Plano ABC terá central nacional de monitoramento

O Brasil passa a contar, a partir de segunda-feira (21), com uma estrutura física especialmente criada para coordenar o sistema de monitoramento da redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) na agropecuária, be

15.03.2016 | 20:59 (UTC -3)
Marcos Vicente

Trata-se da sede da Plataforma Multi-institucional de Monitoramento das Reduções de Emissões de Gases de Efeito Estufa derivadas das ações do Plano ABC (Plataforma ABC).

A coordenação fica estrategicamente situada nas instalações da Embrapa Meio Ambiente, em Jaguariúna (SP), e vai ajudar no compromisso do Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura (Plano ABC).

Segundo o chefe-geral da Embrapa Meio Ambiente, Marcelo Morandi, a plataforma será um fator de agregação de competências das instituições envolvidas no monitoramento do Plano ABC.

Estarão alocadas as competências da Embrapa e de diversas instituições parceiras, capazes de gerar informações para um monitoramento robusto das estimativas de redução das emissões de GEE compromissadas para o Plano ABC. Cabe à plataforma a coleta, organização, análise, armazenamento e zelo pela segurança das informações e estimativas. Para tanto, a Plataforma ABC contará com um comitê diretor, que será responsável pela definição das suas diretrizes macroestratégicas e pelo acompanhamento do seu funcionamento.

O Comitê será composto por sete membros representantes do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), que atuará como presidente, e como secretário Executivo, um representante indicado pela Diretoria Executiva da Embrapa. O Ministério do Meio Ambiente (MMA), Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Rede Clima, instituições do sistema bancário (Banco Central ou Banco do Brasil), além da sociedade civil e do setor agropecuário privado, indicam um membro nato cada.

O sistema de monitoramento das emissões é considerado um componente estratégico para o Plano ABC. O monitoramento eficiente será a única forma de o País comprovar de que forma e em qual quantidade os setores da agricultura e pecuária brasileira estarão conciliando produção e sustentabilidade no mesmo pacote.

"É extremamente relevante o correto emprego das estratégias de monitoramento, de modo que possam garantir que as reduções sejam devidamente apuradas, contabilizadas e passíveis de serem comprovadas em 2020, inclusive para verificações de auditorias internacionais," afirma o pesquisador Celso Vainer Manzatto, da Embrapa Meio Ambiente, que será o responsável técnico da Plataforma ABC,

Ele destacou ainda o desafio técnico-cientifico da Plataforma para o estabelecimento de mecanismos de monitoramento - Mensuração, Relatório e Verificação (MRV). Esses mecanismos devem comprovar internacionalmente o cumprimento desses compromissos em discussão nas NAMAS (Nationally Appropriate Mitigation Actions), como forma de aumentar a participação dos países em desenvolvimento no esforço de redução das emissões de (GEE). Para isso, Manzatto explicou que o Comitê terá ainda um papel fundamental no diálogo e na mobilização de instituições públicas e privadas.

A sede é resultado da articulação iniciada em 2010 entre Embrapa, MMA e Mapa e a inauguração contará com a presença do presidente da empresa, Maurício Antônio Lopes e de diversas autoridades.

Mitigação e adaptação

O ABC é um plano setorial que busca organizar, planejar e programar ações para que, por meio de incentivos à adoção de sistemas e tecnologias sustentáveis de produção, seja possível aos produtores rurais aliar a produção com adequação ambiental, capacitando a viabilidade econômica na atividade rural.

O Plano é composto por sete programas relacionados a tecnologias de mitigação e ações de adaptação às mudanças climáticas. São eles: integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), sistema plantio direto (SPD), recuperação de áreas de pastagens degradadas, tratamento de dejetos animais, florestas plantadas, fixação biológica de nitrogênio (FBN), e por último, adaptação às mudanças climáticas.

Esses sistemas de produção, combinados ou não, são capazes de responder às responsabilidades assumidas pelo país, de forma voluntária, em 2009, na Dinamarca, durante a 15ª Conferência das Partes (COP-15).

Na ocasião, o Brasil assinou um compromisso de redução de emissões de GEE no país entre 36,1% e 38,9% das esperadas para 2020, tendo 2005 como ano-base. Os compromissos propostos para a agricultura que constituem a base do Plano ABC, possuem um potencial estimado para a mitigação de GEE da ordem de 133,9 a 162,9 milhões toneladas CO2 equivalente.

O protagonismo do Brasil

O planejamento estrutural para a realização de processos de mitigação de GEE é o resultado de esforço coordenado. O pesquisador Eduardo Delgado Assad, da Embrapa Informática Agropecuária (SP) participa das discussões para a implantação do Plano ABC desde o ano de 2009.

