Como realizar o manejo eficaz de pragas e doenças no tomateiro

Controle biológico pode oferecer bons resultados em sinergia com medidas de estímulo às defesas naturais, ao favorecimento do metabolismo e à imunidade das plantas

21.09.2020 | 20:59 (UTC -3)
Cultivar Hortaliças e Frutas

O tomateiro (Solanum lycopersicum L.) é espécie vegetal pertencente à família das solanáceas. Originário de países andinos da América do Sul, é cultivado mundialmente para atender elevada demanda da população para consumo dos frutos in natura, assim como processado para molhos e ketchups. Estimam-se área global de 4,7 milhões de hectares com produção mundial anual de 159 milhões de toneladas, com China, Índia, EUA e Costa Mediterrânea os principais produtores. O Brasil ocupa a 9ª colocação entre os principais países produtores do mundo, com área cultivada anualmente de aproximadamente 65 mil hectares com produção de 4,3 milhões de toneladas.

É um cultivo intensivo que exige elevada tecnologia e inputs de insumos agrícolas e que resulta em elevadas produtividades. No Brasil, a maior parte da produção é proveniente de cultivo em campo ao ar livre, mas o cultivo em ambiente protegido tem aumentado ao longo do tempo por garantir produção de tomates em locais e épocas adversas ao cultivo, o que possibilita oferta em entressafra. Os maiores estados produtores são Goiás, São Paulo, Minas Gerais e Bahia, porém a cultura tem relevância econômica na maioria dos estados brasileiros.

 Para processamento utiliza-se tomateiro de hábito determinado com crescimento rasteiro e geralmente cultivado em maiores áreas de forma extensiva. Para consumo in natura, o tomateiro de hábito indeterminado conduzido por estaqueamento na vertical é o mais cultivado, embora alguns produtores optem pelo cultivo de tomateiro de crescimento determinado (rasteiro) para produção de frutos para consumo in natura. No entanto, as pragas e doenças que atacam a cultura tanto para processamento quanto para in natura são praticamente as mesmas, independentemente da modalidade de cultivo.

Os patógenos que atacam o tomateiro vão desde fungos, bactérias e nematoides de solo que penetram na planta pela raiz, até doenças da parte aérea, fungos e bactérias que atacam folhas e frutos.

O trichogramma (Trichogramma pretiosum), parasitoide de mari-posas, tem forte ação no controle de traça e broca pequena dos frutos
O trichogramma (Trichogramma pretiosum), parasitoide de mari-posas, tem forte ação no controle de traça e broca pequena dos frutos

Patógenos do solo

Dentre os mais problemáticos estão os fungos de solo do gênero Fusarium, principalmente Fusarium oxysporum raças 1, 2 e 3, e do gênero Verticillium e a bactéria Ralstonia solanacearum, patógenos que causam problemas de murcha da parte aérea do tomateiro por atacarem o sistema vascular da planta. No entanto, é pelo trato com o solo que se inicia todo processo de controle biológico integrado de pragas e doenças do tomateiro. Um solo com elevada dinâmica biológica e equilíbrio químico e físico é mola propulsora para o sucesso de um cultivo saudável e produtivo. Entender que realmente o solo é um organismo vivo e que responde muito aos tratos que privilegiam os organismos nele presentes é o principal ponto de partida para o sucesso de produção baseada no controle biológico.

Nesse contexto a rotação de culturas com plantas de cobertura como crotalárias, mucunas, milheto, aveia e tremoço é um princípio extremamente desejado para elevar a atividade biológica do solo e suprimir a ação dos organismos patogênicos indesejados, fato proporcionado pelo aumento da matéria orgânica e atividade de exsudação de biomoléculas pelo sistema radicular, o que proporciona forte interação rizosférica com micro-organismos do solo. A Crotalaria spectabilis, por exemplo, tem elevada eficiência em reduzir a população de nematoides do solo por aprisionar a fêmea nas raízes e consequentemente reduzir a proliferação. Gramíneas como aveia e milheto suprimem a ação do Fusarium. O tremoço solubiliza fósforo adsorvido nos coloides do solo para micro-organismos e plantas, fato que eleva a atividade biológica. Assim, para cada caso específico existem possibilidades de plantas de cobertura para rotacionar com o tomateiro e assim alcançar resultados agronômicos desejados com estímulo à atividade biológica do solo e redução de insumos agrícolas. Solo biologicamente fértil é sinônimo de plantas e vidas terrestres saudáveis.

