Importância de investir na manutenção de máquinas agrícolas

Investir na manutenção e na operação é o caminho para uma vida longa do maquinário e sem surpresas de quebras

19.02.2021 | 20:59 (UTC -3)
Cultivar Máquinas

“Como pode? Tinha que quebrar justamente agora que estamos nesse atropelo danado?” É bem assim, as máquinas agrícolas quebram ou deixam de funcionar corretamente sempre no momento em que mais se necessita de seu uso: verdade? Sim, a mais pura verdade. E quem é do campo sabe muito disso. É importante destacar que a utilização do maquinário agrícola, na maior parte dos casos, é sazonal, havendo um período de parada. E por paradoxal que pareça, esse tempo parado é que acelera a deterioração de alguns componentes, fazendo com que no uso subsequente haja a ruptura ou o mau funcionamento. Claro que poderia ser aproveitado o período parado para fazer as revisões. Fato que às vezes ocorre, mas nem sempre.

MANUTENÇÃO E OPERAÇÃO

A ruptura de componentes ou o mau funcionamento de um conjunto mecânico está relacionada a vários fatores, mas podemos agrupar as causas em dois tópicos: manutenção e operação. Quando manutenção e operação correm bem e lado a lado, as quebras desaparecem ou se reduzem quase a zero. Portanto, operadores bem treinados e cônscios de suas responsabilidade, uma equipe de manutenção qualificada e local com ferramental adequado são a solução para que não ocorram as quebras nos momentos de maior necessidade.

O que mais quebra por falta de manutenção? Eixos, buchas e mancais, rolamentos, engrenagens, cruzetas e acoplamentos, molas e hastes ou alavancas.

O que deixa de funcionar por falta de manutenção? Motores, sistema hidráulico, sistema de combustível, lubrificação, componentes destinados ao controle de temperatura, sistemas de frenagens.

Manutenção permanente e com planejamento adequado à realidade local é a solução. Planejar a manutenção nos momentos propícios e executá-la de forma correta, eis o que deve ser feito para se evitar quebras e mau funcionamento. Parece simples, mas diante da nossa realidade atual é algo bastante complexo de ser implantado nas propriedades rurais. A seguir enumeramos alguns fatores que obstaculizam tal aplicação.

Aspectos históricos e culturais

Com raras exceções, não há nesse imenso agro brasileiro um passado que mostre a realização de manutenção de máquinas agrícolas nas propriedades. Todos que convivem no campo já ouviram essa frase: “aqui isso nunca foi feito.” E a situação vai passando de pai para filho e por gerações. Não é muito fácil romper com essa tendência de repetir o passado, bem como a resistência a novos procedimentos e métodos no dia a dia das atividades rurais, portanto também é cultural.

O produtor deve entender que manutenção não é perda de tempo nem de dinheiro
O produtor deve entender que manutenção não é perda de tempo nem de dinheiro

Qualificação da mão de obra

O trabalhador rural ainda carece de formação profissional para exercitar seu trabalho com eficácia. Aliás esse é um problema homérico que atinge todos os setores da produção. Tanto que pessoas que trabalham na manutenção de máquinas agrícolas sempre são solicitadas nas propriedades rurais. Assim como há também muita queixa dos proprietários sobre a qualidade dos serviços de manutenção, mesmo quando terceirizados. Essa é uma realidade que necessita urgentemente ser corrigida, pois na formação técnica de nível médio, em algumas atividades já há saturação da mão de obra, mas o que há carência é na formação profissionalizante, qual seja, quem de fato executa os serviços de manutenção.

Demonstrando claramente: aquele que entra embaixo do trator para sacar o tampão do óleo do cárter, que vai retirar e instalar os filtros, que vai substituir o terminal esférico do braço da direção... É esse profissional que falta, e cada vez mais escasseia na realidade atual desse universo virtual que vive nossa juventude.

Exemplos de falta de manutenções simples, mas que podem causar problemas
Exemplos de falta de manutenções simples, mas que podem causar problemas

Por último os aspectos financeiros

“Manutenção tem custos? Então, deixamos assim até onde vai funcionando. Quando aparecer o problema, aí se vai ver o que é possível fazer.” Eis um comportamento ainda bastante predominante.

Vejamos um exemplo prático que engloba os três fatores citados acima: no sistema de direção dos tratores há um componente identificado como “braço axial da direção” ou também “haste com terminal esférico”, ou simplesmente “pivô da direção”. É um dispositivo de acoplamento junto ao terminal da barra da direção com uma junta esférica alojada numa cavidade correspondente, que tem como função possibilitar a mobilidade do comando da direção junto ao suporte da ponta do eixo.

Pois bem, essa junta esférica metálica (pivô) possui lubrificação com graxa que vem blindada de fábrica e com uma coifa de borracha para proteger das impurezas. Esse material de borracha com o tempo resseca e apresenta trincas, por onde penetram poeira e material abrasivo, que aderem à graxa formando assim verdadeiro esmeril no material metálico da articulação. O que fazer? Assim que observar pequenas trincas na coifa, solicitar sua substituição. Qual valor dessa coifa? Aproximadamente R$ 20,00 (o quê? Isso mesmo). E para fazer o serviço? Agora é o problema, pois é necessário parar a máquina e dispor de ferramentas e pessoal treinado. Necessita um sacador especial para não danificar o braço axial, pois o “velho estilo da marreta” não vai funcionar ou vai deixar algum dano, e também necessita que se faça a correção adequada da convergência da geometria ao reinstalar o braço axial com a nova coifa. “Tudo isso? Então vai tocando que a hora que der no jeito é que vamos fazer. Está funcionando? Mete bronca e não para.” E o esmeril continua atuando e a folga começa a aparecer.

