Medidas adequadas para manejar mancha de septoria em tomate

Locais menos úmidos para plantio, uso de mudas e sementes sadias e controle químico estão entre principais medidas de manejo da enfermidade

24.08.2020 | 20:59 (UTC -3)
Cultivar Hortaliças e Frutas

Segundo Viégas, 1962, a septoriose ou a mancha de septoria foi relatada pela primeira vez ocorrendo em tomateiro em Boca del Riachuelo, na Argentina, em 1882, por Spegazzin, e sua patogenicidade foi confirmada apenas em 1916, por Levin, nos EUA, após a conclusão dos postulados de Koch. Atualmente, trata-se de uma doença fúngica bastante frequente e importante para a cultura, ocorrendo em todos os lugares do mundo onde é cultivada. Em geral, é mais severa sob condições climáticas de alta umidade relativa e temperaturas moderadas que possibilitam que as folhas permaneçam molhadas por períodos mais longos após as chuvas ou irrigações. Os principais prejuízos causados pela doença são a queda de vigor, a desfolha generalizada das plantas e a queima dos frutos - devido à exposição direta desses ao sol.

A doença pode ocorrer em qualquer estágio de desenvolvimento das plantas. Os sintomas manifestam-se inicialmente na parte de baixo das folhas mais velhas, através de pequenas e numerosas lesões encharcadas, de formato circular a elíptico, medindo de 1mm a 3mm de diâmetro. Com o progresso da doença, as lesões tornam-se marrons acinzentadas no centro, com bordos marrom-escuros, podendo ou não ser circundadas por um halo amarelado e atingindo mais de 5mm de diâmetro. Em condições de alta umidade, observam-se no centro das lesões os picnídios do fungo (pontos negros), onde os conídios (esporos) são formados. Com o tempo, a doença evolui de forma ascendente nas plantas, atingindo as partes mais novas. Em ataques severos, ocorre coalescência das lesões, causando amarelecimento, seguida de seca e queda das folhas. A desfolha reduz visivelmente o vigor e o potencial produtivo das plantas, além de expor os frutos a queimaduras de sol. Sintomas semelhantes aos observados em folhas também podem ser vistos no caule, nos pecíolos e nas sépalas, porém, as lesões são menores e tendem a ser mais escuras e numerosas. Os frutos raramente são afetados. De modo geral, as plantas tendem a ser mais suscetíveis à septoriose após o início da frutificação, momento em que a demanda por nutrientes é maior para a formação e o crescimento dos frutos. 

Agente causal

O fungo Septoria lycopersici Speg. 1881 produz conídios hialinos, longos, finos, com três a nove septos, medindo 60-120x2-4µm em conidióforos curtos, que se formam no interior de estruturas denominadas picnídios, globosos, ostiolados e escuros. A massa conidial desse fungo apresenta coloração rosada, salmão ou marrom-escura.  O micélio é hialino, ramificado e septado.

As temperaturas consideradas propícias para a infecção e a evolução da doença variam de 16°C a 28°C (ideal de 25°C). Os conídios são liberados dos picnídios em condições de alta umidade, formando cirros, aglutinados entre si por uma substância mucilaginosa que é dissolvida quando em contato com água, dispersando assim os conídios que passam a ser disseminados pelo impacto das gotas de água da chuva ou da irrigação.

Para que os conídios germinem e o fungo possa infectar as plantas, é necessária elevada umidade relativa (100%) por um período mínimo de 48 horas a 72 horas. Nessas condições, os primeiros sintomas da doença podem ser observados entre seis dias e 7 dias após o contato entre os conídios e o hospedeiro. A disseminação na lavoura também pode se dar durante a realização dos tratos culturais - pelo trânsito de trabalhadores e implementos agrícolas, além de insetos e pássaros.

Mesmo não sendo considerado como um fungo de solo, a principal via de sobrevivência de S. lycopersici de um cultivo para o outro são os restos culturais. Pode também infectar outras solanáceas de importância econômica, como a petúnia (Petunia sp.), a berinjela (Solanum melongena), o jiló (Solanum aethiopicum), o pimentão (Capsicu mannuum) e algumas invasoras como a maria pretinha (Solanum americanum L.), a figueira do inferno (Daturas tramonium L.) e a fisális (Physalis sp).

Conídios de Septoria lycopersici.
Conídios de Septoria lycopersici.

Principais medidas de controle

Apesar das várias tentativas de descobrir fontes de resistência ao patógeno, ainda não existem no mercado cultivares ou híbridos de tomate resistentes à septoriose. Portanto, outros métodos de controle devem ser adotados para que o desenvolvimento de graves epidemias seja evitado.

Na escolha do local de plantio, dar preferência a áreas ensolaradas, sem acúmulo de umidade, bem ventiladas e distantes de plantios em final de ciclo.

