Como minimizar perdas na aplicação de defensivos agrícolas

Na pulverização, a escolha, a correta utilização e as orientações para a aplicação dos produtos são fundamentais

16.07.2020 | 20:59 (UTC -3)
Revista Cultivar

Dentre diversas características, o Brasil é conhecido pela grande carga burocrática que possui, e na mesma medida, somos especialistas em violar normas. Algumas porém, são necessárias e contributivas se bem preparadas, compreendidas e utilizadas.

Dentre as demandas por normas brasileiras está a pulverização terrestre, pois não há um consenso formal estabelecido sobre as boas práticas que direcionam a atividade. Embora exista uma boa qualidade e disponibilidade de técnicas, equipamentos e acessórios, o seu uso ainda não é suficientemente orientado. A ausência desta orientação implica carência de critérios para decisões mais consistentes, o que resulta em perdas durante a operação. A escolha do tamanho de gotas, por exemplo, não é ação simples e deve levar em conta aspectos como o clima, a especificidade, os hábitos e a movimentação do alvo, e o desenvolvimento do cultivo. Porém, muitas vezes o que se leva em conta são os gastos de volumes de aplicação e a capacidade operacional, relevando o aspecto principal que é a correta colocação dos produtos nos alvos.

Exemplos de deriva em aplicações de produtos fitossanitários em lavouras de grãos e frutas
Exemplos de deriva em aplicações de produtos fitossanitários em lavouras de grãos e frutas

Nesse sentido há um desejo natural de obter eficiência no tratamento com o menor custo. Isso é justificável, e as aplicações realizadas podem ter baixo custo, mas a eficiência sem boa técnica nem sempre é alcançada. Esta dualidade entre desejo e necessidade, por si, requer uma análise que resulte no equilíbrio técnico entre eles. Esta análise considera alguns fatores e elementos, os quais observaremos a seguir.

ESCOLHA DO PULVERIZADOR

Muitos agricultores escolhem os seus equipamentos por tradição. Essa tradição surge por fatores emocionais ou por especialidades em um nicho. De toda forma, os diferentes fabricantes de equipamentos buscam a fidelidade de seus clientes destacando cores e formatos que nem sempre distinguem qualidade e tecnologia.

Independentemente da marca, a seleção de um equipamento não precisa considerar especificamente o seu tamanho, cor ou preço. É adequado que se considere, no entanto, a robustez desde o conceito do projeto até o atendimento pós-venda. Lembre-se de que o pulverizador é adquirido para pulverizar e não deve passar boa parte do tempo parado por avaria. Por outro lado, capacidade ociosa significa que o investimento foi superdimensionado, o que pode ser traduzido em desperdício de recursos.

Neste caso, é muito importante ponderar o tamanho e a quantidade de pulverizadores frente à necessidade de tratamentos e demandas na propriedade. Estes cálculos são razoavelmente simples e resultam numa boa economia de dinheiro, tanto na aquisição quanto na manutenção e no uso dos equipamentos.

COMO USAR O PULVERIZADOR

Definir, portanto, a janela de utilização dos pulverizadores de maneira técnica requer alguma capacidade de gestão. Responder perguntas simples, tais como qual o tamanho da área a tratar, quantos dias são disponíveis devido ao clima e ao período crítico de ação, qual a taxa de parada para calibrações e manutenções (preventivas e corretivas), colabora para o planejamento.

O estabelecimento de um fluxograma de dimensionamento para a tomada de decisão de aquisição de um equipamento é matéria constante no currículo dos profissionais de Engenharia Agronômica.

PROCEDIMENTOS OPERACIONAIS

Já os procedimentos operacionais de preparo de caldas, ou da aplicação propriamente dita, configuram uma atividade em constante atualização. O dinamismo vai da legislação até a disponibilidade de novas formulações. Desde outubro de 2018, por exemplo, a mistura de produtos nos tanques dos pulverizadores é permitida em receituário agronômico, sendo “de competência e responsabilidade do engenheiro agrônomo a interpretação das recomendações oficiais, visando a elaboração da receita agronômica em consonância com as boas práticas agrícolas e com as informações científicas disponíveis” (IN SDA n. 40, 11/10 2018, Art. 3º). Para estes aspectos, os profissionais responsáveis devem se manter atentos às leis, aos novos produtos disponibilizados e à sua compatibilidade. Neste particular, há um bom número de reuniões científicas no País, onde as inovações são apresentadas, com complementos em publicações de natureza diversa.

Detalhe de restos de produto dentro dos filtros
Detalhe de restos de produto dentro dos filtros

Manômetro com problemas por falta de manutenção
Manômetro com problemas por falta de manutenção

Os procedimentos para a configuração ou regulagem e para a calibração dos pulverizadores, também são bastante conhecidos nos meios acadêmicos. Mas este conhecimento não encontra a capilaridade suficiente para atingir a todo o setor produtivo. O resultado disto é uma casuística intensa de ocorrências, desde o entupimento de filtros e pontas de pulverização até graves relatos de deriva. Há trabalhos que atestam perdas que podem variar de 20% a mais de 50% nas aplicações, decorrentes de práticas inadequadas na aplicação. Essas perdas afetam diretamente o bolso dos agricultores que investem alto para obter um resultado, e uma boa parte deste investimento não produz o efeito esperado. Considerando o percentual de 20% de perdas, o prejuízo direto em produtos seria atualmente em torno de US$ 2 bilhões anuais no Brasil. Além disso, há as perdas indiretas relativas aos prejuízos em cultivos adjacentes e a eventuais indenizações e contaminações ambientais com riscos de intoxicação humana.

Adequações nos projetos e componentes dos pulverizadores, no de preparo e agitação das caldas, no uso dos adjuvantes, na seleção e instalação das pontas de pulverização, na pressurização da calda, na altura das barras, nos programas de manutenção dos equipamentos e na habilitação dos operadores podem colaborar para a diminuição das perdas.

A necessidade de elaboração de procedimentos e normativas que orientem as atividades nacionalmente é evidente. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) tem envidado esforços neste sentido. Há também projetos de extensão e consultoria que levam conhecimentos aos agricultores.

Porém, ainda há demanda nacional por um trabalho coordenado destas atividades, como já existe em outros países, ao qual esperamos que a efetivação ocorra em breve, para que a agricultura que já é forte e emblemática no Brasil se torne ainda mais econômica e segura.

Marcelo da Costa Ferreira, NEDTA/Unesp

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