Estimativas apontam projeção de crescimento para cultura do trigo em todo o Brasil

Áreas indicadas para o cultivo de trigo no Brasil são o Centro-oeste, Sudeste e Sul, além da região de Cerrado na Bahia; rentabilidade do produtor superou os 30% na última safra

01.04.2021 | 20:59 (UTC -3)
Embrapa

A rentabilidade na triticultura chegou a 34% na safra 2020/21, segundo a Conab. A alta no preço das commodities é o principal incentivo ao produtor, indicando aumento de área de cultivo de trigo em todo o Brasil.

As áreas indicadas para o cultivo de trigo no Brasil são o Centro-oeste, Sudeste e Sul, além da região de Cerrado na Bahia. Em praticamente todas as regiões é esperado um aumento na área de cultivo, com estimativas de produtividades um pouco menores, considerando possíveis intempéries climáticas que podem surgir ao longo da safra.

Centro-oeste

No Centro-oeste o destaque é Goiás, onde é esperado um crescimento entre 120% a 200%, triplicando a área de cultivo que deverá ficar próxima a 70 mil hectares (ha). “As perspectivas são boas. O atraso na colheita da soja na região e os preços em alta deverão favorecer o aumento da área com trigo, especialmente em sequeiro. Contudo, existe a pressão do milho e do sorgo, também com mercado aquecido”, explica o pesquisador da Embrapa Trigo Jorge Chagas.

De acordo com o pesquisador Vanoli Fronza, da Embrapa Trigo, a principal limitação do trigo de sequeiro na região de GO e DF é o maior risco de ocorrência de brusone nas espigas. “O aumento de área pode estar relacionado, também, a disponibilidade de cultivares mais resistentes à doença que estão chegando no mercado”, afirma o pesquisador, lembrando que, na última safra, o clima colaborou com o trigo e as lavouras não sofreram com brusone, motivando o produtor a investir na cultura novamente.

As operações de semeadura do trigo de sequeiro em GO e DF estiveram concentradas em meados de março, favorecidas pela boa umidade do solo. Como as chuvas cessaram na segunda quinzena do mês, muitos produtores podem acabar desistindo de implantar a cultura do trigo.  No cultivo irrigado, a semeadura deverá ocorrer entre 10 de abril e 30 de maio, seguindo o zoneamento agrícola. Conforme o pesquisador da Embrapa Cerrados, Júlio Albrecht, mesmo com a concorrência com o cultivo de milho para produção de semente e hortaliças nos pivôs, há expectativa de pequeno acréscimo na área, especialmente em GO, onde tradicionalmente o cultivo de trigo irrigado é utilizado como rotação de culturas, principalmente para interromper o ciclo de algumas doenças de solo. A previsão é totalizar 2,6 mil ha com trigo no DF.

A concorrência com o milho e o sorgo deverá se repetir também no MS, com previsão de repetir a área do ano passado com 32 mil ha; e no MT, onde a expectativa é de retomada no cultivo do trigo.

Sudeste

Em Minas Gerais, tanto a área quanto o volume de produção de trigo mostraram um crescimento constante desde o início dos anos 2000, passando de 58 mil toneladas em 2006 para quase 300 mil t. em 2020, segundo dados do IBGE. Ainda assim, o volume atende apenas cerca de 30% da demanda do Estado.

O subsecretário de Política e Economia Agropecuária da Seapa-MG, João Ricardo Albanez, acredita que, apesar da demanda, o trigo mineiro chegou a um momento de estagnação: “É preciso considerar que a indústria montou uma estrutura pronta para importar trigo. Agora precisamos juntos - governo, indústria e produtores - nos prepararmos para movimentar a nossa produção, considerando logística e armazenagem, a concentração nas épocas de plantio e colheita, oferta de insumos, valorização das diferenças qualitativas e quantitativas de cada região de origem do trigo. Nós já temos tecnologia para produzir trigo, mas falta organizar melhor o fluxo de destino da produção que proporcione maior segurança ao produtor”, conclui Albanez.

