Medidas de controle da mosca-branca em tomate

Novos princípios ativos e integração de estratégias podem favorecer desempenho de inseticidas no manejo integrado da praga

09.06.2020 | 20:59 (UTC -3)
Cultivar Hortaliças e Frutas

A mosca-branca Bemisia tabaci (Gennadius) (Hemiptera: Aleyrodidae) é uma das pragas de maior potencial destrutivo nas lavouras ao redor do mundo, responsável por danos causados pela sucção do floema, excreção de substância açucarada conhecida como honeydew e pela transmissão de mais de 300 espécies de vírus de plantas, além de possuir ampla distribuição em todos os continentes, com exceção dos polos. Dentre os vírus transmitidos por esta espécie destaca-se o gênero Begomovirus, sendo relatadas até 288 espécies. B. tabaci é uma espécie polífaga e ocorre em aproximadamente 700 espécies de monocotiledôneas e dicotiledôneas. No Brasil, é responsável por perdas de até 100% em culturas como pepino, repolho, pimentão, tomate e jiló. Além das olerícolas, surtos populacionais são registrados em grandes culturas como algodão, soja e feijão. Este aumento populacional da praga está relacionado à grande área de plantio de soja, que é um excelente hospedeiro da praga, além das condições climáticas na época de cultivo da oleaginosa, caracterizadas por um verão longo e quente, também favorecerem o desenvolvimento do inseto. B. tabaci pertence a um complexo de mais de 40 espécies crípticas que são assim denominadas por serem morfologicamente indistinguíveis, mas apresentarem características biológicas, genéticas e ecológicas distintas.

Dentre as diversas espécies crípticas encontradas ao redor do globo, as que mais se destacam são a Middle East-Asia Minor (MEAM1) e a Mediterranean (MED), popularmente conhecidas por biótipos B e Q, respectivamente, que devido ao seu perfil invasivo são consideradas com maior potencial destrutivo dentro das lavouras.

Em geral, a principal estratégia de manejo adotada para o controle de espécies de mosca-branca na cultura do tomate é a utilização de inseticidas químicos e, em muitas vezes, essas aplicações são executadas com o intuito de prevenir infestações. Os principais grupos químicos de inseticidas usados no controle de B. tabaci são os de ação neurotóxica neonicotinoides (acetamiprido, imidacloprido, tiametoxam), piretroides como a cipermetrina e organofosforados (acefato), reguladores de crescimento (buprofezin, pyriproxyfen,) e de ação no tecido muscular (ciantraniprole e clorantraniliprole). Mais recentemente, sulfoxaflor, pertencente ao grupo das sulfoxaminas, e o ingrediente ativo flupiradifurona do grupo das butenolidas foram liberados para o controle de Bemisia tabaci MEAM1 em tomate, abrindo a gama de ingredientes ativos na rotação de inseticidas durante o ciclo da cultura.

A maior parte desses produtos apresenta ação principalmente de ingestão, reforçando a necessidade de que o produto alcance os locais de alimentação da mosca-branca. Para que isso ocorra, é necessária a utilização de produtos específicos, principalmente os de modo de ação sistêmicos que percorrem os tecidos vasculares da planta ou que detenham ação transfoliar, como neonicotinoides. Além disso, a utilização de outros produtos que apresentem ação ovicida, e sobre ninfas e adultos, pode aumentar a eficiência de controle.

Para a espécie críptica B. tabaci MED ou biótipo Q, é observado que, em diferentes regiões do globo, a suscetibilidade a moléculas inseticidas é menor quando comparada à mosca-branca MEAM1, biótipo B. Na China, o uso excessivo de aplicações de inseticidas, principalmente neonicotinoides e ciantraniliprole, para o controle de B.tabaci MEAM1, acarretou em aumento da população invasiva MED, ao passo que em grande parte territorial, esta  espécie se tornou dominante em lavouras de pepino, pimenta, berinjela, melão, tomate e algodão. Em Israel, também foi observado que com a utilização contínua de inseticidas, principalmente piriproxyfen na cultura de algodão, B. tabaci MED foi favorecida, ocasionando uma substituição da MEAM1 nas lavouras. Diversos outros países também partilharam da mesma observação em relação à menor suscetibilidade de B. tabaci MED em relação a MEAM1.

