Influência do volume de aplicação na eficiência de pulverização da videira

Experimentos mostram que a redução no volume de aplicação pode melhorar a qualidade da operação em videiras, além de evitar danos ambientais e perdas

10.07.2020 | 20:59 (UTC -3)
Rogério Aimi e Otávio Dias da Costa Machado

A região da Serra gaúcha se destaca pela tradição no cultivo da uva, e esta continua ganhando cada vez mais importância econômica. Entretanto, junto com esta tradicional produção, arraigaram-se métodos e costumes dos agricultores. Quando surgiram os primeiros métodos de aplicação de produtos químicos, que foi a bomba hidráulica estacionária com a calda conduzida por mangueiras até as plantas a serem tratadas, utilizava-se grande pressão para atingir a maior distância possível do produto aplicado e, logo por consequência, maior quantidade de calda, reduzindo ao máximo possível o deslocamento humano. Muitos agricultores passaram a utilizar grandes taxas de aplicação (litros/ha de calda) e altas pressões quando adotaram os pulverizadores tratorizados, pois perpetuou-se o costume utópico de quanto mais pressão e maior quantidade de calda aplicada, maior será a garantia de uma boa pulverização.

O conceito de qualidade de pulverização na videira é estipulado pelo número de impactos das gotas em função da área. Nessa condição, caso a diluição do agroquímico tenha sido corretamente calculada, a meta da quantidade de defensivo depositada pretendida será obtida. Ultrapassar excessivamente esse parâmetro significa extrapolar a capacidade de retenção da videira, que as gotas não serão fixadas e, em seu movimento de escorrimento sobre a folhagem, irão juntar-se com outras gotas e aumentar ainda mais as perdas para o solo. Pode-se dizer que em condições de escorrimento, mesmo usando mais calda, menos agroquímico resta depositado sobre as folhas.

Para evitar a deriva e o escorrimento é essencial a formação de gotas com o diâmetro ideal para a aplicação. O diâmetro mantém relação inversamente proporcional à pressão, em vista disso então, para cada tipo de ponta, é possível obter gotas maiores com a redução da pressão de trabalho, e, quando esta é aumentada, são geradas gotas menores. O tamanho médio das gotas e a qualidade do espectro gerado são afetados também por outros fatores, como a composição da calda em função da sua formulação.

O tamanho de gotas é um bom indicativo da capacidade da aplicação em cobrir o alvo e penetrar na massa foliar. As gotas menores são mais capazes de cobrir todo o alvo, por apresentarem maior número de gotas, e como proporcionam maior capacidade de penetração são indicadas quando é necessária uma boa cobertura no dossel, caso dos produtos com ação por contato, exemplo da maioria dos fungicidas e inseticidas. Por outro lado, as gotas maiores são recomendadas para princípios ativos com forte ação sistêmica, apresentada nos mais comuns.

O número de impactos de gotas de pulverização por área, parâmetro que deve ser monitorado para evitar o escorrimento, descreve a cobertura, densidade de gotas (número de gotas/cm2). Esse valor geralmente é desconsiderado pelo fabricante na bula do agroquímico, deixando a cargo do agricultor a adequada escolha. No entanto, recomendam-se as respectivas densidades conforme o produto a ser aplicado. Para fungicidas, densidades entre 60 e 70 gotas/cm2, quando sua ação for por contato. Quando a ação deste agroquímico for sistêmica, uma densidade menor é necessária, passando para 40 a 60 gotas/cm2, pelo fato deste tipo de atuação não exigir grande cobertura dos alvos. Já para a aplicação de inseticida, recomenda-se densidade mínima de 40 gotas/cm2. Para evitar a translocação aérea e as perdas por deriva, recomenda-se diâmetro entre 100µm e 200µm, e densidade de 70 a 100 gotas/cm2 para a melhor eficiência dos fungicidas.

Para descrever a qualidade da pulverização de uma condição tradicional comparativamente a alternativas simples que poderiam ser facilmente adotadas pelos produtores, foram empreendidas atividades com o objetivo de avaliar o índice de impactos de gotas de pulverização em função de duas pontas, dos terços do dossel e da face das folhas. Os testes foram organizados na forma de um experimento fatorial, de duas pontas, três terços e duas faces (2x3x2) com quatro repetições.

Detalhe da cobertura de produto sobre as videiras na aplicação com volume reduzido
Detalhe da cobertura de produto sobre as videiras na aplicação com volume reduzido

Muitas vezes, a substituição do bico de aplicação já é suficiente para tornar a operação mais eficiente
Muitas vezes, a substituição do bico de aplicação já é suficiente para tornar a operação mais eficiente

Um experimento foi realizado na Estação Experimental do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul, Campus Bento Gonçalves, no distrito de Tuiuti. O vinhedo era de variedade Isabel, conduzida no sistema latada, na época de preenchimento de grãos, onde a massa folhar apresenta-se bem densa, entretanto, não atingindo seu pleno crescimento vegetativo. Para a pulverização utilizou-se um trator agrícola de rodas 4x2 com TDA, marca Yanmar modelo 1155 acoplado a um pulverizador hidropneumático de turbina axial da marca Jacto, com capacidade de 500 litros, com defletor de ar interno em forma de cone, equipados com duas pontas de tipo cone, para modificar a vazão e a quantidade de calda aplicada. Na pulverização utilizou-se a ponta laranja, com maior vazão, da marca MagnoGet (pulverização original realizada no vinhedo), em seguida a ponta preta da mesma marca, porém de menor vazão (condição alternativa visando melhorar a qualidade da pulverização).

