Sistema de plantio direto ou preparo reduzido na produção de tomate para processamento

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

O sistema de plantio direto (PD) ou cultivo mínimo, muito utilizado em grãos desde a década de 1970, é atualmente recomendado nas normas técnicas da produção integrada de tomate industrial (PITI), lançadas em outubro de 2006, com o objetivo de garantir a sustentabilidade da produção, alternativamente ao sistema de plantio convencional (PC) que tem trazido sérios problemas, especialmente com relação à erosão e eficiência de uso de água e energia. Como objetivos, o sistema visa manter ou aumentar os teores de matéria orgânica do solo, minimizar os processos erosivos e promover a melhoria das características físicas, químicas e biológicas do solo. O PD não é obrigatório, mas como é prerrogativa da produção integrada desenvolver sistemas produtivos com maior sustentabilidade, ele é recomendado.

Atualmente, a adoção do PD em hortaliças (tomate para processamento, cebola, brássicas) sobre palhada vem aumentando. Entretanto, pela dificuldade de operações de sulcamento, adubação e transplante, devido ao excesso de palha, especialmente quando se utiliza milho como planta de cobertura, é comum a passada de uma grade niveladora semi-aberta (ou semi-fechada) em área total, para uniformizar e reduzir um pouco a palhada, incorpornado-a superficialmente a 5-10cm e deixando ainda grande parte dos resíduos como cobertura do solo. A este sistema tem-se dado o nome de “plantio com preparo reduzido” (PPR).

A cadeia produtiva de tomate para processamento apresenta um bom nível de organização, sendo comum a produção contratada por empresas de processamento. De forma geral, tem-se observado a demanda por elevados padrões de produtividade associados à maior sustentabilidade e estabilidade da produção, com foco na redução de custos. Além disso, a pressão da sociedade por produtos mais saudáveis e com certificados de qualidade tem levado as empresas a se preocupar com a adoção de sistemas como a produção integrada. Assim, focando na sustentabilidade da produção, alguns produtores começaram a adotar o PD, com drástica redução no uso de máquinas e redução dos processos erosivos, problema importante em especial nos plantios mais precoces, de final de fevereiro a abril.

O plantio direto de tomate industrial foi testado inicialmente no interior de São Paulo e posteriormente nos cerrados de Goiás e de Minas Gerais, com transplantadora abrindo sulcos diretamente na palha. Como vantagens, tem-se a melhor conservação do solo, a maior tolerância a estresses hídricos e o menor uso de maquinário na lavoura. Verifica-se maior aproveitamento da produção em função da redução das perdas por podridões e do desenvolvimento dos frutos sobre a palhada e não em contato direto com o solo.

Atualmente, o plantio direto vem sendo utilizado em, aproximadamente, 40 a 50% da área total, especialmente em plantios precoces (final de fevereiro, março e início de abril) (informação pessoal – Weber Moreira, Unilever Bestfoods). Entretanto, não existe uma preocupação com o pleno estabelecimento do sistema de produção, de forma duradoura, sendo praticado em geral o cultivo sobre palhada de milho em um determinado ano, sem a preocupação com a manutenção do sistema após a colheita, o que torna comum a incorporação dos restos culturais do tomate.

A Embrapa Hortaliças vem realizando trabalhos com tomate para processamento em plantio direto desde 2003, de modo a atender as demandas do setor produtivo e da sociedade por sistemas que tenham foco na sustentabilidade da produção.