Diversos fatores podem estar relacionados a essa diferença de suscetibilidade entre as espécies, por exemplo, as características genéticas do próprio inseto. Devido à necessidade de se descobrir quais seriam as possíveis causas dessa menor suscetibilidade de B.tabaci MED em relação a MEAM1, estudos foram conduzidos por meio de análises específicas, comparando as diferenças biológicas no intestino dessas duas espécies invasivas, tendo em vista que esse órgão do inseto, além de sua função para a nutrição está relacionado à degradação de substâncias químicas. Resultados obtidos a partir de análises realizadas demonstraram que os genes que estão envolvidos em processos metabólicos de detoxificação de moléculas inseticidas se encontram expressados em altas quantidades em MED quando comparados com o intestino da espécie críptica MEAM1. Outros estudos conduzidos na China mostraram que, com o intenso uso de inseticidas, as populações de B. tabaci MEAM1 foram substituídas por MED. Posteriormente, devido ao uso repetido dessas moléculas inseticidas, como os neonicotinoides, o controle de espécies de B. tabaci apresentou falhas. Diante dessa situação de difícil manejo da praga, as diamidas surgiram como um grupo químico mais moderno. Entretanto, este grupo passou a ser utilizado de forma intensa e sem critério no manejo da praga, o que levou à seleção de indivíduos resistentes de B. tabaci MED à molécula inseticida ciantraniliprole.

A busca por novas estratégias de controle dessa praga é constante. Dessa forma, muitos recursos são destinados à pesquisa para a prospecção de novas moléculas inseticidas que possam contribuir como mais uma alternativa no manejo de artrópodes-praga. Dentre as novas moléculas estudadas, é possível citar duas mais atuais e recentemente liberadas, sulfoxaflor e flupiradifurona. Estudos conduzidos com diferentes populações de B. tabaci MED com a molécula sulfoxaflor demonstraram uma boa taxa de controle em adultos, ninfas e ovos, além de que, quando comparado com inseticidas do grupo dos neonicotinoides, não apresentou indícios de resistência cruzada entre as populações testadas. Tendo em vista que o controle químico de espécies que são vetores de vírus e outros patógenos é indispensável, deve ser realizada a avaliação da capacidade de uma determinada molécula em minimizar, ou até mesmo impedir, a transmissão viral de um inseto contaminado para a planta hospedeira. Nesse contexto, testes conduzidos com flupiradifurona apresentaram resultados positivos em relação à supressão de transmissão do TYLCV por B. tabaci MED infectada. Esse resultado positivo foi atribuído à rápida ação no inseto, causando um efeito de choque conhecido por knockdown e impedindo que tenha tempo hábil para transmitir o vírus.

Apesar de o controle químico ser uma ferramenta que pode auxiliar na redução do número de plantas infectadas com vírus dentro de uma lavoura, é difícil obter eficácia de controle em 100%, uma vez que os insetos possuem boa mobilidade e se beneficiam em locais protegidos na arquitetura da planta. A complexidade relacionada a B. tabaci, especialmente em relação à espécie críptica MED, vai muito além de suas características invasivas, pois, em geral, apresenta menor suscetibilidade a moléculas inseticidas, o que, em termos de manejo, significa um grande desafio para pesquisadores e profissionais da área. Além disso, é necessário que as estratégias sejam aplicadas dentro de uma perspectiva de manejo integrado de pragas, considerando as boas práticas agrícolas em campo, um bom planejamento antes da implantação da lavoura, monitoramento da presença da praga e de possíveis sintomas de plantas infectadas, bem como conhecimentos proporcionados pela tecnologia de aplicação para que seja possível realizar de forma mais eficaz o manejo da praga. A escolha de inseticidas seletivos aos inimigos naturais do inseto-praga também favorece a ação do controle biológico natural no cultivo do tomate.