Foram medidos os tamanhos dos impactos das gotas e sua densidade em ambas as faces da folha, parte diretamente exposta à pulverização e também na face posterior, foi conduzido pela metodologia de cartões hidrossensíveis, pelos quais se identificam as variáveis cobertura da pulverização, número de gotas/cm2 e diâmetro mediano das gotas, pela análise destes após a digitalização. Para esta etapa utilizou-se o programa “Gotas”, desenvolvido pela Embrapa.

O programa utiliza imagens digitalizadas dos alvos de pulverização com as manchas de gotas do cartão especial, com a face impregnada com o corante azul de bromofenol, onde, na sua forma normal, apresenta coloração amarela. Quando as gotas atingem a superfície, produzem manchas azuis, gerando bom contraste com a cor de fundo, tornando facilitada sua visualização.

Para fornecer uma interpretação da densidade de gotas que pudesse ser alinhada com as recomendações de cobertura e que pudesse ser expedita para atender o acompanhamento da pulverização, foi criado o índice de Impactos de Gotas de Pulverização (IMP). Estes índices foram classificados em cinco níveis de cobertura de acordo com a quantidade de impactos de gotas no alvo/cm2. O índice de impactos desenvolvido atribui notas de classificação, pela avaliação visual dos cartões, tendo como referencial a Tabela 1.

Durante a execução desse processo utilizaram-se dois parâmetros, a verificação do número de diâmetros gerado pelo programa Gotas e a comparação visual entre os cartões, que se complementaram, pois o primeiro não permite identificar a coaliescência de gotas e a condição de escorrimento. Para delimitar a avaliação visual, tomaram-se por base os cartões da Tabela 2, com as respectivas referências:

Os resultados encontrados demonstram que a média geral obtida no índice de impactos foi de 3,97, valor considerado ideal com cobertura em torno de 100 gotas/cm2. Esta média representa valor limite para evitar-se escorrimento e perdas ambientais.

A distribuição das amostras nas categorias do IMP está disposta na Tabela 3. A predominância do IMP 4 na ponta laranja demonstra que, embora a média esteja em um padrão de IMP adequado, esse índice encontra-se no limite entre o excesso de calda e o escorrimento, enquanto que na ponta preta, ainda que o IMP também esteja concentrado no nível 4, demonstra que o índice tende entre o excesso de calda e o ponto ideal.

A ocorrência de escorrimento em oito das 36 amostras, predominante na ponta laranja, retrata o excesso do volume de calda aplicado quando utilizada essa ponta. Quando observada a ponta preta, o IMP fica distribuído entre 4 e 3, resultado quase ideal, visando que o IMP 3 seria o objetivo da aplicação.

Quando comparadas as duas pontas de pulverização, estas apresentaram os valores descritos na Tabela 4.

Apesar do resultado do índice ser maior para a ponta Laranja, isso não é positivo, pois quando se obtém um valor maior que 4, temos escorrimento, ou seja, há uma perda da calda aplicada para o solo.

Ao analisar as faces das folhas, os resultados foram dispostos na Tabela 5.

A face inferior das folhas apresentou média maior no índice de impactos, esse resultado é explicado pelo fato dessa face estar diretamente voltada para o pulverizador e sentido de encontro ao movimento das gotículas de calda, resultando no impacto direto destas. Já a face superior encontra-se voltada ao lado oposto do alvo da aplicação, onde as gotas maiores não atingem essa parte, sendo mais frequente o alvo das gotas menores.

Na média dos terços, a ponta preta deteve IMP dentro do ideal, de 3,67 a 3,83, considerado uma boa pulverização, enquanto a laranja apresentou valores de 4 a 4,3, representando excesso de calda aplicada.

O simples processo de substituir a ponta do bico de pulverização pode gerar ganhos no combate às pragas e doenças na videira, diminuir desperdício, reduzir custos e, principalmente, diminuir o impacto ambiental, obtendo-se, portanto, a otimização dos recursos e processos aplicados na produção agrícola.

A alteração apenas das pontas de pulverização foi eficaz em reduzir o índice de impactos em níveis recomendados, sendo capaz de auxiliar na melhoria da qualidade da pulverização e na redução dos impactos ambientais. Quando reduzido o volume da calda aplicada, há uma significativa diminuição do escorrimento nas folhas mais próximas ao pulverizador, aumentando a qualidade da aplicação, e, quando abordada a parte superior do dossel, a densidade de gotas manteve o mínimo recomendado.

Rogério Aimi e Otávio Dias da Costa Machado, Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul

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