Ele conta que todas as etapas do projeto e a implantação do Plano contaram com o envolvimento direto do Governo Federal, dos ministérios e secretarias relacionados ao tema, universidades, entidades do terceiro setor, órgãos financiadores, Institutos de pesquisas, além da Embrapa.

O pesquisador avalia que o Plano ABC coloca o Brasil como protagonista mundial na redução dos gases efeito estufa a partir da agropecuária e que poucos países possuem um planejamento similar. "Enquanto o mundo ainda discute sistemas de integração lavoura-pecuária (ILP), ou integração lavoura-pecuária-floresta – (ILPF), o Brasil promove e estuda esses sistemas há mais de três décadas", ressalta Assad.

Cenários com áreas de degradação dos solos, verificados ainda nos anos 1980, mobilizaram pesquisadores que acabaram por oferecer sistemas produtivos mais sustentáveis para a agropecuária brasileira, nos quais os aumentos de produtividade animais e vegetais passaram a conviver com a possibilidade de preservação dos recursos naturais.

Graças ao esforço de implantação de tecnologias de produção de baixa emissão, o Brasil possui hoje 92 Unidades de Referência Tecnológica e mais de três milhões de hectares em que esses sistemas foram adotados.

"Essa é uma oportunidade da qual o País não pode abrir mão. Trata-se de um ativo valioso a ser conduzido com extremo cuidado. Não estamos tratando somente da possibilidade de produzir carne, grãos e fibra, mas de agregar pegada verde a esses produtos, com chancela de boas práticas de produção, em um mercado que anseia por isso," explicou Assad.

Manzatto concorda. Para ele, há um caminho a se percorrer, que passa pelo desenvolvimento dos mecanismos de monitoramento das reduções de emissões de GEE, para avaliar a efetividade do Plano ABC. "Posteriormente, com as devidas comprovações internacionais das reduções de emissões da nossa agricultura tropical, essas ações irão contribuir para gerar novas oportunidades de negócios para a produção brasileira, em mercados mais seletos," disse o pesquisador frisando que isso acontecerá à medida que produtores forem progressivamente adotando sistemas de produção sustentáveis.

A contribuição da Embrapa

Atualmente o Brasil conta com mais de 40 Sistemas Integrados de Produção, a grande maioria testada na Embrapa. Assad ressalta que a Empresa possui pesquisas em campos experimentais nessa área há mais de 30 anos. Destaca o trabalho pioneiro de pesquisa básica, sobre verificação de carbono no solo e emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE), iniciada principalmente nas Unidades da Embrapa Cerrados (DF), Solos (RJ), Agrobiologia (RJ) e Meio Ambiente (SP).

Para o pesquisador, este é o momento de aperfeiçoar a produção agrícola no Brasil, fortalecendo os modelos integrados, capazes de produzir grãos, carne, leite e produtos madeireiros e não madeireiros ao longo de todo o ano. Ele ressalta que as fazendas adotantes desse modelo se tornam altamente competitivas em termos produtivos, além de incorporar benefícios econômicos e ambientais ao empreendimento.

"Temos 170 milhões de hectares de pastagens com potencial e capacidade de transformá-los em sistemas da agricultura ABC da melhor maneira possível, beneficiando produtores, o País e o ambiente", acredita Assad.

Carbono como moeda

Quando instituições financeiras e bancos centrais de países influentes passaram a considerar as mudanças climáticas como fator de risco para a estabilidade financeira mundial, uma nova moeda de troca começou a surgir: o carbono. Ela tem origem na interpretação do Artigo 117, do Acordo de Combate ao Aquecimento Global, firmado por 195 países, incluindo o Brasil, e que versa sobre o valor social e econômico das ações de mitigação.

Enquanto se discute a definição adequada para a retenção do carbono, o mercado deste tipo de "título verde" prospera. Os "green bonds" servem para financiar empreendimentos que invistam em tecnologias de mitigação das emissões de carbono, ou que reduzam o consumo de água, matérias-primas e energia. Segundo o Climate Bonds Initiative, organização sem fins lucrativos da Inglaterra, esses títulos poderão movimentar até U$100 trilhões no mercado nos próximos anos.

Os títulos se configuram como dívida de longo prazo e são usados para financiar projetos sustentáveis, como os que contemplam as boas práticas agrícolas, por exemplo. Com isso, ajudam na redução das emissões de GEE, minimizam o aquecimento do planeta, valoram a produção e aumentam a oferta de alimentos seguros, entre outras vantagens.

Foto: Marcos Vicente

Compartilhar

Mosaic Biosciences Março 2024