Uma série de pesquisas em relação à seletividade de inseticidas aos inimigos naturais de Bemisia tabaci indicam os piretroides como os mais nocivos, principalmente ao parasitoide de ninfas de mosca-branca, Encarsia formosa (Hymenoptera: Aphelinidae). Cartape, clorpirifós, bifentrina e clorfenapir são outras moléculas relatadas como não seletivas ao predador de ocorrência natural em cultivos hortícolas Orius tristicolor (Hemiptera: Anthocoridae), além de possuírem efeito residual de menos de uma semana no controle do inseto-praga.

A resistência a inseticidas é uma preocupação permanente para espécies de pragas de artrópodes, o que pode resultar em falha no controle de inseticidas. Para as espécies crípticas de Bemisia tabaci foi descrito um total de 631 casos de ocorrência de populações resistentes em todo o mundo, sendo relatados casos de resistência a todas as principais classes de inseticidas. Estudos recentes acerca da determinação de moléculas inseticidas que já apresentam falhas de controle no manejo de Bemisia tabaci MEAM1 apontam o imidacloprido e o diafentiurônio ainda detentores de eficácia considerável para as populações neotropicais do inseto-praga. As moléculas azadiractina, espiromesifeno e lambda-cialotrina foram relatadas por possuírem alta falha de controle. Uma problemática adicional é que o uso de clorantraniliprole pode permitir a seleção cruzada de ciantraniliprole em B. tabaci, ambos diamidas com registro recente contra moscas-brancas que exigem atenção no desenho de programas de gerenciamento da seleção de populações resistentes.

Outra forma de emprego do controle químico é via uso de plantas que liberem voláteis altamente repelentes de moscas-brancas, como o ocimeno e o carvacrol, encontrados em plantas de manjerico e orégano, respectivamente. Tais plantas podem ser incorporadas em um sistema de push-pull (ou atrai-repele) em casas de vegetação ou até mesmo em campo aberto de cultivo de tomate, além de poderem ser utilizadas na prospecção de novas moléculas para a geração de novos produtos. A mistura das substâncias voláteis D-limoneno, citral e azeite de oliva em estufas de produção de tomate é outro exemplo de sucesso na redução da colonização das plantas por B. tabaci e consequentemente, diminuição do número de ovos ovipositados da praga. Além disso, a mistura pode ser alocada em frascos de liberação lenta, oferecendo um período de 29 dias de eficácia na repelência de adultos de moscas-brancas.

Dentro da perspectiva do manejo integrado de pragas, a radiação suplementar de raios ultravioleta em casas de vegetação, apesar de configurada como um método de controle físico, também pode ser uma valiosa aliada ao aumento da eficiência do controle químico. Isso ocorre, em suma, devido ao fato de que os raios UV diminuem a infestação inicial de B. tabaci no tomateiro, reduzindo o estabelecimento da praga na cultura, o que torna o controle químico mais assertivo, pois o posicionamento de um inseticida em uma lavoura com menor infestação da praga, de uma maneira geral, tem a performance melhorada. 

Produtos que apresentem ação ovicida e sobre ninfas e adultos podem aumentar a eficiência de controle.
Produtos que apresentem ação ovicida e sobre ninfas e adultos podem aumentar a eficiência de controle.
A mosca-branca é uma das pragas mais destrutivas em lavouras.
A mosca-branca é uma das pragas mais destrutivas em lavouras.

Daniel de Lima Alvarez, Gabryele Silva Ramos, Suyanne Araújo de Souza, Regiane Cristina Oliveira de Freitas Bueno, Unesp

Cultivar Hortaliças e Frutas fevereiro/março 2020 

A cada nova edição, a Cultivar Hortaliças e Frutas divulga uma série de conteúdos técnicos produzidos por pesquisadores renomados de todo o Brasil, que abordam as principais dificuldades e desafios encontrados no campo pelos produtores rurais. Através de pesquisas focadas no controle das principais pragas e doenças do cultivo de hortaliças e frutas, a Revista auxilia o agricultor na busca por soluções de manejo que incrementem sua rentabilidade. Na edição de abril/maio você confere também: 

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