Uso de biodiesel

Apesar dos bons resultados obtidos, o uso de biodiesel em escala comercial ainda é uma realidade distante dos produtores rurais. Mas as pesquisas continuam mostrando que a utilização do combustível é uma excelente altern

23.05.2016 | 20:59 (UTC -3)

Com o aumento da população, do transporte e da agricultura, aliado à previsível escassez de petróleo e à redução das emissões de gases, a viabilidade de uso do biodiesel como fonte alternativa de energia ainda depende de vários fatores, entre os quais se destacam a proporção de mistura do biodiesel ao diesel e a organização de sua cadeia produtiva.

O trator agrícola tem como função transportar, acionar e tracionar máquinas e implementos, sendo a principal fonte de transformação e fornecimento de energia para o sistema de produção agrícola atual. Por esse motivo, existe a necessidade crescente de estudos que consigam aumentar o rendimento, reduzir o custo da hora trabalhada, minimizar os impactos ambientais, bem como desenvolver combustível alternativo para o funcionamento dessa máquina.

Estudos para avaliar o desempenho operacional de motores utilizando biodiesel não apontam indícios de aumento de desgaste, comprometimento de potência ou redução na durabilidade. Experimentos realizados mostram que o uso de misturas (biodiesel e diesel mineral) até o limite de 50% não compromete o desempenho do trator. Já misturas acima deste patamar podem acarretar redução de torque e potência do motor.

MISTURAS DE BIODIESEL X DIESEL

Para avaliar o desempenho energético do trator agrícola uma equipe de pesquisadores da Universidade Federal Rural do Semiárido realizou um experimento utilizando diesel mineral (B0) e seis proporções de misturas biodiesel/diesel (B5, B10, B20, B50, B75 e B100) em que o número indica a porcentagem em volume de biodiesel no diesel na operação de escarificação.

OPERAÇÃO DE ESCARIFICAÇÃO

Para a realização da pesquisa foi escolhida a operação de escarificação, que consiste da mobilização subsuperficial do solo para romper as camadas compactadas de até 35cm de profundidade, que demanda grande esforço de tração e consumo de combustível. A área escolhida havia sido manejada em sistema de plantio direto, com solo predominante latotossolo vermelho distroférico típico, com teor de água próximo à capacidade de campo.

O escarificador usado foi da marca Jan, modelo Jumbo Matic, de arrasto, com sete hastes espaçadas de 0,40m, largura de trabalho de 2,80m, equipado com discos de corte, rolo destorroador, hastes parabólicas com ponteiras estreitas e sistema de levantamento hidráulico, regulado para trabalhar a 30cm de profundidade.

Para tracionar o escarificador utilizou-se um trator marca Massey Ferguson, modelo MF5285 cabinado, com tração dianteira auxiliar (TDA), potência de 62,5kW (85cv) no motor a 2.200rpm, norma ISO TR14396, peso de embarque de 44,1kN (4.500kgf), com lastro, rodado traseiro 18.4-30R1 e dianteiro 12.4-24R1. Quando da realização dos ensaios o trator encontrava-se como lastragem máxima (pesos metálicos + água nos rodados).

PARÂMETROS MONITORADOS E

INSTRUMENTAÇÃO ELETRÔNICA

As variáveis monitoradas foram requerimento de força na barra de tração em kN, velocidade de deslocamento em km/h, consumo horário volumétrico em L/h, número de voltas do rodado traseiro, temperaturas do combustível de alimentação, retorno em graus centígrados e temperatura do óleo do motor.

De posse dos dados monitorados calculou-se a patinagem dos rodados traseiros em porcentagem, a potência média requerida na barra de tração em (kW) e o consumo específico em L/kW/h.

Para monitorar o requerimento de força instantâneo na barra de tração foi instalada uma célula de carga entre o trator e o escarificador, nivelada horizontalmente. Para monitorar o consumo horário de combustível foram utilizados dois fluxômetros da marca Oval Corporation – Japan, modelo LSN 40 M-III com precisão 1mL×pulso, instalados um na linha de alimentação, antes da bomba injetora, e outro na linha de retorno do combustível ao tanque. O consumo horário volumétrico real foi calculado pela diferença entre o volume de combustível que entra na bomba injetora e o volume que retorna para o tanque.

Foram utilizados sensores de proximidade indutivos instalados na parte interna dos cubos das rodas traseiras próximo à cabeça dos parafusos que fazem a fixação da roda para monitorar a patinagem dos rodados motrizes.

A velocidade de deslocamento instantânea foi monitorada por uma unidade de radar marca Dickey-John, modelo DjRVS, com erro menor que 3%. A velocidade média de deslocamento foi determinada calculando-se a média aritmética de todos os valores armazenados em cada parcela experimental.

Utilizou-se um sistema de aquisição de dados computadorizado marca“Campbell Scientific, modelo CR23X, para monitorar e gravar continuamente, a uma frequência de 10Hz, previamente definido por programação, os sinais gerados pelos transdutores e sensores instalados no conjunto motomecanizado.