As principais fontes de inóculo inicial do fungo são as sementes, as mudas, as soqueiras, os restos de cultura e outras espécies de solanáceas. Portanto, é recomendável a utilização de sementes e mudas sadias; evitar o plantio sucessivo de solanáceas (recomenda-se a rotação de culturas por intervalos de três anos a quatro anos); e a eliminação de restos culturais, de possíveis espécies hospedeiras e também de plantas daninhas em geral, que podem concorrer por espaço, luz, água e nutrientes e dificultar a dissipação da umidade na folhagem.

A adoção de espaçamentos mais amplos e da condução vertical pode reduzir a ocorrência da doença, graças a maior circulação de ar e menor da umidade entre as plantas.

Lesões de septoriose nas partes superior e inferior das folhas.
Lesões de septoriose nas partes superior e inferior das folhas.

Devido à grande importância da umidade no desenvolvimento da doença, recomenda-se minimizar o tempo e reduzir a frequência das irrigações em campos afetados, evitando, também, realizá-las nos finais de tarde. A adoção de irrigação localizada pode ser um aliado importante no manejo da septoriose, uma vez que reduz de forma significativa a disseminação do patógeno.

O controle químico é o principal método utilizado no manejo da septoriose. É realizado através da aplicação preventiva de fungicidas protetores e sistêmicos na parte aérea da planta. Os fungicidas protetores ou de contato, como produtos à base de cobre, captana, clorotalonil e mancozebe, caracterizam-se por formar uma película protetora na superfície da planta, que impede a penetração do patógeno. Os fungicidas sistêmicos, como os pertencentes aos grupos dos triazóis, benzimidazóis, fenilpiridinilamina, carboxamida e estrobilurinas, são aqueles que podem se movimentar na planta através de vasos condutores, conseguindo atingir locais distantes do depositado. Para evitar o desenvolvimento de casos de resistência, recomenda-se a utilização de produtos de diferentes grupos no mesmo ciclo produtivo, evitando-se o uso repetitivo de fungicidas com o mesmo mecanismo de ação e aplicações curativas em situações de alta pressão de doença. Para sistemas orgânicos de cultivo, as caldas bordalesa e sulfocálcica se destacam como as opções com melhores resultados no controle da septoriose nessa modalidade de produção. A calda bordalesa pode ser fitotóxica ao tomateiro, portanto as pulverizações devem ser iniciadas com concentrações mais baixas do que a recomendada (por exemplo: 0,5%) e gradativamente alcançar 1%. A calda sulfocálcica também possui capacidade de causar fitotoxicidade, quando aplicada em dias quentes.

Cultura de tomateiro orgânico em estufa.
Cultura de tomateiro orgânico em estufa.

A tecnologia de aplicação de fungicidas contribui diretamente para que haja sucesso no controle da septoriose. A má qualidade na aplicação dos produtos pode comprometer e limitar seriamente a sua eficácia, principalmente em relação aos fungicidas protetores. Fatores como tipo de bicos, volume de aplicação, pressão, altura de barra e velocidade do trator devem ser sempre considerados, com o objetivo de proporcionar a melhor cobertura possível da cultura. O uso de fungicidas deve seguir todas as recomendações do fabricante quanto a dose, volume, intervalos, número de aplicações, utilização de Equipamento de Proteção Individual (EPI), intervalo de segurança, armazenamento de produtos e descarte de embalagens. As informações sobre fungicidas registrados junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para a septoriose na cultura do tomateiro podem ser obtidas no endereço eletrônico http://agrofit.agricultura.gov.br/agrofit_cons/principal_agrofit_cons.

O tomateiro

O tomateiro (Solanumly copersicum) é uma espécie olerícola originária das Américas Central e do Sul que se tornou conhecida após a sua introdução na Europa, pelos espanhóis no século 16. Representa uma das mais importantes culturas no cenário agrícola mundial. Ampla adaptabilidade, elevado potencial produtivo e versatilidade culinária tornam essa solanácea apta a ser consumida in natura ou industrializada nas mais diversas formas. O fato de possuir baixas calorias, quantidades consideráveis de vitaminas A, C e complexo B, sais minerais e licopeno tornam o tomate um alimento reconhecido também por suas propriedades antioxidantes e anticancerígenas.

A tomaticultura brasileira encontra-se disseminada em todo o território nacional, porém, os principais centros de produção encontram-se no Sudeste e Centro-Oeste.  Hoje, a cadeia produtiva do tomate apresenta grande importância econômica e social e assume características empresariais bem definidas, com avanços tecnológicos constantes, mudança fundiária e gerenciamento avançado do processo produtivo.

Ricardo José Domingues, Jesus G. Töfoli e Josiane Takassaki Ferrari, Apta - Instituto Biológico

Cultivar Hortaliças e Frutas Maio 2019

A cada nova edição, a Cultivar Hortaliças e Frutas divulga uma série de conteúdos técnicos produzidos por pesquisadores renomados de todo o Brasil, que abordam as principais dificuldades e desafios encontrados no campo pelos produtores rurais. Através de pesquisas focadas no controle das principais pragas e doenças do cultivo de hortaliças e frutas, a Revista auxilia o agricultor na busca por soluções de manejo que incrementem sua rentabilidade. 

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