Superficial ou enterrado?

Pesquisa da Embrapa Hortaliças analisa o desempenho dos métodos de irrigação utilizados na cultura do tomate para processamento.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

A aspersão é o principal método utilizado na irrigação do tomateiro para processamento no Brasil, representando cerca de 95% da área total. Por molhar as plantas, a aspersão favorece uma série de doenças fúngicas e bacterianas da parte aérea, podendo provocar perdas significativas de produção e qualidade de frutos.

Mesmo sem dispor de informações tecnológicas suficientes, alguns produtores começaram a utilizar, nos últimos anos, o gotejamento superficial como uma alternativa para aumentar a produtividade e a qualidade de frutos, economizar água e minimizar o uso de fungicidas. O gotejamento superficial, no entanto, pode favorecer algumas doenças de solo, como a murcha-bacteriana, devido ao acúmulo de água próximo à planta. Estudos realizados na Embrapa Hortaliças vêm buscando estabelecer parâmetros para uso do gotejamento em tomateiro.

O sistema de gotejamento subterrâneo (ou enterrado), em comparação ao superficial, apresenta algumas vantagens adicionais, como aplicar água e nutrientes diretamente na zona radicular, reduzir as perdas por evaporação, evitar danos mecânicos e por roedores às linhas de gotejadores, reduzir a umidade na superfície do solo e minimizar a incidência de doenças.

Em estudos realizados na Califórnia, com gotejamento subterrâneo (25 a 45 cm de profundidade) em tomateiro para processamento foram obtidas produtividades acima de 140 t/ha, quando a irrigação e a fertirrigação foram realizadas de forma precisa e sob regime de alta freqüência.

A profundidade recomendada para a instalação das linhas laterais de gotejadores depende de vários fatores, especialmente daqueles relacionados às características físicas, hídricas e químicas do solo. Assim, solos profundos, férteis e com alta condutividade hidráulica não-saturada permitem maiores profundidades de instalação dos gotejadores. Como regra geral, sugere-se que a profundidade deve ser suficiente para que não haja afloramento de umidade na superfície do solo e que as operações de preparo possam ser realizadas sem causar danos às tubulações, haja vista que o sistema deve permanecer instalado no campo.

A principal limitação do gotejamento subterrâneo está relacionada ao estabelecimento inicial da cultura. Por não fornecer condições satisfatórias de umidade na superfície do solo para a germinação de sementes ou pegamento de mudas, se faz necessário, muitas vezes, o uso da irrigação por aspersão, o que ocasiona a elevação de custos. Outro problema potencial é o entupimento de gotejadores por partículas de solo e de raízes, o que pode ser prevenido pelo uso de válvulas anti-vácuo, gotejadores especiais e injeção de Trifluralina.

Estudos realizados na Embrapa Hortaliças avaliaram a produção do tomateiro para processamento sob diferentes profundidades de instalação da linha lateral de gotejadores, comparativamente ao sistema tradicional por aspersão, nas condições de solo e clima da região de cerrados do Brasil Central.

Os experimentos foram conduzidos na Embrapa Hortaliças, Brasília, DF, em um Latossolo Vermelho, textura argilosa e capacidade de retenção de água de 1,3 mm/cm2; Os tratamentos consistiram de três profundidades de instalação da linha de gotejadores: superficial (TGS), 20 cm (TG20) e 40 cm (TG40). Um tratamento irrigado por aspersão (TA) foi utilizado como controle.

O transplante de mudas do híbrido Heinz 9498 foi realizado no espaçamento de 30 cm x 120 cm. Nos primeiros 14 dias após o transplante todos os tratamentos foram irrigados por aspersão a cada 1-2 dias, haja vista que o pegamento de mudas no gotejamento subterrâneo, com laterais enterradas à profundidade igual ou superior a 20 cm, é problemático.

Foi utilizada uma linha de gotejadores, com vazão de 4,0 L/h/m e espaçados de 30 cm, por linha de plantas. As irrigações foram a cada 3-4 dias até o início da frutificação, a cada 2 dias na fase de crescimento de frutos e a cada 3-4 dias após 10% de frutos maduros. A lâmina de irrigação foi igual para todos os tratamentos por gotejamento, sendo computada a partir da evaporação do tanque Classe A. O manejo de água no tratamento TA foi segundo trabalhos desenvolvidos na Embrapa Hortaliças, utilizando-se o tanque Classe A. Nos tratamentos por gotejamento, 85% do N e do K e 30% do Ca foram aplicados via fertirrigação.

Foram realizadas determinações da tensão de água no perfil do solo antes de cada irrigação. Após a colheita, avaliou-se a profundidade efetiva do sistema radicular da cultura, tendo sido considerada aquela contendo 80% das raízes.

