Combate da praga Diabrotica speciosa no tomate

Novos estudos nas áreas comportamentais e de controle são necessários diante dos fenômenos contemporâneos em torno deste inseto

03.07.2020 | 20:59 (UTC -3)
Cultivar hortaliças em frutas

Dentre as pragas que atacam o tomateiro está a Diabrotica speciosa. Esta espécie é polífaga, amplamente distribuída nos estados brasileiros e em alguns países da América do Sul. Nas lavouras de tomate é uma praga de grande importância, pois na fase larval ataca as raízes da cultura, acarretando diminuição da absorção de nutrientes, e na fase adulta se alimenta das folhas, diminuindo a área foliar e, como consequência, a produção de fotoassimilados. Portanto, ambas as fases são consideradas causadoras de danos indiretos que acarretam grandes perdas no tomateiro.

Morfologia, biologia e comportamento

D. speciosa é o nome científico deste coleóptero da Família Chrysomelidae, conhecido vulgarmente por vaquinha, brasileirinha, vaquinha verde-amarela, cuja larva é também identificada por outro nome vulgar: larva-alfinete, devido ao hábito de perfurar os tubérculos de batata, deixando orifícios redondos, assemelhando-se a furos provocados por alfinetes. Dano semelhante já foi encontrado nos frutos do tomateiro.

O adulto de D. speciosa possui entre 4,5mm e 6mm de comprimento, sendo os machos sempre menores em relação às fêmeas, que, prontas para a oviposição, apresentam abdome bastante entumecido. Possuem coloração verde, com três manchas amarelas sobre os élitros, sendo a basal mais longa e avermelhada. Apresentam antenas escuras, cabeça variando do marrom-avermelhado ao negro e pernas escuras, alimentando-se da parte aérea das plantas.

Os ovos são amarelos e medem 0,5mm de diâmetro, e o período de incubação dura em torno de seis dias a oito dias. As formas jovens apresentam 10mm de comprimento quando completamente desenvolvidas e têm coloração geralmente esbranquiçada. Porém, podem se apresentar ligeiramente amareladas. A cabeça, o tórax e as pernas têm coloração negra, além de possuírem uma placa quitinizada de cor escura no último segmento abdominal.

D. speciosa apresenta três instares larvais, sendo que o período de desenvolvimento das fases imaturas (ovo, larva, pré-pupa e pupa) igualmente aos adultos, pode variar em função do clima e do hospedeiro. Segundo a literatura, o ciclo de vida pode durar de 24 dias a 40 dias, sendo ovo de cinco a sete; larva de 14 a 26; pré-pupa cinco dias e pupa cinco a sete dias (Figura 1).

Figura 1
Figura 1

As pupas apresentam 5mm de comprimento, são brancas e ficam protegidas em uma câmara pupal logo abaixo da superfície do solo.

Normalmente os adultos de D. speciosa preferem áreas onde o solo é mais escuro e úmido, devido à possibilidade de ovipositar e a sua prole ter maiores condições de sobrevivência. O cultivo de tomate para indústria proporciona ambientes úmidos, devido aos ciclos de regas dos pivôs, que favorecem o seu desenvolvimento.

As larvas-alfinete alimentam-se, geralmente, do sistema radicular, mas podem ser encontradas em tubérculos e estolões. Sua longevidade e reprodução são afetadas por temperatura e hospedeiros.

Estudos relacionados a cultivos de milho apontam que as larvas apresentam uma distribuição em reboleira, com alta variabilidade, podendo ocorrer de 0-100 larvas por planta. A mobilidade é pequena, sendo que altos teores de umidade e matéria orgânica favorecem a sobrevivência das formas jovens, que permanecem próximas ao redor das raízes e geralmente se concentram nos primeiros 10cm da superfície do solo.

Flor de tomateiro atacada por adulto de vaquinha.
Flor de tomateiro atacada por adulto de vaquinha.
Danos em frutos de tomateiro causados por Diabrotica speciosa.
Danos em frutos de tomateiro causados por Diabrotica speciosa.

Danos em tomate para a indústria

Nestes últimos anos, em cultivos de tomate para a indústria no estado de Goiás, os danos dessa praga não se restringiram somente a efeitos indiretos. Adultos de D. speciosa têm sido observados atacando flores e frutos em desenvolvimento. No caso de flores, podem provocar abortamento e reduzir o número de frutos nas pencas. Quanto aos frutos, os adultos começam o ataque fazendo furos que podem ser confundidos com aqueles ocasionados por brocas grandes, como Helicoverpa Chloridea. O que diferencia estes ataques são a presença de adultos se alimentando internamente desses frutos e fezes de aspecto filiforme e de coloração escura na entrada desses orifícios. O ataque de frutos já havia sido relatado em nectarina, onde causam depreciação, entretanto em frutos do tomateiro, apenas relatos esporádicos foram encontrados.