A aplicação da biotecnologia na agricultura está cada vez mais evidente nos tempos atuais. Como exemplo de grande eficiência no controle biológico no caso de nematoides, que é um problema sério na cultura do tomate, há os fungos Trichoderma harzianum, Paecilomyces lilacinus que parasitam ovos e fêmeas. Esses fungos têm enorme potencial para controle de nematoides e fungos patogênicos por ação de competição, antibiose, parasitismo e indução de resistência da planta, o que os classifica com elevado grau de eficiência de controle biológico. Esses fungos devem ser aplicados nas mudas antes do transplantio e posteriormente aspergidos no solo ou injetados na água de irrigação para atingirem o alvo. Ressalta-se que a conservação de palha no solo é desejada para que se eleve o grau de eficiência de ação de controle desses agentes biológicos.

Bacillus subtilis e Bacillus sp. são bactérias indutoras de resistência sistêmica de doenças em plantas. Para a cultura do tomateiro essas bactérias têm demonstrado eficiência de supressão sobre Fusarium sp e Ralstonia solanacearum. Recomendam-se aplicações desses micro-organismos nas mudas antes do transplantio e direcionadas ao solo via pulverização ou injetados na água de irrigação e também aspergidos nas folhas. Há indícios de que Bacillus subtilis tem ação de controle sobre doenças foliares como pinta-preta (Alternaria solani) e mancha-bacteriana (Xanthomonas campestris pv. vesicatoria). 

A enxertia com porta-enxerto resistente a patógenos de solo como a murcha-bacteriana (Ralstonia solanacerum) tem elevada eficiência de tolerância a essas doenças. No entanto, em áreas contaminadas por esses patógenos recomenda-se a enxertia como manejo cultural.  

Doenças da parte aérea do tomateiro

Viroses

Na fase de crescimento inicial, até aproximadamente 45 dias a 50 dias após o transplantio das mudas, o tomateiro é bastante sensível a viroses, principalmente vírus do vira cabeça e geminivírus, que são transmitidos por insetos vetores, no caso o tripes (Fraklinilla shultzei) transmissor do vira cabeça e a mosca-branca (Bemisia tabaci) transmissora do geminivírus. No mercado de sementes de tomate existem diversas opções de híbridos que possuem tolerância a essas viroses, entretanto sempre há constatações de incidência dessas enfermidades em cultivos comerciais e até em elevada porcentagem, dependendo das condições de cultivo. Alguns outros vírus de “menor importância” na cultura do tomateiro, como o Vírus do Mosaico do Tomateiro e o Vírus do Mosaico do Tabaco, também podem vir a ocorrer principalmente em variedades suscetíveis. Esses vírus são transmitidos pelo pulgão, inseto que é controlado pelo mesmo tratamento biológico de combate ao tripes.

No entanto, o controle desses insetos é fundamental para evitar infecção das plantas em elevado grau no cultivo do tomateiro. Para o controle biológico de tripes, pulgão e da mosca-branca, os fungos entomopatogênicos Metharizium anisopleae e Beauveria bassiana têm apresentado bom desempenho de controle desses insetos transmissores de viroses. A recomendação para o tratamento é a aplicação semanal desde o transplantio até o final do ciclo de cultivo, pois esses fungos também terão ação efetiva sobre pragas que atacam o tomateiro no médio e final de ciclo. Uma observação bastante importante com relação à aplicação dos fungos, é que devem ser realizadas as aplicações sempre no final da tarde para que se evite a ação dos raios ultravioleta que são letais a esses organismos.

