Laboratório de análise de solos vai até o produtor é projeto da Embrapa Solos

​Um laboratório completo, voltado a análises de fertilidade do solo, acaba de ser desenvolvido pela Embrapa Solos (RJ)

19.07.2016 | 20:59 (UTC -3)
Elisângela Santos

Um laboratório completo, voltado a análises de fertilidade do solo, acaba de ser desenvolvido pela Embrapa Solos (RJ), para operar dentro de um furgão de 14 metros cúbicos. Equipado para emitir laudos técnicos de correção de solos como recomendações de adubação e calagem, o Fertmovel deverá iniciar suas atividades no mês de agosto em Nova Friburgo, região serrana fluminense, uma das principais produtoras de hortaliças do estado.

O objetivo é facilitar o acesso dos produtores rurais a esse tipo de serviço e suprir a demanda do estado. O Rio de Janeiro conta apenas com dois laboratórios de solos que não conseguem atender à demanda. Atualmente, os agricultores têm recorrido a laboratórios em Minas Gerais e Espírito Santo para fazer análises de solo. Totalmente concebido por pesquisadores da Embrapa, o laboratório móvel pode ser replicado em outros estados, e Tocantins e Maranhão já demonstraram interesse pelo projeto.

A análise de fertilidade dos solos é fundamental para todos os tipos de produtores. Além de ser pré-requisito para aquisição de financiamento bancário, esse exame traz recomendações que melhoram a produtividade, evitam desperdício e barateiam a produção. O Fertmóvel também marcará o retorno da Embrapa Solos a essa atividade após 12 anos. O serviço ficará a cargo do Laboratório de Análise de Solo, Água e Planta, da Unidade.

Graças a uma parceria com a prefeitura de Nova Friburgo e a escola agrícola Ibelga, o Fertmovel começará suas atividades por esse município, com o objetivo de validar as análises em campo. "Precisamos observar na prática se haverá algum problema em transportar o laboratório de um lado para outro, embora ele tenha sido planejado para que todo o material permaneça fixo e seguro durante as viagens", explica o pesquisador da Embrapa Solos José Ronaldo de Macedo, autor da ideia. O veículo é equipado com instrumentos laboratoriais como fotômetro de chama, espectrofotômetro, balança analítica, mesa agitadora, bomba-fanem, pHmetro e buretas digitais titrette, entre outros.

"Precisamos também validar o resultado das análises realizadas nas condições do laboratório móvel. Após comprovarmos a precisão dos resultados, outras prefeituras e governos estaduais poderão reproduzir esse modelo em suas regiões", sublinha o pesquisador. O Fertmóvel deverá passar por ajustes após os testes iniciais para então ser credenciado ao Programa de Análise de Qualidade de Laboratórios de Fertilidade (PAQLF). As unidades móveis similares montadas por empresas ou governos em outros estados também precisarão se credenciar ao Programa. O credenciamento visa a manter a qualidade técnica do serviço.

Em Nova Friburgo, a Embrapa Solos capacitou um professor e três egressos do Ibelga para a realização das análises. A recomendação de calagem e adubação ficará a cargo dos agrônomos da Emater e da Secretaria de Agricultura do Município. Os produtores levarão as amostras de solo para uma sala específica do Ibelga, onde serão preparadas as amostras. O veículo ficará estacionado no pátio da escola e lá realizará as análises.

Mapa dos solos da serra fluminense

Outro produto que será obtido com o Fertmovel será o mapeamento da fertilidade dos solos dos municípios da região serrana, pois as amostras coletadas serão georreferenciadas e os seus resultados consolidados pelos pesquisadores da Embrapa Solos e da Pesagro.

Nessa primeira fase de implantação, a Syngenta está assumindo os custos iniciais. Ao fim de um ano, pretende-se que o Fertmovel se sustente, por meio do pagamento das análise, estimado em cerca de R$50,00. Apesar da cobrança, a parceria é fundamental para a viabilidade do laboratório. "Sempre será necessário contar com uma estrutura para recebimento e preparação das amostras, pontos de água e luz, local para estacionar o veículo e outros. Por isso, a parceria é fundamental para a viabilidade desse projeto", afirma Macedo.

Segundo Macedo, o Fertmóvel terá também a função de dar apoio à capacitação dos alunos em sua formação como técnicos agropecuários. "Os estudantes do Ibelco poderão conhecer de perto o processo de análise de solos. Mesmo que eles se formem como agrônomos, é importante ter esse conhecimento de como é feita a análise de fertilidade de solo", comemora o pesquisador.

