtores a buscar financiamento privado.

Vale mencionar que a perpetuação de cada uma dessas questões auxilia a continuidade dos demais. Margens menores, causadas por armazenagem, crédito e logística caros ou ineficazes, reduzem a oportunidade de investimento dos produtores com capital próprio.

Com menos investimento, ele continuará com baixa capacidade de armazenagem e crédito caro, mantendo suas margens baixas. As margens baixas dificultam a contratação de seguros climáticos, mantendo produtores e, consequentemente, toda a cadeia, exposta ao clima. Por sua vez, a ausência de seguro agrícola contribui para maior insegurança, elevando o custo do crédito, que passa a computar o risco de perda atribuído a ele.

No agro, há esses quatro desafios que precisam ser melhorados para esses problemas não serem algo comum no setor.

Então, os impactos desses problemas no setor afetam diretamente o financiamento do agro? Sem dúvidas! A logística, armazenagem estática e crédito são problemas que reduzem a margem do produtor rural todos os anos. Como eles representam um custo, no caso da armazenagem, diminuem a rentabilidade, que acaba diminuindo a margem para investimentos e a robustez a crises. No caso da ausência de seguro climático, o risco tem tanto caráter sistêmico, aleatório e de intensidade variável. Essas perdas decorrentes ocorrem em anos específicos, afetam regiões inteiras e podem causar perdas tremendas.

João Paulo é sócio-diretor da TerraMagna, AgTech que usa sistema de satélites e inteligência artificial para fazer a gestão de colateral agrícola e eliminar a inadimplência em operações a prazo safra.

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