Como principais resultados dos ensaios conduzidos verificou-se que a lâmina bruta total de água aplicada foi de 370 mm (50 irrigações) nos tratamentos por gotejamento e de 430 mm (28 irrigações) na aspersão. A precipitação pluvial durante o estudo foi de 148 mm, tendo ocorrido nos 14 dias que antecederam a colheita. A tensão de água do solo antes das irrigações, estimada a 50% da profundidade efetiva das raízes, foi em média 25 kPa para o TGS, 40 kPa para o TG20, 80 kPa para o TG40 e 55 kPa para o TA.

A profundidade efetiva das raízes no final do ciclo da cultura foi de 40 cm para o TGS, 48 cm para o TG20, 57 cm para o TG40 e 45 cm para o TA. O maior crescimento das raízes ocorreu nas maiores profundidades de instalação dos gotejadores, em razão da água e nutrientes terem sido fornecidos nas camadas mais profundas do solo.

O ciclo vegetativo das plantas não foi afetado pelos sistemas de irrigação, sendo a colheita realizada aos 115 dias após o transplante. A irrigação por aspersão, durante as primeiras duas semanas, garantiu um pegamento de mudas uniforme. O menor crescimento vegetativo de plantas nos TG20 e, especialmente, no TG40 (Tabela 01 -

), resultou da maior deficiência de água no solo a que as plantas foram submetidas, especialmente nos estádios vegetativo e de frutificação.

A maior produtividade de frutos ocorreu no TGS, a qual não diferiu estatisticamente do TG20 (Tabela 01). Por sua vez, não houve diferença de produtividade entre os TG20 e TA. A produtividade no TG40 foi a menor entre todos os tratamentos, resultante da maior deficiência de água no solo que as plantas foram submetidas. A menor produtividade no TA, relativa aos TGS e TG20, foi devido à maior tensão de água do solo a que as plantas foram submetidas e, principalmente, ao fato de a aspersão favorecer maior incidência de doenças foliares e apodrecimento de frutos.

A maior eficiência do uso de água (EA) ocorreu nos TGS e TG20, enquanto que a menor foi obtida nos TA e TG40 (Tabela 01). A menor EA do TA, comparativamente aos TGS e TG20, deveu-se provavelmente a menor uniformidade de aplicação de água do sistema por aspersão e ao fato de a aspersão molhar a parte aérea das plantas, favorecendo doenças. A menor EA do TG40 pode ser atribuída à deficiência de água a que as plantas foram submetidas e à perda de parte da água aplicada além do sistema radicular das plantas.

Os tratamentos afetaram o número de frutos comerciais por planta de forma similar à produtividade (Tabela 01). Assim, a produtividade esteve diretamente correlacionada ao número de frutos por planta, uma vez que o estande final (média de 27.501 plantas/ha) e a massa média de frutos (média de 78,8 g) não foram afetadas pelos tratamentos.

O maior apodrecimento de frutos no TA (Tabela 01) deve-se ao fato de a aspersão molhar freqüentemente a folhagem das plantas e dos frutos, favorecendo maior incidência de doenças. A menor taxa de frutos podres nos TG20 e TG40, em relação ao TGS, foi devido a superfície do solo e dossel vegetativo da cultura permanecerem praticamente secos, mesmo por ocasião das irrigações, o que contribuiu para minimizar a incidência de doenças.

As variáveis de qualidade avaliadas (teor de sólidos solúveis totais, acidez titulável, firmeza e cor) não foram afetados pelos sistemas de irrigação.

a) A produtividade no gotejamento superficial foi 30% maior que no gotejamento subterrâneo a 40 cm e 15% maior que na aspersão;

b) Gotejamento subterrâneo a 20 cm possibilita alta produtividade, mas requer que se irrigue por aspersão na fase inicial para auxiliar o pegamento e o desenvolvimento inicial de mudas. Profundidades superiores a 20 cm não devem ser utilizadas em solos de cerrado;

c) A incidência de frutos podres na irrigação por aspersão foi 110% maior que no gotejamento superficial e 460% maior que no gotejamento subterrâneo (20 e 40 cm);

d) A instalação da linha de gotejadores a 20 cm de profundidade foi suficiente para não provocar afloramento da umidade na superfície do solo, reduzir apodrecimento de frutos e garantir alta produtividade, mas insuficiente para que as operações convencionais de preparo de solo possam ser realizadas sem risco de dano às laterais. Assim, deve-se utilizar práticas alternativas de cultivo, como por exemplo plantio direto;

e) Para minimizar danos mecânicos e os causados por roedores à tubulação, comuns no gotejamento superficial, a linha lateral pode ser instalada a cerca de 5 cm de profundidade;

f) Para evitar a entrada de partículas de solo em gotejadores enterrados deve-se usar equipamentos apropriados, como válvulas anti-vácuo;

g) Para evitar a entrada de raízes em gotejadores enterrados pode-se fazer uma única aplicação de trifuralina (0,25 mL/gotejador), via água de irrigação, no início do ciclo de desenvolvimento do tomateiro, durante 20 a 30 minutos.

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Embrapa Hortaliças

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