Estudo testa ferramentas de monitoramento de práticas conservacionistas

Três tecnologias foram testadas e se provaram eficazes para monitorar a implantação dessas ações

23.04.2019 | 20:59 (UTC -3)
Marcos Vicente

Três tecnologias que acompanham práticas conservacionistas são eficazes para monitorar a implantação dessas ações na agropecuária. Foi o que atestou o engenheiro agrônomo Francisco Chagas da Silva em sua dissertação de mestrado na Escola de Economia de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas (EESP/FGV). O trabalho mostrou que o aplicativo AgroTag, o protocolo GHG e o Sistema de Análise Temporal da Vegetação (SATVeg) são ferramentas úteis para monitoramento e qualificação de práticas do Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Plano ABC), do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

Silva avaliou o uso das três tecnologias de monitoramento, relato e verificação (MRV) no acompanhamento físico-financeiro de contratos do Plano ABC para a recuperação de pastagens. O AgroTag e o SATVeg são produtos da Embrapa e o protocolo GHG é um método norte-americano.

A averiguação da conformidade desses contratos é importante porque o Plano ABC oferece linhas de crédito subsidiadas a produtores que se comprometerem a adotar ações de mitigação de gases de efeito estufa (GEE) em suas propriedades. Saber se o produtor adotou as práticas adequadamente e se elas resultaram em redução de emissões envolve o acompanhamento de milhares de propriedades e cálculos complexos com diversas variáveis. Por isso, o uso de ferramentas MRV, que forneçam dados confiáveis e acompanhem o cronograma de adoção, é fundamental para o sucesso do Plano.

Por essa razão, o estudo também verificou o índice de redução da emissão de GEEs e analisou se os créditos concedidos foram aplicados adequadamente nas finalidades previstas no projeto, verificando o custo, o benefício e o possível uso dessas ferramentas no acompanhamento em escala dos financiamentos.

Baratear a fiscalização

O uso de ferramentas MRV vai ajudar a resolver um dos principais gargalos do sistema financiador do Plano ABC, que é a necessidade de facilitar e baratear a fiscalização dos contratos, verificando a correta aplicação dos recursos.

O monitoramento dos financiamentos é oneroso. As longas distâncias das propriedades, necessidade de monitoramento por agentes especializados, visitas de fiscalização e monitoramento são custos que podem ser diluídos na economia de escala por meio do uso de aplicativos e ferramentas de georreferencimento.

A efetividade de todo o processo deverá auxiliar também na valorização da imagem do banco, atrelada ao financiamento sustentável da pecuária de baixo carbono produzida pelos clientes.

Baratear a fiscalização

O uso de ferramentas MRV vai ajudar a resolver um dos principais gargalos do sistema financiador do Plano ABC, que é a necessidade de facilitar e baratear a fiscalização dos contratos, verificando a correta aplicação dos recursos.

O monitoramento dos financiamentos é oneroso. As longas distâncias das propriedades, necessidade de monitoramento por agentes especializados, visitas de fiscalização e monitoramento são custos que podem ser diluídos na economia de escala por meio do uso de aplicativos e ferramentas de georreferencimento.

A efetividade de todo o processo deverá auxiliar também na valorização da imagem do banco, atrelada ao financiamento sustentável da pecuária de baixo carbono produzida pelos clientes.

Para o estudo, foram considerados os dados primários e secundários da fazenda Trevo II, a partir da análise de contratos do Banco do Brasil firmados com a propriedade agrícola do município de Açailândia, no Maranhão, beneficiária do Plano ABC para recuperação de pastagem.

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Para o orientador da dissertação, Eduardo Assad, pesquisador da Embrapa Informática Agropecuária (SP), os resultados demonstram a viabilidade dessas ferramentas para medir variáveis complexas do processo produtivo e as emissões de gases de efeito estufa ligadas à pecuária. Ele lembra que desde o início do ano de 2013 até o fim de 2018, a linha de crédito alcançou mais de 34 mil contratos, com mais de R$ 17 bilhões de financiamento, incorporando mais de 9,1 milhões de hectares com práticas de produção sustentáveis.

“Se analisarmos o alcance dessas ações, juntamente com a necessidade de aferição das variáveis desses sistemas produtivos conservacionistas, verificaremos que as instituições financeiras deveriam apoiar essas iniciativas com viés de sustentabilidade de forma mais estruturada, incorporando essas ferramentas de monitoramento ao seu processo de acompanhamento e fiscalização dos financiamentos agrícolas. Aliás, como é previsto no próprio Plano ABC”, declara.

