Quebra induzida

Pesquisadores abordam o comportamento das videiras quanto ao desenvolvimento vegetativo, influenciado pelo clima diferenciado de cada região. Conheça as práticas culturais e produtos químicos indicados para a interrupç&a

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

As fruteiras de clima temperado caracterizam-se pela queda das folhas no final do ciclo e entrada em dormência no inverno, com a drástica redução de suas atividades metabólicas. Para que estas plantas iniciem um novo ciclo vegetativo na primavera, é necessário que sejam expostas a um certo período de baixas temperaturas.

A entrada em dormência, antes do reinício do ciclo vegetativo, parece necessária para uma adequada brotação das plantas, o que pode estar diretamente associado à mobilização de nutrientes das folhas senescentes para os órgãos de reservas como raízes, troncos e ramos. Além disso, funciona como um mecanismo de defesa da planta para resistir às condições adversas das baixas temperaturas invernais.

A dormência de gemas em plantas decíduas é governada por fatores do meio ambiente que afetam o nível dos hormônios vegetais, que por sua vez controlam as mudanças metabólicas que conduzem à quebra de dormência. Emmerson & Powell (1978), tentando elucidar este mecanismo, verificaram que o ácido abscísico endógeno decresce a níveis muito baixos quando as gemas de videiras são expostas a um período de frio, sendo que durante a abertura das gemas este atinge o seu nível mínimo. Sabe-se, também, que a intensidade da dormência de gemas está diretamente relacionada à atividade da catalase, que apresenta acentuada redução com o declínio da temperatura no inverno.

Segundo Fennel et al. (1996), a dormência em videiras pode ser promovida em resposta a um decréscimo de fotoperíodo. Em Vitis riparia, duas semanas de dias curtos, com 8 horas de fotoperíodo, promoveu o início da dormência, porém o processo ainda foi reversível. Entretanto, após 6 semanas de dias curtos, o processo de dormência estava bem avançado, com a total paralisação do crescimento.

Comparadas a outras plantas decíduas, as videiras requerem pouca exposição a baixas temperaturas para sair da condição de dormência. A necessidade de temperaturas abaixo de 7oC situa-se entre 50 e 400 horas, variando em função da cultivar.

Todavia, em regiões de clima tropical, o comportamento fisiológico da videira é totalmente diverso, o que permite obter produções em qualquer época do ano, desde que seja feito um controle da época de poda e da irrigação. Nessas regiões, práticas culturais como o desfolhamento e a interrupção da irrigação após a colheita podem ser benéficas para a brotação das videiras. Resultados de pesquisa demonstraram que a interrupção da irrigação, por um período de 16 dias após a colheita, aumenta o conteúdo de ácido abscísico e de açúcares e as reservas de compostos nitrogenados nos ramos, troncos e raízes.

Em conseqüência da alteração do comportamento fisiológico da videira pelas condições climáticas, observa-se uma acentuada dormência de gemas na maioria dos cultivares de videira introduzidas em regiões mais quentes, que varia em intensidade conforme a época do ano. Nessas regiões se faz necessária a utilização de compostos químicos para a quebra artificial da dormência, garantindo uma brotação abundante e uniforme das gemas.

Muitos compostos químicos como óleo mineral, dinitro-orto-cresol, tiouréia, nitrato de potássio, nitrato de cálcio, ácido giberélico e cinetina são citados como efetivos na quebra de dormência de muitas espécies de frutíferas. Esses compostos podem substituir parcialmente a necessidade de frio e estimular uma brotação precoce e mais uniforme das gemas. A videira, entretanto, não responde muito bem a esses compostos, e quando isso ocorre os resultados são pouco expressivos. Todavia, responde bem a compostos que contenham cianamida, como é o caso da cianamida hidrogenada e da cianamida cálcica.

