Manejo integrado da requeima em tomate e batata​

Como correto emprego do manejo integrado e alternativas nutricionais, como aplicação de silício, auxilia na prevenção e redução de danos de Phytophtora infestans

22.07.2020 | 20:59 (UTC -3)
Cultivar Hortaliças e Frutas

A doença conhecida popularmente por mela ou requeima é causada pelo oomiceto Phytophtora infestans e tem como principais hospedeiros a batateira e o tomateiro. Trata-se de doença extremamente agressiva, com capacidade de causar danos severos à cultura, podendo também dizimar lavouras inteiras em curto espaço de tempo. Mesmo que amplamente estudada, seu controle ainda é difícil, o que torna o cultivo de tomate insustentável em determinadas épocas do ano, em regiões com condições ambientais favoráveis ao desenvolvimento do patógeno.

Em condições favoráveis, ou seja, temperatura amena (15ºC a 22ºC) e muita umidade (> 90%) este micro-organismo pode destruir completamente uma lavoura em poucos dias, devido à alta agressividade e à rápida multiplicação. Assim, em áreas com alto nível de infecção e controle ineficiente, os prejuízos podem chegar a 100%.

Nos últimos anos, ocorreu o aparecimento de novas raças, ainda mais agressivas do patógeno, e, consequentemente, necessitando de uma maior quantidade de aplicação de agroquímicos. Estima-se que os prejuízos causados por essa doença em todo o mundo ultrapassem os 8 bilhões de dólares. Algumas estimativas indicam que no Brasil, mais de 20% do custo de produção é direcionado para o controle da requeima do tomateiro.

Sintomas da doença

Phytophtora infestans é um patógeno pelo qual os esporângios (esporo) aderem em poucos minutos à superfície da planta, ocorrendo a germinação e a penetração nos tecidos vegetais em menos de três horas. Após a infecção da planta, o micro-organismo pode atacar todas as partes do tomateiro. Os sintomas surgem em três dias a qutro dias após a infecção e são mais evidentes nas folhas, com lesões de formato irregular e coloração escura. Inicialmente, apresenta aspecto encharcado, que culmina com as necroses ou queimas (Figura 1). Quando a infecção ocorre nos brotos, pode ocasionar a morte das gemas apicais, o que leva à limitação do desenvolvimento do tomateiro. Conforme o avanço no desenvolvimento do patógeno, hastes, caules e pecíolos podem quebrar, resultando na morte desses órgãos. Nos frutos de tomate, os sintomas se caracterizam por manchas irregulares, úmidas, deformadas e de coloração marrom, aumentando o grau de depreciação e, consequentemente, comprometendo a comercialização do produto.

Lavoura de tomate severamente atacada pela incidência da requeima.
Lavoura de tomate severamente atacada pela incidência da requeima.

Condições favoráveis

A requeima do tomateiro é facilitada por temperaturas amenas entre 15ºC e 22ºC e umidade relativa alta, acima de 90%. O molhamento foliar prolongado em função de chuvas ou irrigação por aspersão deixa a planta mais suscetível à proliferação de P. infestans. Este oomiceto consegue migrar entre os folíolos do tomateiro, espalhando-se entre as plantas, e sob o molhamento contínuo, todos os órgãos aéreos da planta podem ser infectados e necrosados. A disseminação ocorre pelas gotas de água e pelo vento que o transporta para novos locais.

Medidas de prevenção

Alguns métodos de controle como práticas culturais, rotação de culturas, manejo adequado do solo, eliminação de plantas hospedeiras e escolha de sementes sadias de alto vigor auxiliam no processo. Outra intervenção consiste em promover um maior espaçamento entre as plantas e efetuar uma redução do molhamento superficial foliar, reduzindo assim a área de filme d’água que favorece a disseminação.