As projeções de área com trigo em MG ainda são bastante variáveis. A Conab estima a repetição da área da safra anterior, próxima a 86 mil ha; no levantamento do IBGE, são 95 mil ha; e informações junto ao setor sementeiro apontam que podem ser cultivados mais de 100 mil ha com trigo nesta safra. “O atraso na colheita da soja também pode impactar o trigo. Muitos produtores estavam com os insumos prontos para cultivo do milho quando viram fechar a janela de plantio”, avalia o pesquisador da Embrapa Trigo, Joaquim Soares Sobrinho lembrando que, diante desta situação, existe a possibilidade dos produtores optarem pelo trigo: “Ainda é muito cedo para qualquer número, mas sabemos que nas regiões de Vertentes, Sul/Sudoeste e Oeste de Minas Gerais não dá mais para arriscar na semeadura do milho, enquanto o trigo de sequeiro pode ser semeado até 10 de abril sem grandes riscos à produção”.

Em São Paulo, a Câmara Setorial do Trigo projeta um aumento entre 10 a 15% na área de cultivo. A meta é chegar à produção de 300 mil t, um volume pouco acima das 270 mil t de 2020. As operações de semeadura do trigo, com predominância do sistema de cultivo irrigado, se concentram nos meses de abril e maio.

Região Sul

No Paraná, o Deral divulgou o custo de produção de trigo. Conforme oBoletim Semanal, os custos variáveis tiveram incremento de 25% em relação a fevereiro de 2020, chegando a R$ 57,11 por saca. O principal item responsável pela variação foi a adubação, pois os fertilizantes inflacionaram 44%; também as sementes tiveram um incremento importante, de 36%. Na análise do engenheiro agrônomo do Deral, Carlos Hugo Godinho, “os produtores que conseguirem travar esta relação de preços e custos têm a possibilidade de uma lucratividade acima de 49%, que é a estimativa quando comparamos os custos variáveis, ou seja, o desembolso do produtor e os preços recebidos”. Ele lembra que este patamar foi observado pela última vez em 2013, quando o trigo se valorizou apoiado em uma grande quebra de safra paranaense. Quanto a estimativa de área, o aumento não deverá superar 2% em relação ao ano anterior, ficando próximo a 1,14 milhão de ha. “No Sul do Estado, o trigo deverá substituir a aveia com crescimento de área na região. No Oeste, também é esperado um crescimento, já que os produtores perderam a janela de plantio do milho em função do atraso na colheita da soja. Por outro lado, nas demais regiões, especialmente no Norte, haverá um recuo na área de trigo em função da rentabilidade projetada para o milho”, conclui o analista do Deral.

No Rio Grande do Sul os ganhos com a última safra não foram uniformes em todas as regiões produtoras. Intempéries climáticas dividiram o Estado, com perdas em geral estimadas em 30% no trigo. “O Rio Grande do Sul sofreu com geadas e déficit hídrico durante a safra, o que comprometeu o rendimento, afetando a rentabilidade do produtor de forma geral”, afirma Hamilton Jardim, da Comissão de Trigo da Farsul. Segundo ele, algumas regiões sofreram mais com um fenômeno, como a geada no espigamento no Noroeste ou a distribuição irregular das chuvas no Planalto, enquanto outras regiões tiveram recordes de produtividade. “Não podemos falar em números quanto à rentabilidade da safra de trigo porque um resultado positivo numa área maior de cultivo pode mascarar as perdas numa centena de pequenos e médios produtores”, esclarece Jardim.

Contudo, para o Presidente da Fecoagro/RS Paulo Pires, a grande surpresa da safra 2020 foi o aumento de 15% no valor pago pelo trigo. “Como o RS é o último a colher, sempre ficamos com uma valorização menor na venda dos grãos, mas, nesta safra, apesar dos problemas com o clima em algumas regiões, de forma geral a qualidade dos grãos foi muito boa e rapidamente absorvida no mercado”. O levantamento da Rede Técnica Cooperativa (RTC) indica um aumento de 10% na área de trigo no RS, mesmo com um aumento de 21,77% nos custos de produção. “Vamos retomar a meta de chegar aos 3 milhões de hectares com trigo no RS com crescimento gradual nos próximos cinco anos”, conclui Pires.