Para mosca-branca, produto à base de limoleno tem boa ação de combate ao controle por desintegrar a proteção quitiniosa protetora do inseto e expor a ação de inimigos naturais e fungos entomopatogênicos como a Beauveria bassiana.

O manejo cultural de “roguing”, que é a erradicação das plantas infectadas, é significativo para reduzir a disseminação da virose na lavoura do tomateiro. O “roguing” deve ser realizado regularmente, pelo menos semanalmente, e aumentar a frequência sempre que a incidência de virose for elevada.             

Fungos e bactérias

O tomateiro é uma cultura que sofre forte pressão de patógenos com ação foliar. Entre as principais doenças fúngicas foliares presentes no Brasil estão pinta-preta (Alternaria solani), requeima (Phytophtora infestans), septoriose (Septoria lycopersici) e mancha-de-estenfilio (Stemphylium solani e S. lycopersici). Com relação às doenças foliares bacterianas, as mais expressivas no Brasil são a mancha-bacteriana e a pinta-bacteriana. A oferta de híbridos tolerantes a essas doenças ainda é baixa no mercado de sementes. 

No manejo integrado para essas doenças, parte-se do princípio de nutrição equilibrada da planta para que o cultivo esteja bem preparado para fortalecer sua defesa natural e o metabolismo de imunidade. Por isso é importante que a fertilidade química, física e biológica do solo esteja fortalecida, para que o sistema imunológico das plantas se encontre preparado para enfrentar esses agentes bióticos. Partindo do princípio básico de fertilidade do solo recomendam-se alguns tratamentos biológicos que proporcionarão resultados significativos no combate às moléstias. Já é de conhecimento público que o fungo Beauveria basiana tem ação endofítica e sistêmica nas plantas e que dessa forma estimula o sistema imunológico das plantas contra fitopatógenos. Então, aplicações desse fungo ao longo do ciclo de cultivo do tomateiro, além de controle de insetos auxiliará no combate a doenças causadas por fungos e bactérias pelo estímulo natural do sistema imunológico da planta.

Óleos essenciais e extratos de plantas são elementos com elevado potencial de controle de doenças do tomateiro, embora não sejam organismos biológicos, são fontes naturais para serem utilizados como método de controle natural de pragas e doenças do tomateiro. Óleo de melaleuca (Melaleuca alternifolia), por exemplo, tem forte potencial no combate a fungos e bactérias foliares, sendo que já existe produto disponível no mercado nacional registrado para cultura do tomateiro. Óleos essenciais de capim-limão reduzem significativamente a incidência de pinta-preta no tomateiro.  Nessa linha, óleos essenciais e extratos de plantas são muito promissores no combate a doenças e pragas de plantas. Óleo de Neem (Azadirachta indica A. Juss) extraído das folhas e sementes da planta é efetivo no controle de insetos em geral, podendo ser usado no cultivo do tomateiro.

Pragas do tomateiro

Crescimento inicial

O complexo de pragas que atacam o tomateiro inicia-se com as pragas inerentes ao começo do ciclo de cultivo que são os primeiros 30 dias após o transplantio das mudas. As principais pragas dessa etapa são tripes, pulgão, mosca-branca, que são insetos transmissores de virose, e alguma lagarta de solo que eventualmente possa causar dano às mudas, reduzindo o estande de plantas. Então, o tratamento com os fungos Metharrizium anisopleae e Beauveria bassiana e a bactéria Bacillus thurigiensis são eficientes no controle. Recomendam-se aplicações direcionadas ao solo e à planta.