A ideia de construir um laboratório de análise de solos dentro de um furgão nasceu em 2011, após um levantamento com produtores rurais, dentro do programa Mais Alimentos do governo federal. A ideia foi inspirada pelo Vertmóvel, um furgão utilizado pela empresa Parmalat testar a qualidade do leite de fornecedores na própria propriedade. "Como identificamos a carência de laboratórios e éramos cobrados para retornar nossas análises, tivemos a ideia de montar esse veículo para atender aos principais pólos produtores da região serrana", pontua ele.

A partir daí o passo seguinte foi conseguir recursos para o projeto, orçado inicialmente em R$ 500 mil para dois veículos. Ao final de 2012, a unidade conseguiu R$ 360 mil por meio de emenda parlamentar e levou mais um ano para conseguir adaptar a estrutura de um laboratório físico para um móvel. "Nosso objetivo desde o início era aumentar a oferta de análises de solos no estado e reaproximar o produtor rural dos órgãos de pesquisa e extensão", ressalta Denise Werneck, chefe de Transferência de Tecnologia da Embrapa Solos e uma das responsáveis pela iniciativa.

Mais da metade do Rio de Janeiro tem base agrícola

O Estado do Rio de Janeiro tem quase 60% dos municípios com economia baseada na agropecuária, possuindo 58.493 produtores rurais. A região serrana do estado é responsável por 40% da produção de olerícolas, principalmente nas culturas de tomate, couve-flor e pimentão, além de ser também um polo produtor de flores e de frutas. Apesar disso, o estado conta com apenas dois laboratórios de fertilidade de solos, ambos localizados em Campos, Norte Fluminense.

Com esse cenário favorável, a proposta inicial era montar dois laboratórios móveis para atender aos agricultores. "Inicialmente pensamos em ter um laboratório na região serrana e outro na região noroeste do estado, mas com os recursos que conseguimos só foi possível montar um Fertmovel", explica Denise Werneck.

O Fertmovel foi apresentado ao público pela primeira vez durante a 2ª Feira da Agricultura Familiar e Agrotecnologia no Município de Cocais (MA) em novembro de 2015. Na ocasião, o governo do Maranhão identificou no Fertmovel um poderoso instrumento de ações que visam aumentar o IDH de mais de 30 municípios do estado. Ao se conhecer o nível de fertilidade dos solos, é possível se fazer uma correta recomendação de calagem e de adubação, incrementando a produtividade da agricultura familiar, importante para a economia do Maranhão. O veículo fez grande sucesso entre o público que visitou a Feira, além de representantes dos governos federal, estadual e municipal.

Maiores custos sem a análise de solo

Um outro importante papel que o Fertmovel vai desempenhar é no trabalho educativo de agricultores que não têm consciência da importância da análise de solos como um fator de otimização dos custos de produção em suas propriedades, quanto à calagem e adubação química. O engenheiro agrônomo Lauro Rangel, responsável pelo Laboratório de Solos da Fundação Norte Fluminense de Desenvolvimento Regional (Fundenor), em Campos, confirma que ainda há muito a se avançar nesse sentido. "Boa parte dos agricultores só estão interessados em verificar o estado de sua terra por exigência do banco, para liberar financiamento do Pronaf" – garante ele. "Muitos também não seguem as recomendações da análise, que indicam a correta quantidade de calcário e tudo o que o solo necessita para ser corrigido", lamenta. A Fundação analisa solos para produtores do Rio de Janeiro e Espírito Santo. O outro laboratório que faz análises de solo é o da Universidade Federal Rural em Campos dos Goytacases.

Segundo o engenheiro-agrônomo, muitos agricultores preferem repetir antigas práticas de seus antepassados, mesmo que isso resulte em desperdício de insumos. "Se indicamos que o solo só precisa receber uma tonelada de calcário, o produtor coloca o triplo porque o vizinho faz ou seus avós faziam", aponta ele. "Outras vezes a terra não precisa de fósforo, mas mesmo assim e eles aplicam. São pequenos agricultores que poderiam baratear sua produção, mas acabam gastando muito mais por reproduzir práticas erradas", conclui Rangel.

Para cada R$ 23 investido em análise de solos na Fundenor, há economia de mais de mil reais em insumos – desde que a recomendação técnica seja seguida. Por mês, a Fundação analisa, em média, 400 amostras de solo.

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