Principais formas de controle da doença

No Brasil, não se tem variedades com nível de resistência satisfatório a P. infestans. Portanto, o seu controle ocorre quase que exclusivamente pela aplicação de produtos químicos com a utilização anti-oomicetos protetores (que formam uma barreira que impede a penetração do fungo) e sistêmicos (absorvidos e deslocados para outras partes do vegetal) em pulverizações preventivas, fazendo com que haja a inibição da germinação dos esporos. Para garantir significativa eficácia do controle é preciso realizar o monitoramento diário das lavouras, buscando sempre identificar os primeiros sintomas da doença.

Formas alternativas de controle

O manejo integrado de doenças (MID) é fator importante para o controle de P. infestans, pois integra vários métodos, que associados possuem a capacidade de inibir o desenvolvimento da doença no cultivo de tomate, além de reduzir impactos negativos no ambiente e evitar cultivares resistentes a químicos convencionais. Neste contexto, diversas pesquisas comprovam a eficiência de fungos usados como antagonistas de P. infestans, que podem reduzir o impacto da doença na cultura, aumentando também o crescimento da planta. Os fungos do gênero Trichoderma spp têm demonstrado efetividade no controle em função de diferentes mecanismos de ação, sendo estes de competição, antibiose ou hiperparasitismo.

Outras medidas adotadas no MID capazes de prevenir impactos negativos residem na escolha de época adequada para plantio, manejo e práticas culturais. Sistemas de irrigação por gotejamento são utilizados no controle, evitando a produção de esporos devido à redução do molhamento foliar e, adicionalmente, economia no consumo de água. Como P. infestans é um patógeno capaz de sobreviver em restos culturais, recomenda-se que sejam eliminados da área de plantio, juntamente com hospedeiros eventuais.

A utilização de óleos essenciais e extratos vegetais é estratégia de manejo que nos últimos anos ganhou bastante espaço entre pesquisadores e produtores. Para P. infestans já foram avaliados extratos de pimenta, pimenta-do-reino, cravo, açafrão-da-índia e alho, a partir dos quais a incidência da doença foi reduzida devido à inibição da formação de zoósporos. Além disso, o óleo de nim, combinado com fungicidas químicos, proporcionou menor progresso do patógeno, indicando que controles com estes compostos são eficazes e benéficos à cultura. É possível citar também pesquisas com produtos à base de fosfito, que apresentam ação fúngica e anti-oomicetos, com potencial de controle de doenças em condições de campo.

Uso do silício no controle de requeima

Em relação aos aspectos fisiológicos das plantas, a nutrição adequada proporciona melhor tolerância ao ataque de micro-organismos patogênicos. O silício (Si) não é considerado essencial para o crescimento das plantas, porém não deixa de ser importante, pois vários estudos comprovam efeitos benéficos em culturas como o tomateiro. O silício, com o passar dos anos, teve o efeito benéfico reconhecido por diversos pesquisadores da área agrícola, por atuar como uma barreira a vários patógenos, diminuindo o ataque de insetos e a incidência de doenças, além de aumentar a capacidade fotossintética das plantas, promover o desenvolvimento de plantas mais eretas, reduzir a taxa da transpiração, aumentar a resistência mecânica das células, diminuir o efeito tóxico de Mn, Fe e outros metais pesados, e aumentar a absorção e o metabolismo de elementos, tais como o fósforo.

Além de barreira física, devido ao acúmulo na epiderme das folhas, o silício ativa alguns genes envolvidos na produção de compostos secundários do metabolismo da planta, como os polifenóis e as enzimas relacionadas com os mecanismos de defesa vegetal. Assim, o aumento de Si nos tecidos vegetais faz que a tolerância da planta ao ataque de Phytophtora infestans aumente, devido à produção suplementar de toxinas que podem agir como substâncias inibidoras do patógeno.

Manejo do Si

O momento da aplicação se dá quando as plantas estão em estádio vegetativo, com brotações, flores e frutos verdes. A ideia é aplicar em folhas jovens para que as células formem camadas de proteção à entrada do fungo. O silício é pouco móvel na planta, desta forma, mesmo ocorrendo a absorção pelas raízes, ele encontra dificuldade em alcançar as partes aéreas, sendo necessárias aplicações frequentes. Portanto, o fornecimento de silício via pulverização foliar é uma alternativa viável para o fornecimento às plantas, estimulando seus efeitos benéficos, além de reduzir significativamente a taxa de germinação de esporos do fungo.