Além dos adultos, as formas jovens conhecidas como larvas alfinete, foram observadas atacando frutos de tomate rasteiro, típico para processamento, mais especificamente aquelas pencas que se desenvolvem encostadas ao solo. Os frutos atacados apresentam furos arredondados e quando abertos verifica-se um escurecimento bastante típico, e com o tempo apodrecem e ficam inviáveis para a utilização na indústria.

Sabe-se que adultos danificam a parte aérea (folhas) de diversas culturas como solanáceas, cucurbitáceas, crucíferas, leguminosas e gramíneas, além disso, são citados como vetores de patógenos, como bactérias e vírus. No caso de vírus, podem ser facilmente transmitidos de forma mecânica ou até mesmo de um inseto para outro, por meio do contato com material regurgitado, defecado ou hemolinfa contaminada. Segundo estudos, na ordem Coleóptera, as espécies dos gêneros Cerotoma spp. e Diabrotica spp. são vetores de importantes viroses nas Américas.

Observa-se no campo o aumento de doenças nas áreas com maior população de D. speciosa, fato que requer estudos epidemiológicos mais aprofundados para conhecer, identificar e quantificar as doenças associadas a este coleóptero cada vez mais frequente nas áreas de tomate para a indústria.

Duas viroses com potencial de se intensificarem em função do ataque da D. speciosa são o mosaico-do-fumo, causado pelo TMV (Tobacco mosaic virus), e o mosaico-do-tomateiro, causado pelo ToMV (Tomato mosaic virus). Estes vírus infectam diversas espécies de plantas, como o tomateiro. Ambos são normalmente assintomáticos, mas algumas estirpes severas podem levar ao mosaico suave alternado com embolhamento foliar. No campo, a transmissão desses vírus é mecânica, geralmente por meio do contato direto entre plantas e pelas mãos de operários, e a forma de ataque de adultos de D. speciosa tem potencial para disseminar estes vírus. 

Presença da larva alfinete no interior de fruto de tomateiro.
Presença da larva alfinete no interior de fruto de tomateiro.
Furos em frutos de tomateiro provocados pelo ataque da larva alfinete.
Furos em frutos de tomateiro provocados pelo ataque da larva alfinete.

Controle

Segundo alguns autores, o controle desse coleóptero, tanto na fase adulta como larval, é baseado quase que, unicamente, no uso de agroquímicos. Contudo, esta ferramenta tem apresentado cada vez menos eficiência, já que o inseto, em virtude de seu comportamento polífago, se espalha facilmente nos cultivos, promovendo as temidas reinfestações, principalmente quando as condições ambientais favorecem o aumento populacional da praga. Fato este que se confirma no estado de Goiás, visto a presença de plantios de milho o ano inteiro, hospedeiro comum deste inseto.

Com relação às formas larvais, geralmente o controle se dá por meio do tratamento de sementes, que tem sido considerado ineficaz, segundo estudos, especialmente em gramíneas como o milho, pois as larvas podem causar danos nesta cultura por um período de um a dois meses após a semeadura, logo o inseticida utilizado no tratamento das sementes não possui residual suficiente para garantir uma proteção adequada ao sistema radicular das plantas.

Os adeptos da agricultura orgânica recomendam o uso de macerados da própria praga como repelente, alertando para a fitotoxicidade, sugestão sem respaldo da pesquisa científica. O uso de iscas com raiz de taiuiá (Cayaponia sp.) e os frutos de porongo, cabaça ou cuia (Lagenaria sp.) são também recomendados.  

Frutos de tomateiro danificados pela incidência de Diabrotica Speciosa.
Frutos de tomateiro danificados pela incidência de Diabrotica Speciosa.

Considerações finais

Diante do exposto constatam-se as lacunas da pesquisa científica sobre o avanço desta, que usualmente se apresenta como praga secundária, mas que tem apresentado potencial para onerar ainda mais a cultura do tomate para a indústria. Não se trata de uma crítica, pois as informações aqui apresentadas são observações atualizadas do fenômeno que tem ocorrido no campo. Faz-se necessário apresentar estratégias de controle eficientes, com reduzido impacto ambiental e para tanto devem ser conduzidos estudos nas áreas comportamentais e de controle. Ressalta-se que observações devem servir de alerta para os pesquisadores da área, pois esta praga, que traz nas suas cores os tons da bandeira brasileira, tem potencial para se tornar um problema nacional. 

Cecilia Czepak, Vinicius S. Magalhaes, Karin F. S. Collier, Lucas G. Santos, Anderson de S. Zandomenighi, Willian L. Silva, Alisson de S. Zandomenighi, Sergio L. Marques Filho, Leonardo Y. S. Schmidt, Luidgi S. Nascimento e Karina C. A. Godinho, Escola de Agronomia/UFG

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