Com o objetivo de avaliar a viabilidade da adoção do PD e do PPR, a Embrapa Hortaliças vem realizando um trabalho em parceria com a Unilever Bestfoods desde 2006. Foram implantados experimentos na Fazenda Experimental da Unilever Bestfoods, nos arredores de Goiânia (GO), tendo o plantio convencional por testemunha (controle), avaliando ainda diferentes níveis de adubação de plantio e de adubação nitrogenada em cobertura. Utilizou-se milho e milheto como plantas de cobertura, na densidade de 25 e 100 kg ha-1 de sementes, respectivamente, sendo o milho plantado em linhas e o milheto a lanço. A cultivar de tomate utilizada foi a Heinz 9993, a mais plantada atualmente. Como preparo da área, foi feita trituração das palhadas de milho e milheto nas áreas sob PD e sob PPR. Previamente ao plantio, foi passada a grade niveladora no PPR, parcialmente fechada, de modo a incorporar superficialmente a palhada sobre o solo, o que facilita as operações seguintes (sulcamento e adubação e transplante). Na área sob PC, foi feita a subsolagem e passado o rotocultivador. O sulcamento e a adubação foram realizados com plantadora efetuando-se três linhas por passada. O transplante foi manual, no espaçamento de 1,5 m entre linhas e 22 cm entre plantas nas linhas, perfazendo um estande de 30.303 plantas por hectare. O controle das plantas espontâneas e das pragas e também de doenças foi o rotineiramente empregado, não se observando nenhum problema fitossanitário ou de infestação por mato que pudesse interferir nos resultados.

A produção comercial por planta foi estatisticamente superior no PD e no PPR, com 4,641 e 4,573 kg planta-1, respectivamente, em comparação com o PC, com 4,185 kg planta-1, o que pode ser justificado pelo menor estande final no PD e no PPR. O tomate rasteiro tem boa capacidade compensatória, isto é, as plantas sobreviventes apresentam uma boa capacidade de explorar o solo e seus nutrientes quando da ocorrência de falhas a seu lado, aumentando a produção por planta e reduzindo parcialmente a perda que poderia ocorrer na produção por área. Corrigindo-se as perdas no estande nos diferentes sistemas de produção, a produtividade foi superior no PPR (126.570 kg ha-1) e no PC (124.278 kg ha-1). No PD, mesmo com a maior produção por planta, a ligeira capacidade compensatória observada não foi suficiente para compensar as falhas no estande, em média de 20,5% no Plantio Direto, obtendo-se média de 110.851 kg ha-1. Certamente, resolvendo o problema de falhas no plantio, o PD teria expresso todo seu potencial produtivo, o que se pôde perceber pela produção individual de plantas. Portanto, devem ser feitas adaptações na sulcadora-adubadora para reduzir as deficiências observadas. A limpeza não realizada na linha de plantio à frente do disco de corte da palha dificulta muito o transplante pela presença de palhada em excesso e por deixar o sulco muito profundo, sem fechamento posterior, em especial quando o solo está molhado, situação comum em plantios precoces. Na prática, as mudas no PD muitas vezes ficaram “envelopadas” na palhada, sem um contato mais direto com o solo, o que acarretou no seu ressecamento. Sugere-se instalar um limpador de linhas à frente do disco de corte da palha e rolos para fechar os sulcos após a adubação.

A porcentagem de frutos podres foi significativamente maior no PC (3,56% dos frutos ou 149 g planta-1. No PPR e, especialmente, no PD os frutos não se desenvolvem diretamente sobre o solo, mas sobre a palhada, o que reduz a ocorrência de podridões. O PPR teve 2,89% de frutos podres ou 132 g planta-1, significativamente maior que o PD com 2% de frutos podres ou 93 g planta-1. Para frutos verdes, não foram observadas diferenças significativas entre PC e PD, com média de 5,01% ou 224 g planta-1.

Quando da adoção do PD ou do PPR, alguns fatores devem ser trabalhados de forma particular, com destaque especial para a adubação. Há que se considerar que a localização do adubo, o maior teor de matéria orgânica do solo, a maior diversidade da biota, incluindo microorganismos benéficos que podem contribuir para a absorção de nutrientes, podem permitir uma redução da adubação fosfatada sem comprometimento na produtividade e na qualidade dos frutos. Também, é importante atentar para a planta de cobertura utilizada para formação da palhada. Sendo normalmente utilizada uma gramínea, é possível que ocorra sequestro de nitrogênio (N) para decomposição da palhada, podendo haver a necessidade de adiantar ou de aumentar a adubação nitrogenada, como já observado em brássicas, em experimentos realizados na Embrapa Hortaliças e em unidades demonstrativas implantadas em parceria com agricultores.