Em Santa Catarina a área de cultivo cresceu 15% na última safra. Contudo, o trigo sofreu com geadas localizadas e uma estiagem prolongada que comprometeram o resultado da safra, resultando em uma produtividade média 4% inferior à obtida na safra anterior. De acordo com o analista de socioeconomia da Epagri/Cepa João Rogério Alves, é esperado um aumento de até 10% na área de cultivo, principalmente nas regiões do Planalto Sul e Oeste de SC. “Vejo que os produtores estão mais dispostos a investir no trigo nesta safra com avanço, principalmente, em áreas tradicionais que utilizam cobertura de inverno após a colheita da soja”, avalia Alves. A área de trigo prevista para SC em 2021 deverá ficar próxima de 64 mil ha, mas a meta do Governo do Estado é atingir 120 mil ha nos próximos anos.

As operações de semeadura do trigo iniciam no mês de abril e se estendem até julho na Região Sul.

Mercado

Atualmente, o preço mínimo do trigo estabelecido pelo Governo Federal é de R$ 43,39 a saca de 60 kg de grãos tipo 1. Mesmo com o aumento de 11% no preço mínimo previsto para vigorar a partir de agosto de 2021, chegando a R$ 48,02 o mercado tem praticado preços bem acima disso, próximo a R$ 80,00/sc.

Conforme avaliação da analista de mercado de trigo da Conab, Flávia Soares, a rentabilidade sobre o preço de venda do trigo no Brasil chegou a 34% na safra 2020/21. “O produtor está otimista com um cenário em alta que deverá se manter este ano, com o dólar pouco atrativo para as importações de trigo e favorecendo as exportações”, conta Flávia. A safra deverá fechar o ano com quase 900 mil toneladas de trigo, especialmente gaúcho, exportadas até julho de 2021.

A previsão é de queda também nas importações de trigo em 2021, que deve chegar a 6,6 milhões de toneladas, volume 100 mil toneladas menor do que no ano anterior. “O volume de moagem brasileira de trigo reduziu 30% nos primeiros três meses de 2021. Fontes da indústria apontam queda no consumo de massas e biscoitos industrializados, o que mostra que a pandemia favoreceu a elaboração de alimentos em casa, já que não foi verificada queda na venda de farinha de trigo”, explica a analista.

Com relação aos preços, no mercado internacional já pode ser observada desvalorização das cotações, diante de um cenário de clima favorável nos EUA, Ucrânia e Rússia, mediante a possibilidade de aumento da oferta mundial. Além disso, observou-se também falta de interesse de compras em alguns importantes exportadores mundiais como Canadá e EUA.

Na avaliação semanal da Conab (22 a 26/03), a desvalorização do trigo no mercado internacional foi de 3,41% a menor desde o início de 2021.

Investindo com segurança

De modo geral, com base nas observações das fontes entrevistadas, o ano de 2021 deverá seguir afetado pelas instabilidades associadas à pandemia. Oscilações tanto nos preços quanto no consumo de trigo deverão se estender ao longo do ano. A orientação da Embrapa Trigo neste cenário de incertezas, especialmente ao produtor, é cautela no investimento: “Sabemos que o produtor está capitalizado, com bom retorno financeiro tanto da safra de verão quanto de inverno. Mas é preciso avaliar com cautela o valor que será investido na lavoura de trigo para garantir retorno na colheita”, alerta o Chefe-Geral da Embrapa Trigo Osvaldo Vieira. Segundo ele, a alta nos insumos pode superar a cotação dos grãos, principalmente se houver clima desfavorável: “Mais incerto do que o mercado é o clima. Um inverno chuvoso pode aumentar o gasto com fungicidas, bem como um clima seco implica maior incidência de pragas. Isso sem falar em giberela, geada, chuva na colheita. Certamente haverá mercado para o produto brasileiro, mas o trigo é uma cultura de risco, por isso a Embrapa insiste na orientação para reduzir custos na lavoura, desde a implantação, passando pelo manejo até a colheita”. Para o melhor resultado, explica Vieira, são indispensáveis práticas como investir em sementes de qualidade, com ajustes no volume de sementes por área; monitoramento da lavoura para otimizar o uso de defensivos; uso de fertilizantes com base em análise de solo; adubação de sistema para agilizar a implantação da lavoura de verão; além de assistência técnica de qualidade. “As previsões otimistas só se concretizam em uma boa safra se houver geração de renda na triticultura e esse resultado começa agora no planejamento da lavoura”, conclui Osvaldo Vieira.

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