Crescimento médio e final de ciclo (folhas e frutos)

Insetos da família Lepdopteras, mariposas com hábito crepuscular e noturno, são importantes pragas do tomateiro e atacam órgãos vegetativos e frutíferos. A larva minadora das folhas (Liriomyza huidobrensis) cresce no interior das folhas entre a epiderme adaxial (face superior) e epiderme abaxial (face inferior) formando galerias que destroem o limbo foliar causando perda de área fotossintética e abertura para entrada de patógenos. A traça do tomateiro (Tuta absoluta) destrói meristemas apicais vegetativos, além de frutos em crescimento inicial causando danos diretos no crescimento da planta e destruição dos frutos. A broca pequena do fruto do tomateiro (Neoleucinodes elegantalis) ataca internamente os frutos pela ação da larva do inseto; a postura dos ovos é feita nas pétalas das flores e dos frutos no início de crescimento, dias após a fecundação da flor. Os ovos eclodem e a larva penetra no fruto jovem, se alimentado da polpa durante o crescimento de ambos, lagarta e fruto. Os frutos crescem e dias antes do ponto de colheita as larvas o deixam, causando furos completamente comprometedores dos frutos, inviabilizando-os para o comércio.   

O tratamento com os fungos Metharizium anisopleae e Beauveria bassiana e a bactéria Bacillus thurigiensis, que já vinham sendo aplicados nas primeiras fases do cultivo do tomateiro, é o mesmo recomendado para o controle das mariposas principalmente após o florescimento, com mesma frequência e dosagem de aplicação. Recomendam-se aplicações direcionadas às flores, aos frutos e à folhagem da planta sempre no período crepuscular do dia.

O Trichogramma (Trichogramma pretiosum), parasitoide de mariposas, tem forte ação no controle da traça e broca pequena dos frutos. Após o florescimento, iniciam-se solturas do parasitoide para que o inseto ovoposite seus ovos em ovos das mariposas localizados em folhas e frutos do tomateiro. Assim, ao eclodirem, os ovos do T. pretiosum no interior dos ovos das mariposas os levarão à destruição, interrompendo o ciclo das mariposas, reduzindo a população da praga. Dessa forma, ocorre o controle biológico das lagartas pragas do tomateiro com elevada eficiência. Recomenda-se a soltura com frequência semanal, sempre em horários mais frescos do dia.

Homeopatia

A homeopatia, embora não seja agente biológico para controle de pragas e doenças de plantas, tem sido amplamente utilizada em cultivos biológicos do tomateiro, por se tratar de processo natural, atuando em princípios quânticos energéticos e que tem tido bastante sucesso quando utilizado corretamente.

 Beauveria bassiana tem apresentado bom desempenho de controle de insetos transmissores de viroses
Beauveria bassiana tem apresentado bom desempenho de controle de insetos transmissores de viroses

Considerações finais

De fato o controle biológico com fungos e bactérias para pragas e doenças do tomateiro é uma realidade com significativo grau de eficiência, desde que medidas ambientais sejam levadas em consideração, como Agricultura Conservacionista, que tem como princípios o revolvimento mínimo do solo ou plantio direto, a rotação de culturas e a manutenção permanente de cobertura vegetal na superfície do solo para conservação do solo e da água e a preservação da vegetação nativa da propriedade dentro das leis ambientais vigentes. No entanto, não existe produto milagroso para combate a pragas e doenças do tomateiro, quer seja de natureza biológica ou química. Mas da soma de fatores de entendimento da paisagem e estímulo da vida no agroecossitema é que se chegará ao sucesso de produção biológica do tomateiro. As utilizações de todo e qualquer produto devem ser precedidas por recomendação técnica, elaboradas por profissional da área.

Roberto Botelho Ferraz Branco, Ag. Paulista de Tecn. dos Agronegócios – Instituto Agronômico (Apta - IAC – Centro de Horticultura)

Cultivar Hortaliças e Frutas Setembro 2020

A cada nova edição, a Cultivar Hortaliças e Frutas divulga uma série de conteúdos técnicos produzidos por pesquisadores renomados de todo o Brasil, que abordam as principais dificuldades e desafios encontrados no campo pelos produtores rurais. Através de pesquisas focadas no controle das principais pragas e doenças do cultivo de hortaliças e frutas, a Revista auxilia o agricultor na busca por soluções de manejo que incrementem sua rentabilidade. 

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