Quando o operador é competente e observa, deve relatar na inspeção diária. Aí o serviço não é mais só a coifa de borracha; agora já é necessário trocar o braço axial completo, a um custo bem mais elevado. Como o trator não pode parar, continua-se por mais um tempo. Quanto? Até que nem se lembre mais. Parou na entressafra, entrou umidade, e depois volta a trabalhar. A folga agora já maior, chega a ser umas férias, na linguagem de oficina. O que vem na sequência: folga em buchas e mancais do suporte da ponta de eixo, e daí para os rolamentos de rodas é um passo. E se for com tração no eixo dianteiro, até as cruzetas entram em jogo. Folgas, desgastes, até que no dia de mais necessidade quebra tudo: cruzeta, rolamentos, pinos e braço axial. Máquina parada, serviço por fazer, atropelo na oficina e o proprietário ou capataz desesperado. Voltamos lá no início, qual era o valor da coifa de borracha? “É de cair todos os butiás do bolso”, como diz o gaúcho. Ou seja, é de não acreditar que isso chegou ao ponto que chegou.

Apenas um exemplo, mas existem tantos outros. Manutenção! Quem faz manutenção? Talvez alguns façam, talvez algum dia todos façam. Assim esperamos e almejamos esse futuro o mais rápido possível, pois todos ganham.

E a operação? Pode ser causa de quebra ou mau funcionamento? No linguajar operacional: “a pecinha atrás da direção” pode ser sim um dos fatores que contribuem. O operador é o principal agente para os cuidados da máquina, e ao mesmo tempo também pode ser o principal destruidor da máquina. O comportamento e o manuseio dos comandos por parte do operador são determinantes para manter a máquina em pleno funcionamento. Será? Um operador despreparado ou mal-intencionado pode quebrar uma ponta de eixo ou uma engrenagem da caixa ou diferencial no arrancar o deslocamento de um trator, por mais mecanismos de segurança e proteção que haja. Assim como na utilização dos diversos implementos durante a execução dos serviços. Ao tracionar implementos, se o operador não mantiver atenção constante, poderá haver trancos violentos que podem levar a rupturas e quebras de componentes.

Repetimos o que em outras oportunidades já destacamos: todo o operador deve possuir conhecimento de como funciona a máquina e seus diversos conjuntos mecânicos, bem como do implemento que está acoplado ao trator, pois é a partir desse conhecimento que é possível racionalizar o uso adequado da máquina. Caso contrário, o operador apenas irá decorar alguns procedimentos e não saberá agir e decidir diante de situações diferenciadas. Treinar e qualificar constantemente as equipes de operação e reforçar diariamente a importância de um comportamento ético correto e seguro na operação.

Algumas atitudes operacionais que podem ser adotadas pelos operadores e que certamente irão acarretar danos, estão relacionadas aos comandos que são executados de forma brusca ou aos solavancos. Quando se opera uma máquina de grande capacidade de força, também os comandos possibilitam mudanças na distribuição e aplicação dessas forças, e se não forem tomados alguns cuidados, as quebras e o mau funcionamento logo aparecerão. Como exemplos, ao levantar o giro do motor excessivamente no momento de soltar a embreagem irá causar um impacto violento em toda a transmissão, podendo até quebrar uma engrenagem ou um eixo. Ou, ao realizar um comando do hidráulico, se for executado de forma repetitiva e bruscamente, jogando o comando num vai-e-vem proposital para sacudir todo o equipamento, assim pinos, mancais e hastes do pistão hidráulico estarão expostos a rupturas. E ainda, nas máquinas com transmissão automática forçar paradas bruscas com uso abusivo dos dispositivos de segurança, e manter o giro do motor acima do recomendado. Eis alguns procedimentos operacionais ainda possíveis de constatar-se por parte de alguns operadores e que levam a quebras e mau funcionamento.

O operador ideal é aquele que está sempre atento às manutenções necessárias
O operador ideal é aquele que está sempre atento às manutenções necessárias

INVESTIR EM MANUTENÇÃO

Investir na manutenção e na operação é o caminho para uma vida longa do maquinário e sem surpresas de quebras e atropelos na hora de executar os serviços tão necessários que a máquina possibilita, e assim usufruir dos lucros indispensáveis para o agronegócio. Vivemos um momento de prodigioso desenvolvimento tecnológico, mas, ao mesmo tempo, ainda carecemos de recursos humanos qualificados para fazer frente às novas tecnologias. O mundo virtual e a IoT (internet das coisas) estão marcando forte presença no maquinário agrícola, mas não basta apenas dominar o virtual, pois o universo rural é uma realidade bastante complexa e que exige conhecimentos técnicos operacionais muito além do virtual.

Máquinas agrícolas trabalham com grandes capacidades de forças, muitos HPs de potência e esforços torcionais para transmissão dessas forças, o que exige muita atenção e pleno domínio do operador. Deve-se manter vigilância permanente, pois qualquer descuido virtual causará estragos violentos. A distância entre o virtual e o real, apesar de tênue, nesse caso, pode ter um significado perigoso. Um simples toque inadequado no monitor touchscreen ou um deslocamento exagerado no joystick é o suficiente para desencadear rupturas significativas.

Joel Sebastião Alves, Instrutor de Operação e Manutenção de Máquinas e Implementos Agrícolas e Rodoviários

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