A cianamida hidrogenada (H2CN2) é o regulador vegetal mais utilizado para superar a dormência das gemas de diferentes plantas decíduas. O produto comercial Dormex® (BASF) possui 49% de ingrediente ativo, devendo ser usado em pulverização sobre as gemas, em doses que podem variar em função do local, cultivar, vigor da planta, somatório de horas de frio acumulado, época de poda e estádio de dormência de gemas. O seu modo de ação ainda não está totalmente esclarecido, podendo estar relacionado aos seus efeitos no sistema respiratório das células e interferência em alguns processos enzimáticos que controlam o repouso das plantas, como, por exemplo, a atividade da catalase.

Como a ação desse produto não é sistêmica e sim localizada, é necessário que este atinja as gemas das plantas para que se obtenha o efeito desejado. A cianamida hidrogenada não deve ser pulverizada em plantas que tenham sido tratadas com fungicidas cúpricos três semanas antes ou que ainda mostrem resíduos destes produtos, pois pode ocorrer uma reação com a formação de cianamida cúprica, sem efeito para a quebra de dormência.

A aplicação da solução de cianamida hidrogenada pode ser realizada até dois dias após a poda, sem que haja prejuízos para as plantas tratadas. No entanto, quando a aplicação é realizada posteriormente, pode causar efeito fitotóxico nas primeiras folhas dos ramos, deixando-as encrespadas. Chuvas após 30 minutos da aplicação de cianamida hidrogenada praticamente não interferem na eficiência do tratamento.

Na região de Jundiai, SP, resultados de pesquisa comprovaram que a pulverização das gemas da videira Niagara Rosada, com cianamida hidrogenada, adianta a brotação das gemas e aumenta a porcentagem de gemas brotadas, o número de cachos e a produtividade por planta. Os melhores resultados são obtidos com concentrações de cianamida hidrogenada entre 1,4 e 1,6%. No Rio Grande do Sul, Miele (1991) obteve resultados semelhantes em videiras do cultivar Cabernet Sauvignon, sendo que as melhores doses de cianamida hidrogenada situaram-se entre 1,8 e 1,9%.

Para a videira Itália e suas mutações (Benitaka, Rubi, Brasil, Redimeire) cultivada na região de São Miguel Arcanjo, SP, recomenda-se concentrações de 4% ou 2% de cianamida hidrogenada, para as podas realizadas nos meses de julho e setembro, respectivamente. No entanto, para a região do Vale do Submédio São Francisco, recomenda-se a concentração de 6%, durante o período de clima ameno, de maio a agosto, e de 7% durante o período mais quente, de setembro a abril.

Em Jales, SP, região com invernos amenos, videiras da cultivar Centennial Seedless apresentaram maiores porcentagens de brotação, independente da época de poda de produção, através do tratamento das gemas com cianamida hidrogenada a 2,9%.

O uso de surfactantes pode reduzir consideravelmente a dose de cianamida hidrogenada necessária para a quebra de dormência de gemas de videiras. Adiciononando-se à solução de cianamida hidrogenada Armobreak (hidroxipolioxietileno polioxipropileno etil alquilamina) a 2%, Activator 90 (alquil polioxietileno éter) a 2% ou Agridex (parafina de óleo de petróleo) a 2%, é possível reduzir em até 50% a concentração de cianamida hidrogenada.

A cianamida cálcica é um fertilizante nitrogenado orgânico comercializado na forma de pó. Quando hidrolizada, como primeira transformação, reage para cianamida hidrogenada e hidróxido de cálcio. No Brasil, de modo geral, recomenda-se utilizar uma solução aquosa de 20%, aplicada por pincelamento das gemas de interesse após a poda. Os melhores efeitos da cianamida cálcica na brotação das gemas são obtidos quando esta for aplicada em condições de temperaturas mais amenas e alta umidade relativa. Tubos plásticos para cobertura dos ramos ou a cobertura total da planta podem ser utilizados como agentes auxiliares de brotação após a aplicação de solução de calciocianamida.

CAA -Unicentro/PR

IAC/SP

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