Como o objetivo do trabalho foi avaliar a demanda energética do trator em função das misturas de diesel x biodiesel, trabalhou-se na condição de capacidade de tração máxima disponibilizada pelo trator. Para que o trator conseguisse tracionar o escarificador a 30cm de profundidade utilizou-se a marcha 1ª L reduzida.

FORÇA DE TRAÇÃO, VELOCIDADEE PATINAGEM x MISTURAS

A força requerida pelo escarificador na barra de tração apresentou diferenças significativas, variando de 2.344kgf no tratamento B100 a 2.746kgf para o B5 (Figura 1), variações ocorridas devido à condição não uniforme do solo.

A rotação do motor foi regulada para trabalhar a 1.900rpm, este valor apresentou pequenas alterações, variando 3,3%, de 1.848 para o B10 a 1.909rpm para o B5. Variações essas aceitáveis em função da alteração de carga necessária na barra de tração pelo escarificador.

A velocidade de deslocamento teórica do trator em função do escalonamento de marcha utilizado (1ª L reduzida) a 2.200rpm é de 2,7km/h. Na realização da operação a velocidade variou de 2,39km/h para o tratamento B10 a 2,61km/h para o B100. As variações de velocidade ocorridas são justificadas pelos valores observados na patinagem do rodado traseiro, que variou de 23,4 para o B100 a 35,3% para o B5, sendo este maior valor justificado por apresentar também o maior requerimento de força na barra de tração.

Os altos valores para a patinagem são justificados pelo limite de carga imposto ao trator, já que o objetivo do trabalho foi avaliar o seu desempenho energético na situação de máxima demanda de potência.

POTÊNCIA, CONSUMO HORÁRIO E

CONSUMO ESPECÍFICO x MISTURAS

A demanda de potência na barra de tração variou de 16,5kW para o B10 a 18,1kW para o B5 (Figura 2), variações essas influenciadas pelo requerimento de força e velocidade de deslocamento do conjunto.

O menor e o maior consumo horário de combustível foram obtidos para as misturas B10 e B5, respectivamente. O maior consumo horário foi verificado para o B5 que apresentou o maior requerimento de força e a maior patinagem (Figura 1). Para avaliar o desempenho energético do trator em função das misturas utilizadas, a variável consumo específico é mais apropriada, já que o cálculo da mesma leva em consideração os fatores requerimento de força, velocidade de deslocamento e patinagem do rodado motriz, representando, assim, a quantidade de energia, necessária para gerar 1kW de potência na barra de tração. O menor valor de consumo específico foi obtido para o B0, valor esse justificado pelo maior poder calorífico do diesel mineral. Para as demais misturas observa-se um aumento do consumo específico quando comparado com o B0.

Para as misturas B5, B10, B50 e B100 o consumo específico apresentou incrementos positivos com o aumento do biodiesel. As misturas B10 e B20 apresentaram o mesmo valor, demonstrando não haver interferência na potência gerada com o incremento de biodiesel. O menor consumo específico para as misturas foi verificado para o B75, demonstrando ser essa a mais econômica dentre as misturas utilizadas. A utilização do biodiesel puro (B100) acarretou o maior consumo específico, com aumento de 6,4% e 5% quando comparado com B0 e B75, respectivamente.

TEMPERATURAS x MISTURAS

Um fator importante quando da utilização de percentuais elevados de biodiesel é avaliar a temperatura de funcionamento do motor, uma vez que este fator pode indicar a possibilidade de contaminação do óleo lubrificante com o biodiesel, provocando a sua diluição tendo suas capacidades dispersantes e detergentes reduzidas.

Como se pode verificar na Figura 3, a temperatura do ar de admissão para as misturas ensaiadas variou de 22ºC a 26,6ºC, enquanto a temperatura do óleo do motor permaneceu dentro dos valores padrões de funcionamento, inferior a 90ºC.

A temperatura dos gases de escapamento variou de 258ºC a 351ºC, com o maior valor sendo verificado para a mistura B5, a qual também apresentou o maior requerimento de força e consumo horário de combustível.

Figura 1 - Força requerida na barra de tração (FBT) em kgf, rotação do motor (ROT) em rpm, velocidade de deslocamento (VEL) em km/h e patinagem dos rodados traseiros (PAT) em %

Figura 2 - Potência requerida na barra de tração (P_BT) em kW, consumo horário de combustível (Cons. Hor.) em L∙h-1 e Consumo específico (Cons. Esp.) em L∙(kW∙h)-1

Figura 3 - Temperatura dos gases de escapamento (Temp. Escap.), do ar de admissão (Temp. Adm.) e temperatura do óleo do motor (Temp. Motor) em ºC

Este artigo foi publicado na edição 143 da revista Cultivar Máquinas. Clique aqui para ler a edição.

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