No trabalho realizado em parceria com a Unilever Bestfoods, observou-se que na prática os cooperados utilizam como adubação de plantio uma recomendação padronizada de 1500 kg ha-1 de adubo formulado NPK 04-30-16, independente do sistema de produção e das características do solo. Assim, nos experimentos realizados, buscando-se adequar a adubação para o PD e para o PPR, foram testados os níveis de 1146, 1293, 1493 e 2000 kg ha-1 de NPK 04-30-16, valores determinados em função da distribuição de adubo obtida na regulagem da adubadora que foi utilizada. Com relação à adubação de cobertura, ela é normalmente feita em uma única aplicação 28 dias após o transplante, na dosagem de 300 kg ha-1 de NPK 18-00-27. Nos experimentos realizados foram estabelecidos quatro níveis de adubação nitrogenada: 100%, 120%, 140% e 160% da recomendação. Com relação à adubação de plantio, a interação sistemas de plantio x adubação de plantio não foi significativa, indicando que a variação de níveis de adubação de plantio apresentou comportamento semelhante nos diferentes sistemas. Assim, analisando-se os resultados, pôde-se perceber a possibilidade de redução da adubação de plantio no PD e no PPR, em relação à convencionalmente empregada pelos cooperados da empresa parceira, certamente considerando-se as condições de fertilidade do solo e de manejo adotadas. O incremento em produtividade a partir de aproximadamente 1220 kg ha-1 foi muito reduzido, não compensando o custo do fertilizante empregado. Os seis sacos a mais de fertilizante empregadas no nível 3 (1500 kg ha-1) em relação ao nível 2 (1200kg ha-1) promoveram incremento produtivo de 3.044 kg ha-1. Em termos econômicos, tem-se portanto um investimento de R$ 510 (preço do saco de fertilizante a R$85 no período) para um retorno de R$ 427 (preço aproximado de R$ 140 pago pela indústria por tonelada de tomate no período). Deve-se ainda ressaltar a questão da responsabilidade no uso de adubos fosfatados de alta solubilidade, bem cada vez mais escassos e consequentemente caros. Portanto, uma economia de 20% no uso de adubos fosfatados como a que pôde ser feita nas condições deste experimento sem perda na rentabilidade é, sem dúvida, uma contribuição para retardar a necessidade de buscar novas alternativas e de reduzir os impactos negativos muitas vezes associados à tomaticultura.

Com relação à adubação de cobertura, o incremento nas doses de nitrogênio não apresentou resposta, devendo-se manter a adubação atualmente recomendada, contrariando o observado em culturas com couve-flor e repolho, nas quais se recomenda uma adubação de cobertura com N de 20 a 50% maior no PD sobre palhada de milho ou milheto, comparativamente ao PC. Isso ocorreu provavelmente porque o manejo da palhada (trituração) foi realizado com uma antecedência de 15 dias em relação ao plantio, enquanto que nas brássicas o manejo foi realizado dois dias somente.

O plantio direto em tomate para processamento, assim como em outras cultivos, é ferramenta fundamental para a sustentabilidade da produção. Entretanto, o entendimento da diferenciada dinâmica dos processos envolvidos com a produção, manejo da fertilidade e da irrigação, dinâmica da matéria orgânica, ocorrência e distribuição de pragas e doenças, necessidade de adaptações em equipamentos, devem ser melhor trabalhados de modo a viabilizar a sustentação do sistema de PD nas unidades produtivas. Certamente, surgirão novas oportunidades, em especial para o desenvolvimento de maquinário específico para o plantio em PD.

O Plantio Direto (PD) é um sistema agrícola preservacionista com relação aos recursos naturais água e solo que visa obter o máximo do potencial produtivo das culturas no longo prazo, fundamentando-se em três princípios básicos: o revolvimento mínimo do solo, a rotação de culturas e a cobertura do solo.

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