Os métodos de aplicação dos silicatos se dão principalmente por meio da forma sólida (pó ou granulado) ou líquida (via solo ou via foliar). O emprego dos silicatos em pó ocorre através da incorporação em área total, enquanto os granulados são aplicados nas linhas de plantio, normalmente acompanhados de outros adubos, como o NPK.

As doses de silício a serem aplicadas no solo dependem da fonte utilizada e do teor de Si no solo. Ainda há muitas divergências sobre a dose ideal para a aplicação de silício na lavoura, porém estudos indicam que doses para o material fino (pó) a lanço variando de 1,5t/ha a 2t/ha de silicato de cálcio são eficientes. Para os solos que já estão corrigidos, a dose não deve ultrapassar 800kg/ha. Outros estudos com o material granulado têm demonstrado que doses de silicato variando de 0,5t/ha a 0,8t/ha são suficientes no sulco de plantio, pois a combinação do silicato com material fertilizante (NPK) é uma ótima alternativa. Para a aplicação via pulverização mecânica, pesquisas utilizaram doses de silicato entre 1L/ha e 8L/ha, de forma parcelada no ciclo da cultura.

Alguns trabalhos mais recentes com aplicação foliar de Si evidenciaram que a dose de 2L/ha de produto comercial com 0,8% de Si solúvel, como concentrado estabilizado de ácido salicílico, parcelada em quatro aplicações durante o ciclo da batata, foi suficiente para reduzir a severidade da requeima em mais de 40% em comparação às plantas que não receberam nenhuma dose de Si.

A tecnologia baseada no uso do silício na agricultura é limpa, viável e sustentável, com enorme potencial para diminuir o uso de agroquímicos e aumentar a produtividade por meio de uma nutrição mais equilibrada e fisiologicamente mais eficiente, com plantas mais produtivas e vigorosas, com baixa severidade de doenças. O ganho em produtividade já é suficiente para pagar o custo de aplicação do Si, sem contar o auxílio no manejo da requeima e de outros patógenos e insetos-pragas.

Sintoma de Phytophtora infestans em folha de tomateiro.
Sintoma de Phytophtora infestans em folha de tomateiro.

Medidas com melhores resultados para o manejo de P. infestans

• Plantio de cultivares mais tolerantes

• Adubação equilibrada, sem excesso de nitrogênio

• Adubação com silício

• Evitar o plantio em regiões sujeitas a ocorrência e permanência de neblina por períodos longos

• Evitar o plantio em terrenos baixos, sombreados ou próximos a reservatórios de água

• Fazer a rotação de culturas com espécies de planta não hospedeira da doença

• Não cultivar em áreas de baixadas e próximas de culturas velhas de batata e de tomate

• Realizar plantios menos adensados, para melhor arejamento

• Destruir os restos da cultura logo após a colheita

• Realizar o monitoramento das condições climáticas favoráveis a P. infenstans

Rodrigo Vieira da Silva, UFV e IF Goiano – Campus Morrinhos; Ana Paula Gonçalves Ferreira, Brenda Ventura de Lima e Silva e Gabriela Araújo Martins, IF Goiano – Campus Morrinhos 

Cultivar Hortaliças e Frutas Setembro 2019 

A cada nova edição, a Cultivar Hortaliças e Frutas divulga uma série de conteúdos técnicos produzidos por pesquisadores renomados de todo o Brasil, que abordam as principais dificuldades e desafios encontrados no campo pelos produtores rurais. Através de pesquisas focadas no controle das principais pragas e doenças do cultivo de hortaliças e frutas, a Revista auxilia o agricultor na busca por soluções de manejo que incrementem sua rentabilidade. Na edição de setembro de 2019 você confere também: 

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