Unidades produtivas que implementaram tecnologias de agricultura de baixo carbono do Plano ABC geralmente verificam benefícios econômicos por meio do ganho de produtividade. O pesquisador da Embrapa sugere que os operadores financeiros de crédito se apropriem dessa informação e digam aos produtores que o sistema é um grande gerador de ativos, pois não se restringe somente à pauta ambiental, mas também à pauta econômica. “São agendas sinérgicas que podem ser resumidas na mensagem ‘seja sustentável e ganhe dinheiro’”, afirma Assad.

Conforme ressalta o autor do estudo, a utilização dessas ferramentas pelas instituições financeiras para o crédito rural não resultaria em custo adicional, pois já existem ferramentas e aplicativos de MRV consolidados para essa finalidade, disponibilizados de forma gratuita. Silva acredita que nos cenários de médio e longo prazos, ferramentas de MRV serão adotadas em larga escala, pois em um mercado competitivo, baratear os custos de transação, atribuir agilidade e transparência ao processo de crédito rural será vital para a sobrevivência no setor.

“Aliado a isso, as instituições financeiras podem utilizar essas ferramentas para contabilizar o sequestro de CO2 por suas operações de crédito agropecuário e com isso melhorar a sua reputação com clientes e acionistas, além de criar valor para a empresa. Ter a imagem atrelada ao financiamento sustentável, como a ideia da carne carbono zero dos clientes financiados pela instituição, pode trazer uma reputação positiva à imagem da instituição”, relata o autor.

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Outra conclusão da pesquisa é que os investimentos em sustentabilidade se refletem em lucros maiores. Resultados mostraram que pastagens degradadas suportam apenas um boi por hectare, com custo anual de R$ 323,00 e produtividade de 2,83 arrobas por hectare. Já pastos de boa qualidade permitem produtividade quase cinco vezes maior, com índice de 12,97 arrobas por hectare e redução de quase 60% no custo final, ou seja, R$ 131,00.

“Na prática, investir na produção sustentável pode trazer bons lucros ao pecuarista. Os números dizem que sustentabilidade dá dinheiro”, destaca Assad. “Os números robustos apresentados denotam que investimento em sustentabilidade é uma opção de lucratividade”, frisa.

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Embora o Brasil seja o segundo maior produtor de carne bovina do mundo e a produção brasileira esteja baseada em pastagens, vantagem competitiva do País, a degradação desses pastos ainda é um grande problema ambiental. Estima-se que o Brasil possui 167 milhões de hectares de pastagem, dos quais 71 milhões encontram-se em algum estágio de degradação. Dados de 2017 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que 37% das pastagens estão abaixo da capacidade de suporte.

Degradação das pastagens é um dos gargalos da pecuária de corte brasileira e está associada à emissão de GEEs. Pasto degradado produz pouca matéria verde, o que contribui para diminuir o sequestro de carbono no solo ou emitir mais gases de efeito estufa, reduzindo a lotação de animais por hectare e, consequentemente, aumentando o custo de produção.

Mas essa é uma realidade em franca mudança, conforme explica o pesquisador da Embrapa Meio Ambiente e coordenador técnico da Plataforma ABC, Celso Manzatto. “Os dados de um balanço recente, apresentados no fim de 2018 pelo governo brasileiro durante COP-24 na Polônia, mostram que o setor conseguiu reduzir entre 100 milhões e 154 milhões de toneladas de CO² equivalente no período compreendido entre 2010 e 2018 no âmbito do Plano ABC”, ressalta Manzatto.

Os dados consideram o sequestro de carbono auferidos com a recuperação de mais de dez milhões de hectares de pastagens degradadas, mais 5,83 milhões de hectares de áreas agregadas a sistemas integrados de lavoura-pecuária-floresta (ILPF), uso de plantio direto e de fixação biológica de nitrogênio, entre outras tecnologias de baixa emissão de carbono previstas no Plano ABC.

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A sustentabilidade da produção agropecuária está fortemente atrelada ao conceito de carne carbono neutro. Vinculada aos resultados dos usos das tecnologias dos sete programas do Plano ABC - Recuperação de Pastagens Degradadas, Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) e Sistemas Agroflorestais (SAFs), Sistema Plantio Direto, Fixação Biológica de Nitrogênio, Florestas Plantadas, Tratamento de dejetos Animais e Adaptação às Mudanças Climáticas -, é vital o emprego de ferramentas MRV que atestem a produção de carne carbono neutro.

Do ponto de vista da produção, o uso de ferramentas de MRV pode propiciar ao produtor entender melhor a dinâmica de emissões da propriedade e do seu processo produtivo, fato intimamente ligado à capacidade de identificação e proposição de ações de mitigação e do aumento da produtividade das pastagens e do seu rebanho.

 

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